Band-aid
* Por Suzana Vargas
Moça debruçada na janela,
como é bonito vê-la através
de tantos carros passeando na avenida,
e tendo ao fundo a luz mortiça
de desbotadas paredes
onde repousam tantos tesouros
do tempo "a velha foto da avó"
um poster da seleção,
ainda com Garrincha
Você se recosta
e equilibra
toda a loucura do universo
num só braço
o outro cruza
em direção às flores mortas
de um vaso alto e antigo,
desejoso de festas.
O sobrado se desgasta,
alguns musgos
o guardam.
No alto,
em letras ancestrais, está escrito "HOTEL"
e quase opacas.
Em baixo,
o luminoso
onde se lê "farmácia"
Fique aí,
fixe aí, você
que não sei de onde vem,
que não sabe onde está,
de quem desconheço a história Mas que pertence ao sobrado,
ao Estado,
ao país.
Longos cabelos negros,
os pensamentos tão longos
presos nos carros que passam "Fique"
com seu bisavô na parede,
a tinta rosa mofando seus vitrais
Enquanto logo abaixo
dos pêlos do seu braço,
o luminoso pisca
pisca e pisca,
Ainda dentro deste século.
* Poetisa gaúcha, radicada no Rio de Janeiro, autora de literatura infantil e ensaísta. Tem 16 livros publicados, entre os quais “Sombras chinesas” , “Caderno de Outono” (indicado ao Prêmio Jabuti) e “O amor é vermelho”.
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