Objetivos da vida
* Por
Pedro J. Bondaczuk
O fotógrafo norte-americano Edward
Steichen, acostumado a flagrar as cenas mais chocantes e incompreensíveis do
cotidiano, observou: "É possível compreender os estragos da bomba atômica.
Mais difícil é entender o significado da vida".
Aliás, tarefa dessa natureza
virtualmente raia ao impossível, dada sua complexidade ou a insignificância
humana. A compreensão do intrincado mecanismo vital a cada dia fica mais clara,
dados os avanços da ciência. A morfologia e o funcionamento das células,
tecidos, órgãos, aparelhos e organismos vivos, já perderam quase todos os seus
mistérios.
Cientistas já mapearam, ou estão
prestes a mapear, a totalidade dos genes humanos. Bebês de proveta há muito
deixaram de ser novidade. A engenharia genética já é capaz de mesclar
características de diferentes espécies numa só (os transgênicos) ou de clonar
qualquer um de nós, partindo de quaisquer das nossas células, não mais
necessariamente as da reprodução natural.
Todavia, qual é a "razão de
viver"? Qual a verdadeira finalidade da existência? Existe alguma? Há uma
única? São várias? Por que os seres –
animais ou vegetais – nascem, se
desenvolvem e se reproduzem, se estão, irremediavelmente, condenados a morrer?
Não seria um desperdício? Há vida em outras partes do Universo? Caso a resposta
seja afirmativa, ela é igual, semelhante ou diferente da existente na Terra?
São perguntas, perguntas e mais perguntas, infinitas delas, sem respostas
adequadas ou sequer satisfatórias...
Tais questões há muito desafiam filósofos
das mais variadas tendências e escolas, biólogos, astrônomos e especialistas
nas mais diversas áreas da ciência, sem que ninguém haja sequer se aproximado
de uma conclusão que, mesmo não
definitiva, ao menos se aproximasse, se não da verdade, pelo menos da
verossimilhança.
Os que têm fé, fundamentam os objetivos
da vida na esperança da eternidade, embora de forma muito vaga, em geral
induzida por suas próprias crenças e fantasias. A maioria prefere mergulhar
numa desesperada alienação, "vivendo" apenas, sem inquirir a si
próprios, à sua lógica e razão, sobre significados ou finalidades.
Há quem faça desse questionamento
interminável matéria-prima de sua arte, não importa qual. Para uns, viver
significa acumular bens, deter riquezas, possuir poder e satisfazer os
sentidos. Para outros, talvez um pouco mais sensatos, trata-se do processo
inverso: o de deixar algum legado, em obras – materiais, artísticas ou
espirituais –, idéias ou exemplos.
Muitos dogmas foram erigidos, e
persistem e até se multiplicam, que têm o efeito de uma espécie de
"narcótico", para afastar seus crentes da dura realidade, acatados
cegamente, sem reflexões ou considerações, por milhões de pessoas, que se
sentem "felizes" por não serem "obrigadas a pensar". Deixam
que outros pensem por elas. O imperador romano Júlio César observou,
sabiamente, que "os homens têm grande disposição para acreditar no que
desejam". E como têm!
Diariamente, aparecem charlatães, com
receitas "milagrosas" sobre a arte de viver, ditando normas, de
conformidade com suas fantasias e ilusões. E nunca lhes faltam discípulos e
adeptos. Religiões e mais religiões surgem do nada, criadas por espertalhões,
que exploram a ignorância, inocência ou boa fé dos mais simples ou néscios.
Fala-se, amiúde, por exemplo, em modernidade, embora, como constatou um
filósofo, em passado remoto: "não existe nada de novo debaixo do
Sol". E esse surrado clichê continua sendo rigorosamente verdadeiro.
Basicamente,
o homem contemporâneo é o mesmíssimo ser primitivo que um dia habitou as cavernas,
só que aprendeu a desenvolver ferramentas, cada vez mais sofisticadas, para
desempenhar tarefas vitais (e outras, nem tanto), que antes executava apenas
com as forças dos seus músculos. Substituiu, por exemplo, a magia dos rústicos
desenhos dos feiticeiros, traçados nas paredes da sua inóspita moradia
primitiva, pelo computador. Dominou processos naturais para o seu bem-estar.
Descobriu como produzir fogo, inventou a roda, aprendeu a plantar, a fiar e a
erigir edificações. Criou engenhocas mecânicas, cada vez mais complexas e em
maior quantidade, o tear, o motor a explosão, o automóvel, o telefone, o avião,
o rádio, a televisão, o foguete. Inventou a música, a pintura, a escultura, a
arquitetura. Criou os esportes e se deixou fanatizar por alguns deles, matando
ou morrendo por seu clube favorito. Todavia, na essência, continua o mesmo
animal selvagem, perigoso, traiçoeiro e venal, embora vulnerável, com seus
medos, mitos e indagações, sujeito a morrer a qualquer instante ou lugar.
Teorias para explicar os objetivos e,
sobretudo, o significado da vida abundam, a maioria de caráter esotérico,
usando jargões próprios para os "iniciados" (ou tolos?), com
expressões complicadíssimas, num arremedo de sabedoria, que no final das contas
não passa de estupidez, que pouco ou nada significam. Não passam de fantasias
delirantes, de engodos e de empulhações. Mas sempre contam com hordas de
fanáticos seguidores.
O verdadeiro, e sobretudo o belo, são
simples. A beleza está na simplicidade. E embora o homem seja incapaz de
entender o significado da vida (e talvez por isso mesmo), com que facilidade
ele a suprime! Inventa máquinas sofisticadíssimas de assassinatos em massa,
dizima espécies e mais espécies de animais e vegetais (que um dia lhe farão
muita falta) e elabora, com extremo cinismo, pomposas, mas abstratas,
justificações para o injustificável: as guerras! Apesar do "disfarce"
de modernidade, portanto, não passamos do primitivo animal, dito racional, que
apenas trocou as cavernas primitivas por mansões, apartamentos ou casebres em
infectas favelas de superpopulosas e violentas cidades.
* Jornalista, radialista e escritor.
Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981
e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras
funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e
“Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos), “Cronos &
Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991 a maio de 1996. Publicações da
Academia Campinense de Letras nº 49 (edição comemorativa do 40º aniversário),
página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio de 2001. Publicações da Academia
Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com.
Twitter:@bondaczuk
Estou no grupo que não faz perguntas, ainda que aprecie ler os que pensam por mim. Gostei dos termos usados como fantasia, empulhação, engodo, tolos. A resposta será muito forte para mim. Prefiro não sabê-la.
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