As Cataratas de Iguaçu
* Por Risomar Fasanaro
Chegávamos ao final da viagem. O clima de amizade, que já se instaurara no Grupo, se estreitou muito mais quando chegou a noticia da morte do pai de uma das integrantes. Não há nada que aproxime mais as pessoas do que um acontecimento triste como esse, ainda mais quando ocorre em meio a uma viagem, quando menos se espera. A mocinha interrompeu o passeio, para ir ao sepultamento do pai e ficou um clima de tristeza em todos nós.
Ali estávamos a caminho das cataratas, no lado brasileiro. Antes de chegar às quedas d’agua passamos por dentro do Parque Nacional de Iguaçu, por entre as árvores de uma floresta subtropical com 250 mil hectares, ouvindo os mais diferentes cantos de pássaros.
Deste lado os portadores de dificuldades de locomoção não têm acesso a todo o trajeto, devido às centenas de degraus que temos de descer antes de nos deparar com as cataratas. O guia nos informou que ali não é permitida a entrada de indígenas, o que me soa como uma ironia: embora o nome Iguaçu se origine do tupi-guarani, no lado brasileiro eles não têm permissão de entrar.
Depois de descer centenas de degraus, me deparo com o que só posso comparar com a primeira vez que vi o mar: medo e encantamento. É difícil crer que um país que possui tão grande volume d’agua venha a sofrer sua falta algum dia.
Continuando, o guia nos diz que estamos diante de um formação geológica que data de 150 milhões de anos. Enquanto ele fala, penso: se o homem não conseguir preservar tamanho tesouro para as futuras gerações é porque já perdeu toda noção de humanidade.
Nos primeiros tempos só os indígenas desfrutavam de toda aquela beleza. Foi em 1542 a primeira vez que ela foi vista por um branco, quando ali chegou a expedição de Dom Alvar Nunez Cabeza de Vaca, a bordo de canoas que havia adquirido dos índios kaicangues (guarani). Cabeza de Vaca estava a caminho do Rio Paraná, e batizou as cachoeiras de Santa Maria, mas o nome que prevalece até hoje é Iguaçu que significa muita água, água grande.
As cataratas se compõem de 275 quedas d’agua que se estendem por aproximadamente cinco quilômetros do Rio Iguaçu, a uma altura superior a 70 metros. E estar diante delas nos dá a dimensão de nossa pequenez.
Elas se localizam entre o Parque Nacional de Iguaçu, no Paraná, e o Parque Nacional Iguazu, em Misiones, Argentina.
A maior parte das cataratas fica do lado argentino, e temos de reconhecer, é o lado mais bonito. Beleza de tirar o fôlego, e que é de fácil acesso a todos: idosos e portadores de deficiência física.
No meio da trilha encontramos alguns quatis e vários pássaros. Estes últimos pousados em alguns galhos ficam tão à vontade entre os visitantes, que tiramos varias fotos e eles continuam ali tranquilos.
Mais adiante uma borboleta amarela pousou em meu braço e ali permaneceu até eu chegar à cachoeira. Desse lado argentino é possível chegar tão próximo das águas que vestimos capas plásticas para não nos molhar.
Redigindo este texto relembro uma lenda que li há muito tempo e que reli agora para dividir com você, leitor: as águas do Rio Iguaçu corriam livres e mansas, sem cataratas. Em suas margens viviam os índios kaigangues, que acreditam ser o mundo governado por M’Boy, um deus filho de Tupã, que tinha a forma de uma serpente.
Igobi, o cacique da tribo, tinha uma filha muito bonita chamada Naipi. Ela era tão bonita que quando se mirava no rio, as águas paralisavam. Por causa de sua beleza, Naipi foi consagrada ao deus M ‘boy.
Na tribo também havia um guerreiro muito belo, que se chamava Tarobá. Quando ele viu Naipi não resistiu a tanta beleza e se apaixonou por ela. No dia do ritual de consagração de Naipi, enquanto Igobi e o pajé bebiam cauim, ele e Naipi fugiram em uma canoa pelo rio abaixo.
Quando o cacique se deu conta da fuga dos dois, ficou tão furioso que mergulhou no ventre da terra e se retorceu tanto que provocou uma enorme fenda no rio. Tão grande que as águas ficaram revoltas e, com isso, o casal de enamorados mergulhou nas águas e desapareceu.
Naipi se transformou em uma das grandes pedras que se encontram no centro das cataratas. Ali ela permaneceu para sempre açoitada pelas águas e pelo vento. E Tarobá se transformou em uma palmeira à beira do abismo; inclinada sobre a Garganta do Diabo. Debaixo dessa palmeira se encontra a entrada de uma caverna, sob a Garganta do Diabo, onde o monstro fica de sentinela, guardando para sempre o casal de apaixonados.
Saímos dali embriagados por aquela beleza toda e voltamos ao hotel. No dia seguinte regressamos a São Paulo.
* Jornalista, professora de Literatura Brasileira e Portuguesa e escritora, autora de “Eu: primeira pessoa, singular”, obra vencedora do Prêmio Teresa Martin de Literatura em júri composto por Ignácio de Loyola Brandão, Deonísio da Silva e José Louzeiro. Militante contra a última ditadura militar no Brasil.
* Por Risomar Fasanaro
Chegávamos ao final da viagem. O clima de amizade, que já se instaurara no Grupo, se estreitou muito mais quando chegou a noticia da morte do pai de uma das integrantes. Não há nada que aproxime mais as pessoas do que um acontecimento triste como esse, ainda mais quando ocorre em meio a uma viagem, quando menos se espera. A mocinha interrompeu o passeio, para ir ao sepultamento do pai e ficou um clima de tristeza em todos nós.
Ali estávamos a caminho das cataratas, no lado brasileiro. Antes de chegar às quedas d’agua passamos por dentro do Parque Nacional de Iguaçu, por entre as árvores de uma floresta subtropical com 250 mil hectares, ouvindo os mais diferentes cantos de pássaros.
Deste lado os portadores de dificuldades de locomoção não têm acesso a todo o trajeto, devido às centenas de degraus que temos de descer antes de nos deparar com as cataratas. O guia nos informou que ali não é permitida a entrada de indígenas, o que me soa como uma ironia: embora o nome Iguaçu se origine do tupi-guarani, no lado brasileiro eles não têm permissão de entrar.
Depois de descer centenas de degraus, me deparo com o que só posso comparar com a primeira vez que vi o mar: medo e encantamento. É difícil crer que um país que possui tão grande volume d’agua venha a sofrer sua falta algum dia.
Continuando, o guia nos diz que estamos diante de um formação geológica que data de 150 milhões de anos. Enquanto ele fala, penso: se o homem não conseguir preservar tamanho tesouro para as futuras gerações é porque já perdeu toda noção de humanidade.
Nos primeiros tempos só os indígenas desfrutavam de toda aquela beleza. Foi em 1542 a primeira vez que ela foi vista por um branco, quando ali chegou a expedição de Dom Alvar Nunez Cabeza de Vaca, a bordo de canoas que havia adquirido dos índios kaicangues (guarani). Cabeza de Vaca estava a caminho do Rio Paraná, e batizou as cachoeiras de Santa Maria, mas o nome que prevalece até hoje é Iguaçu que significa muita água, água grande.
As cataratas se compõem de 275 quedas d’agua que se estendem por aproximadamente cinco quilômetros do Rio Iguaçu, a uma altura superior a 70 metros. E estar diante delas nos dá a dimensão de nossa pequenez.
Elas se localizam entre o Parque Nacional de Iguaçu, no Paraná, e o Parque Nacional Iguazu, em Misiones, Argentina.
A maior parte das cataratas fica do lado argentino, e temos de reconhecer, é o lado mais bonito. Beleza de tirar o fôlego, e que é de fácil acesso a todos: idosos e portadores de deficiência física.
No meio da trilha encontramos alguns quatis e vários pássaros. Estes últimos pousados em alguns galhos ficam tão à vontade entre os visitantes, que tiramos varias fotos e eles continuam ali tranquilos.
Mais adiante uma borboleta amarela pousou em meu braço e ali permaneceu até eu chegar à cachoeira. Desse lado argentino é possível chegar tão próximo das águas que vestimos capas plásticas para não nos molhar.
Redigindo este texto relembro uma lenda que li há muito tempo e que reli agora para dividir com você, leitor: as águas do Rio Iguaçu corriam livres e mansas, sem cataratas. Em suas margens viviam os índios kaigangues, que acreditam ser o mundo governado por M’Boy, um deus filho de Tupã, que tinha a forma de uma serpente.
Igobi, o cacique da tribo, tinha uma filha muito bonita chamada Naipi. Ela era tão bonita que quando se mirava no rio, as águas paralisavam. Por causa de sua beleza, Naipi foi consagrada ao deus M ‘boy.
Na tribo também havia um guerreiro muito belo, que se chamava Tarobá. Quando ele viu Naipi não resistiu a tanta beleza e se apaixonou por ela. No dia do ritual de consagração de Naipi, enquanto Igobi e o pajé bebiam cauim, ele e Naipi fugiram em uma canoa pelo rio abaixo.
Quando o cacique se deu conta da fuga dos dois, ficou tão furioso que mergulhou no ventre da terra e se retorceu tanto que provocou uma enorme fenda no rio. Tão grande que as águas ficaram revoltas e, com isso, o casal de enamorados mergulhou nas águas e desapareceu.
Naipi se transformou em uma das grandes pedras que se encontram no centro das cataratas. Ali ela permaneceu para sempre açoitada pelas águas e pelo vento. E Tarobá se transformou em uma palmeira à beira do abismo; inclinada sobre a Garganta do Diabo. Debaixo dessa palmeira se encontra a entrada de uma caverna, sob a Garganta do Diabo, onde o monstro fica de sentinela, guardando para sempre o casal de apaixonados.
Saímos dali embriagados por aquela beleza toda e voltamos ao hotel. No dia seguinte regressamos a São Paulo.
* Jornalista, professora de Literatura Brasileira e Portuguesa e escritora, autora de “Eu: primeira pessoa, singular”, obra vencedora do Prêmio Teresa Martin de Literatura em júri composto por Ignácio de Loyola Brandão, Deonísio da Silva e José Louzeiro. Militante contra a última ditadura militar no Brasil.
Risomar on the road. Vc está me saindo uma ótima contadora de histórias. De onde chega, nos traz mais um episódio. Prazer em te ler, cara aventureira.
ResponderExcluirObrigada, Daniel. Pelo menos sei que um dos leitores que me tem sido fiel é você. E isso me traz grande alegria.
ResponderExcluirBeijo
Risomar
Foi uma delícia voltar a essa maravilha com você nesse texto tão rico, Risomar! Beijos
ResponderExcluirDisse-me o guarda de uma exposição em Gramado Rio grande do sul.
ResponderExcluirIndio não entra!Minha amiga questionou e ele repetiu três vezes indio não entra.
E na sua história porque indigenas não entra?
Gosto de suas histórias.Abraços
Obrigada, Evelyne, por suas palavras sempre generosas.
ResponderExcluirBeijos
Risomar
Oi, Iracema
ResponderExcluirQue alegria e que orgulho ter meu texto lido por você! Não escrevi na crônica que questionei isso, para provocar os leitores, ver se alguém me perguntava, e quando li sua mensagem, adorei. Pois é, Iracema, eu perguntei isso ao guia, mas ele me respondeu que não sabe o motivo. Mas nós duas sabemos, não sabemos?
Mas se console com uma coisa, Iracema: o lado argentino, onde todos: indígenas, negros, brancos e deficientes podem entrar, é muito mais bonito que o lado brasileiro. Sem comparação. Será que todos os leitores sabem por que os índios são proibidos de entrar no Parque Nacional de Iguaçu?
Obrigada por seu comentário!
Beijos
Risomar