quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Motor do espírito


A curiosidade é a mãe da sabedoria”, diz conhecido dito popular. Trata-se de verdade óbvia, da qual poucos se dão conta. Quem não é curioso, no bom sentido, não se sente motivado a aprender coisa alguma, por mais que necessite desse aprendizado, mesmo que invista nele todos os recursos de que dispõe. Até aprende, mas com inaudito sacrifício, com muito esforço e, não raro, com imenso sofrimento.

Este deveria ser, portanto, princípio básico da educação. A criança precisa, desde tenra idade, ter sua curiosidade despertada, espicaçada e estimulada, em relação a tudo o que a cerca, não importa se a coisas concretas ou a ideias abstratas, se a pessoas ou a objetos, se a acontecimentos ou se a princípios. Não é, infelizmente, o que ocorre.

A curiosidade ilimitada, a ânsia por descobrir novidades a cada instante da nossa vida (úteis ou inúteis, não importa, já que saber não ocupa lugar), é fonte inesgotável de experiências e de sabedoria. Nossa existência é relativamente curta e precisaríamos ter milhares de vidas para aprender, e entender, tudo o que o mundo tem a nos ensinar.

Há quem busque tolher essa volúpia por informações, entendendo que se trata de um defeito. Não posso concordar com quem age assim. Temos que fazer de cada instante um renascimento, sem deixarmos tempo livre para emoções negativas, como a cobiça, a inveja, a ira, a vingança e tantas outras que só tendem a levar sofrimento aos outros.

A vida consiste em uma contínua descoberta, desde o nascimento até a morte. A partir do útero materno, quando nosso sistema nervoso e, por conseqüência, nosso cérebro estão formados, já temos consciência, embora sem possibilidades de externar esse conhecimento, de que existimos e nos encontramos em um ambiente muito bem protegido e acolhedor. Pelo menos é o que dizem os especialistas.

Aliás, isto é comprovável, mediante o processo da regressão. Trata-se da primeira descoberta de uma sucessão que cada indivíduo terá no correr de sua existência, de acordo com a sua realidade e sua personalidade. E todas são frutos desse poderoso motor do espírito, que é a curiosidade. Ao morrer, descobriremos o quanto foram tolos os dogmas e valores aos quais nos aferramos. Mas então já será tarde…

Por ser curioso, o ser humano conquistou o átomo, embora não tenha feito sempre o melhor uso dessa ciência. Pela mesma razão, descobriu e mapeou os códigos genéticos, responsáveis pelas características de todos os seres. Também movido por esse “motor”, aprendeu a duplicar animais e vegetais.

Conforme alegoria bíblica, o casal primitivo desobedeceu o Criador e comeu o fruto da Árvore do Bem e do Mal. Por que? Foi, também, por “curiosidade”, posto que mórbida, para ver o que acontecia, mesmo intuindo qual seria o resultado. Perdeu a inocência original, embora conquistasse o potencial de saber de tudo. Ou quase tudo.

Só um conhecimento, e para o seu próprio bem, lhe foi vedado (e para sempre): O do mistério da essência da vida. Caso o conhecesse, provavelmente conduziria à extinção da espécie. Tentaria imitar o Criador e certamente criaria monstros que o destruiriam.

Algumas verdades, preexistentes, mas que por alguma razão, não conseguimos alcançar em determinado período da nossa trajetória vital, de repente, emergem diante de nós, se desnudam aos nossos olhos, se revelam à nossa consciência.

Muitas são óbvias, mas encaramo-las dessa maneira apenas depois de consumadas. Esta consumação, em geral, ocorre com a aquisição da experiência, que é resultado de muitos anos de empirismo, de sucessivas tentativas e erros. E de uma permanente sede de saber, uma constante, incalculável e persistente curiosidade. Às vezes, isso nos redime, às vezes, nos decepciona, deprime e condena.

Uma descoberta, por exemplo, que é complicada quando a fazemos, por ferir nosso amor próprio, é a das nossas limitações. Mas ela é importante. Se quisermos empreender conquistas, é indispensável sabermos onde estamos, o que somos, o que queremos e o quanto podemos, até para podermos escolher a estratégia e os meios para a nossa evolução.

Não é necessário, todavia, alardear nossas deficiências. Mas é indispensável que as identifiquemos e nos disponhamos a corrigir o que estiver incorreto. O dramaturgo Auguste Strindberg sintetiza essa postura: "Para mim, a alegria de viver está na dura e cruel luta pela vida. O aprender algo é para mim uma alegria". Mas para que esse aprendizado se torne possível, e, sobretudo alegre, é preciso manter sempre ligado esse poderoso “motor” do espírito, que é a curiosidade, por tudo e todos.

Boa leitura!

O Editor.



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