quarta-feira, 27 de janeiro de 2016

Aula nota 10

* Por João Luiz de Almeida Machado


Pergunte a alunos e professores o que seria para eles uma “aula nota 10”. Você esperaria respostas semelhantes dos dois grupos? Claro que não. Já até posso ouvir alguns leitores dizendo que nem mesmo entre um professor e outro teríamos semelhante retorno, quanto menos ainda esperar que os estudantes devolvam em seus pareceres iguais respostas.

Agora, ao menos, alguns pontos pertinentes entre as respostas obtidas quanto a elementos de uma “aula nota 10” surgiriam, como por exemplo:

- É uma aula que gera mobilização e participação plena dos envolvidos;

- A comunicação nesta aula ocorre de forma a atingir todos os participantes permitindo que todos entendam, se interessem e possam atuar no contexto das ações;

- Existe uma dinâmica na aula que envolve teoria e prática. Esta relação é percebida e valorizada pelos participantes;

- A aula está bem planejada e sua execução ocorre dentro dos conformes pensados pelo proponente;

- As temáticas apresentadas e discutidas relacionam-se ao mundo em que vivemos e, por isso, tem para os participantes total sentido e geram motivação quanto a aprendizagem.

Acima de tudo, no entanto, fica a percepção de que uma “aula nota 10” é aquela em que ensino e aprendizagem se efetivam, acontecendo uma interação rica, com efeitos duradouros, senão permanentes, legando experiências que permanecem e ajudam todos os envolvidos, sejam eles os docentes ou os aprendentes nesta relação estabelecida.

Não se ensina ou se aprende sem que para os envolvidos o conhecimento seja significativo. Estar atrelado ao currículo, apresentado em um material didático de qualidade, ser trabalhado num formato tecnológico, utilizando dinâmicas agradáveis e envolventes pode não ser o suficiente para a real consolidação dos saberes.

Num primeiro momento tudo pode parecer claro e gerar resultados bons em avaliações imediatas, mas “aulas nota 10” devem ir além disso, gerando conhecimentos perenes, transformações em quem educa e é educado, olhares que ultrapassem os conteúdos imediatos e permitam associações e compreensões além dos horizontes limitadores.

É claro que, além disso, é preciso conhecer e aplicar a didática naquilo que esta área de conhecimento melhor dispõe para seus realizadores, os educadores. A estrutura da aula, suas motivações, os caminhos que enseja, as sinapses que deve despertar e tudo o mais dependem não apenas do conhecimento, mas principalmente da excelência na aplicação da didática. É neste momento em que separam os homens dos meninos, ou melhor dizendo, os educadores dos professores, pois o olhar dos primeiros se preocupa não apenas com os conhecimentos imediatos, mas com a preparação para toda a vida daqueles que está a preparar.

Carisma, persistência, estudo constante, humildade, organização e curiosidade devem igualmente constar como elementos que permitem ao educador planejar, propor e atuar com eficiência e resultados notáveis em suas aulas.

Ao mencionarmos organização entramos na seara mais imediata das “aulas nota 10”. Além dos planos gerais, dos currículos amplos, há as estratégias e técnicas mais imediatas, aquelas aplicadas no momento das aulas, que dão vida, cor, tempero e sabor ao trabalho nas escolas.

É nesta seara que o livro “Aula Nota 10”, de Doug Lemov, publicado no Brasil pela Editora Da Boa Prosa, em parceria com a Fundação Lemann, se estabelece como boa obra de referência, com aplausos e deferências em seu país de origem, os Estados Unidos e também em outras praças mundiais.

Resultado de pesquisas e levantamentos realizados com professores cujo trabalho teve reconhecimento por parte de seus alunos, considerados por Lemov como autênticos coautores da obra e sem os quais não existiria o livro, o trabalho apresenta de forma organizada 49 técnicas de trabalho que ensinam docentes a tornar suas aulas impecáveis e bem-sucedidas.

Há subdivisões entre as técnicas propostas, visando trabalhar diferentes metas ou objetivos, como por exemplo, “garantir um bom desempenho acadêmico”, “construir valores e autoconfiança”, “motivar os alunos nas suas aulas”, “criar uma forte cultura escolar” ou “estabelecer e manter altas expectativas de comportamento”.

Dentro destas e de outras categorias, o leitor encontra as 49 técnicas, cuja nomenclatura tende a ser bastante direta e objetiva quanto a seus caminhos e finalidades, é o que vemos por exemplo em propostas como “deixe claro”, “capriche nos detalhes”, “faça agora”, “tome posição”, “faça o mapa” ou “todo mundo escreve”, apenas para gerar curiosidade dos futuros leitores.

É preciso, não se pode esquecer disso, ler criticamente, sendo capaz de perceber as necessárias adaptações ao contexto de cada escola, das turmas de alunos com os quais lidamos e a própria cultura brasileira. Nem sempre é possível simplesmente pegar a receita e aplicar, sendo necessário adequar ao entorno e público que cada professor atende.

A aplicação das técnicas não significa sucesso imediato. É preciso estudar, verificar se estão de acordo com suas crenças, valores e filosofia de trabalho. Planejar ações e testar, sabendo que por vezes as coisas podem não funcionar tão bem e, se acreditar no que está fazendo, investir ainda que os primeiros frutos não tenham sido tão bons assim.

“Aulas nota 10” resultam da maturação dos profissionais, de sua constante busca por novos instrumentos e recursos, de autocrítica e de envolvimento real com a educação e com o ensino.

Livros como o de Doug Lemov ajudam porque reforçam a crença e a confiança, trazendo ideias e propostas já realizadas e bem-sucedidas desempenhadas por outros educadores.

Devem, inclusive, motivar os professores a criar, também eles, registros de práticas didáticas por eles realizadas que geraram resultados expressivos para que compartilhem nas escolas em que atuam e também pela rede mundial de computadores.

Obs.: O livro de Douglas Lemov tem, no Brasil, um Guia Prático, elaborado pelo Instituto Península, também publicado pela Editora De Boa Prosa, que aparece na abertura deste artigo, com capa amarela.


 •     Doutor em Educação pela PUC-SP; Mestre em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (SP); Professor Universitário e Pesquisador; Autor do livro "Na Sala de Aula com a Sétima Arte – Aprendendo com o Cinema" (Editora Intersubjetiva).

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