Por
que “The Guardian” capitulou ao terror de Estado?
* Por
Luiz Cláudio Cunha
O planeta agitou-se,
no início de junho (de 2013), com a revelação de um jornalista americano que
vive no Rio de Janeiro. Blogueiro do respeitado jornal inglês The Guardian, o
advogado Glenn Greenwald, 46 anos, divulgou o maior vazamento da história
envolvendo a vasta comunidade de inteligência, ao revelar documentos top secret
da Agência de Segurança Nacional (NSA) dos Estados Unidos. O material foi
fornecido a ele pelo especialista em informática Edward Snowden, 29 anos, um
ex-analista da CIA e ex-consultor da própria NSA, a maior agência de espionagem
eletrônica do mundo.
Snowden provou enfim o
que todos imaginam, sentem e desconfiam: sob o governo do democrata Barack
Obama, os Estados Unidos exercem, com furor e amplitude cada vez maior, o seu
papel de Big Brother de dimensões planetárias. Bilhões de ligações telefônicas,
e-mails, fotos, mensagens e videoconferências são vigiados diariamente pelo
aparato de inteligência norte-americano, com base nos gigantes da telefonia e a
cumplicidade de legendas da internet como Google, Facebook, Microsoft e Skype.
O repórter José
Casado, de O Globo, atuando em conjunto com Greenwald, colocou o Brasil na
roda, com documentos de Snowden provando que milhões de e-mails e ligações de
brasileiros e estrangeiros em trânsito pelo país foram monitorados pela teia da
NSA, que tinha até 2002 sua mais importante estação de espionagem na América
Latina montada em Brasília.
Fundo do poço
O mundo, pelo que revela
esta semana (agosto de 2013) a revista alemã Der Spiegel, de acordo com
Snowden, era um quintal dos arapongas americanos: com base num “Serviço
Especial de Coleta” espalhado numa rede internacional de 80 embaixadas e
consulados norte-americanos, a NSA grampeou, entre outros, o sistema de vídeo
interno da sede da ONU, a representação da Agência Internacional de Energia
Atômica (AIEA) em Viena e até os computadores da missão diplomática da União
Europeia (EU) em Nova York.
O caso chegou ao fundo
do poço em Londres, no domingo (18/8), quando o brasileiro David Miranda,
companheiro de Greenwald, foi detido pela polícia inglesa numa escala do voo
que fazia entre Berlim e Rio de Janeiro. Seis agentes se revezaram num
exaustivo interrogatório de quase nove horas a que submeteram Miranda, detido
com base numa lei antiterror de 2000, que antecede portanto a paranoia de
segurança desatada um ano depois com os ataques do 11 de Setembro da Al-Qaeda.
Nenhuma pergunta sobre
terrorismo foi feita ao brasileiro, detido no aeroporto de Heathrow apenas pela
condição de parceiro do jornalista que hoje mais assombra os serviços de
inteligência ocidentais. Perguntaram a Miranda sobre o seu relacionamento com
Greenwald, os nomes de seus contatos, suas reportagens, suas novas revelações.
Pouco antes de completar o período regulamentar para detenção sem denúncia
formal, a polícia liberou Miranda para o retorno ao Brasil, confiscando antes o
laptop, o celular e os pen-drives com arquivos criptografados que ele levava
para Greenwald.
A opinião pública
internacional ficou chocada com a descoberta de tantos abusos e violências,
secretas ou ostensivas, praticadas de forma sistemática por duas das maiores
democracias do mundo. Mas o mundo clamoroso do jornalismo pouco falou ou
simplesmente ignorou um incrível deslize ético cometido justamente pelo The
Guardian, num dos episódios mais bizarros do eterno conflito entre a liberdade
de expressão e a sacrossanta segurança nacional: a capitulação do jornal ao
Serviço Secreto inglês, que o obrigou a destruir fisicamente os computadores
onde arquivava documentos secretos vazados por Edward Snowden.
O caldo entorna
O épico deslize do
jornal de Greenwald foi confessado justamente pelo editor do The Guardian, Alan
Rusbridger, 59 anos, dois dias após a prisão do brasileiro em Heathrow. O
próprio jornal, que classifica o fato como “um dos mais estranhos episódios na
história do jornalismo da era digital”, publicou uma enviesada justificativa de
Rusbridger, que pode ser assim resumida:
No final de junho,
duas semanas após a primeira bombástica reportagem de Greenwald, o jornal
publicou outros documentos do NSA que revelavam o envolvimento do seu
correspondente inglês, o secretíssimo GCHQ, na coleta de dados privados pelo
programa de monitoramento chamado PRISM. Ninguém mexe impunemente no Government
Communications Headquarters, que paira acima do MI-5 (o FBI inglês) e até do
MI-6 (a CIA local, mais conhecido por ser a repartição de Sua Majestade onde
trabalha um tal Bond, James Bond).
O caldo entornou
quando o jornal revelou como agentes do GCHG espionaram líderes aliados dos
britânicos em dois encontros de cúpula em Londres. Horas depois, dois graduados
oficiais da Inteligência procuraram Rusbridger em seu escritório, na sede do
jornal em Kings Cross, zona central londrina, onde o Guardian ocupa um prédio
de sete andares que dominam um complexo de auditórios e artes visuais.
Os agentes foram
cordiais, mas deixaram claro que estavam ali seguindo “ordens superiores” para
exigir a entrega de todos os arquivos que Snowden forneceu ao The Guardian.
Alegaram que o material era roubado, mas não chegaram a ameaçar com a Lei de
Segredos Oficiais. Rusbridger e seu editor adjunto, Paul Johnson, argumentaram
que a reportagem tinha um “substancial interesse público ao descrever uma
vigilância governamental de escala até então desconhecida (…) particularmente
devida à aparente fraqueza do controle do Parlamento e do Judiciário”. Ninguém
convenceu ninguém, e os agentes foram embora.
Cena patética
O jornal continuou,
pelas três semanas seguintes, a publicar novos dados comprometedores sobre a
parceria NSA-GCHG na intercepção de telefones e internet. Os agentes voltaram,
dessa vez com um discurso mais rigoroso: “Vocês já se divertiram bastante.
Agora nós queremos aquele material de volta”, exigiram. Os dois oficiais deram
outra explicação para a impaciência dos chefes. Temiam que governos estrangeiros,
especialmente Rússia ou China, invadissem a rede do jornal. Os editores
retrucaram, alegando o sistema de segurança que envolvia os arquivos, mantidos
isolados e fora de qualquer sistema do jornal. Entre 16 e 19 de julho, a
pressão do governo cresceu, com telefonemas e reuniões seguidas, aumentando o
risco de uma ação judicial ou até de uma blitz policial.
Dois objetivos
pareciam claros: ou inibir o jornal de novas denúncias ou forçar a simples
entrega dos arquivos. Rusbridger explicou aos arapongas da rainha que havia
cópias extras dos arquivos nos Estados Unidos e no Brasil. Mas, diante do
perigo iminente de um processo, que poderia congelar a reportagem ou forçar a
devolução do material, o editor amoleceu e disse que preferia destruir os seus
arquivos. O jornalista achava que entregar o material aos agentes seria uma
traição à fonte dos arquivos, Edward Snowden, e os arquivos ainda seriam usados
pelos Estados Unidos para seu indiciamento na Justiça.
Nesse momento,
Rusbridger tomou a temerária decisão de destruir os arquivos de Londres, para
continuar usando suas cópias no Brasil e nos Estados Unidos, onde os
jornalistas são protegidos pela Primeira Emenda que garante a livre expressão.
O caso tomou, então, uma dimensão patética: uma constrangedora discussão entre
jornalistas e agentes de inteligência sobre a melhor forma de destruir um
arquivo e, ao mesmo tempo, proteger o jornal e seus repórteres.
A prova do crime
E uma cena
inimaginável chegou então ao porão do prédio de escritório de Kings Place, numa
quente manhã de um sábado, sob o testemunho solitário de cinco pessoas: o
adjunto Paul Johnson, a diretora executiva Sheila Fitzsimons e o especialista
em computação do jornal, David Blishen, vigiados por dois graduados oficiais do
GCHQ, armados apenas de notebooks e câmeras digitais. O McBook do jornal que
trazia os arquivos explosivos de Snowden foi atacado ferozmente por Johnson e
Blishen, que usaram um moedor de disco e uma furadeira para destruir o disco
rígido e os chips de memória. Os agentes tiraram fotos dos despojos no chão,
mas não levaram nada.
Era um ato simbólico,
como descreveu o jornal, com tom filosofal: “Foi um encontro inigualável na
longa e difícil relação entre imprensa e os órgãos de inteligência, e um
inusitado e muito físico acordo entre as exigências da segurança nacional e da
livre expressão”. A prova do crime, uma foto com os restos mutilados do que um
dia foi a memória destroçada do computador do jornal, estampou o artigo do The
Guardian com a autoconfissão da autodestruição praticada sob a pressão e
controle do governo britânico. Muito mais poderia ser dito ou lembrado ao
principal personagem dessa história, Alan Rusbridger, nascido no norte da
Rodésia (atual Zâmbia), ex-integrante do coro de uma igreja cristã, pianista
amador apaixonado por Chopin e professor visitante de História da Universidade
de Londres.
Rusbridger tem idade e
experiência suficientes para lembrar um precedente histórico que, ao contrário
dele, eleva e consola o jornalismo, como trincheira de resistência ao poder e
exemplo pétreo da livre expressão devotada ao interesse público. Em 1971, 42
anos antes do The Guardian dizer “sim” e capitular sem remorso ao terror do
Estado, o The New York Times disse “não” e resistiu bravamente ao poder
intimidador da maior potência militar do mundo. Num domingo, 13 de junho, o
mais importante jornal do mundo começou a publicar a primeira de nove
reportagens que resumiam as 7 mil páginas de 43 volumes da mais demolidora
análise da Guerra do Vietnã. Era um estudo top-secret do Departamento de
Defesa sobre o conflito que envolvia os americanos no Sudeste asiático entre
1945-67.
Cívica epifania
Só 15 cópias foram
feitas, por ordem do secretário de Defesa Robert McNamara. Apenas 36
especialistas participaram do projeto, um deles um ex-comandante da Marinha e
analista estratégico chamado Daniel Ellsberg, então com 40 anos. Trabalhando na
Rand Corporation, encarregada do estudo, passou meses e noites furtivas
copiando página por página na máquina xerox que revelaria ao mundo os “Papéis
do Pentágono”.
Separados por quatro
décadas, Ellsberg e Snowden, por razões parecidas, tiveram a mesma cívica
epifania, de repente iluminados pela revelação sobre a natureza maligna do
poder a que serviam.
Snowden, em 2013,
percebeu: “Eu estou disposto a me sacrificar porque não posso, em sã
consciência, deixar que o governo dos Estados Unidos destrua a privacidade, a
liberdade da internet e os direitos básicos das pessoas em todo o mundo, tudo
em nome de um maciço serviço secreto de vigilância que eles estão
desenvolvendo”.
Ellsberg, em 1971,
constatou: “Não há dúvida em minha mente de que meu governo está envolvido em
uma guerra injusta que vai continuar e se ampliar. Milhares de jovens estão
morrendo a cada dia. Senti que, como cidadão americano, como um cidadão
responsável, já não podia ocultar esta informação do público americano. Eu fiz
isso sabendo que corria perigo, e estou preparado para responder às
consequências desta decisão”.
Os papéis do Pentágono,
que reconheciam secretamente que a guerra não tinha futuro e que a derrota era
inevitável, foram vazados por Ellsberg para um velho conhecido do Vietnã, Neil
Sheehan, 34 anos, repórter do The New York Times, tido como um teimoso
descendente de irlandeses que acordava tarde e escrevia ferozmente entre uma e
quatro horas da madrugada. Ellsberg tinha encontrado o sujeito e o instrumento
certos para seu empreendimento. O repórter Harrison E. Salisbury, que vazou
para o mundo o discurso secreto do premiê Nikita Khrushchov ao congresso do
Partido Comunista soviético em 1956 denunciando os crimes de Josef Stálin,
definiu assim o The New York Times: “Era o mais completo, minucioso e
responsável diário que o tempo, o dinheiro, o talento e a tecnologia na segunda
metade do século 20 era capaz de produzir”.
A 400 metros
Desde 1896, quando
Adolph S. Ochs comprou aquele pequeno jornal para torná-lo uma legenda do
jornalismo, a Redação era movida por um lema que hoje faz falta ao bom
jornalismo de todas as latitudes: “Dar a notícia de forma imparcial, sem medo
ou favor, independente de qualquer partido, seita ou interesse envolvido”. Nos
anos 1970, afrontar ao mesmo tempo o Pentágono dos falcões do Vietnã e a Casa
Branca de Richard Nixon era tarefa para poucos ou para loucos, sem medo ou
favor. Só podia ser coisa para o Times do velho Adolph.
Divulgar os segredos e
a autocrítica do complexo industrial-militar era uma tarefa portentosa, mesmo
para um jornal tão destemido. Tom Wicker, um de seus maiores repórteres, resumiu:
“A publicação dos Papéis do Pentágono foi a mais celebrada violação da
segurança nacional dos tempos modernos”. Por isso mesmo exigiu cuidados
extremos, que mostram a obstinação de uma pauta que movia montanhas. Não era
possível trabalhar um material tão sensível no burburinho do terceiro piso do
velho prédio de 15 andares do Times, no número 229 da Rua 43. Ali, a Redação
ampla e aberta ainda não tinha os cubículos e baias que retalharam o espaço a
partir de 1978, quando chegaram os computadores. Não era um bom ambiente para
trabalhar e digerir os 43 volumes sensíveis e nervosos do Pentágono.
A solução foi descer
até o térreo, dobrar 140 metros à esquerda, até a 7ª Avenida, descer 90 metros
até a rua de baixo e andar mais 170 metros até o número 234 da Rua 42, onde
ficava o hotel New York Hilton. Ali, 400 metros distante da redação barulhenta,
o Times discretamente instalou a sua força-tarefa, comandada por Sheehan e
integrada por outros três editores, quatro repórteres, cinco secretárias, um
pesquisador, um diagramador, três grandes cofres e vários guardas de segurança
do jornal, que não faziam ideia do que vigiavam ali, 24 horas ao dia. De acordo
com o código da equipe, no yellow floor (andar amarelo) ficava o apartamento
1106, base de trabalho do solitário Sheehan. Todos os outros se distribuíam
pelos quartos do blue floor (andar azul), no 13º piso do Hilton.
O pesadelo
Todas as folhas de
rascunho e páginas amassadas na rotina agitada daquelas 15 pessoas eram
recolhidas cuidadosamente em sacolas de shopping no fim do dia e levadas de
volta para a redação da Rua 43, onde eram trituradas. O jornal sabia do poder
de seus inimigos, e também vivia a paranoia de estar sob vigilância. Nas manhãs
serenas de domingo, o chefe da segurança do Times fazia uma cuidadosa vistoria
e troca das linhas telefônicas do terceiro (Redação), décimo (editorial) e
décimo-quarto (editoria-executiva) andares. O editor-executivo do jornal, o
experiente Abe Rosenthal, vivia um pesadelo recorrente quando dormia: via Nixon
em rede nacional de TV, tendo ao lado os outros três presidente vivos (Truman,
Eisenhower e Johnson), vociferando contra o vazamento da papelada do Pentágono
pelo Times.
Na vida real, não foi
tão ruim, mas foi quase isso. O jornal, que tinha uma tiragem de 815 mil
exemplares na semana, preparou uma edição especial de 1,5 milhão de exemplares
naquele domingo histórico, 13 de junho de 1971. Nixou ficou furioso quando leu
e entendeu a gravidade do vazamento. “Temos que botar essa gente na fogueira
por este tipo de coisa… Vamos botar esses filhos da puta na cadeia!”, trovejou
para seu assessor de Segurança Nacional, Henry Kissinger. A primeira reação da
Casa Branca na Justiça bloqueou novas edições, e o Times suspendeu sua série
por duas semanas. Esperto, Ellsberg vazou novos papéis do Pentágono para o
concorrente, The Washington Post, dando trabalho dobrado aos advogados de
Nixon. E o vazamento virou inundação quando Ellsberg repassou documentos a
outros 17 jornais, só para chatear a Casa Branca.
O processo na Justiça
subiu para a Suprema Corte, onde o Times acabou ganhando por 6 a 3 o direito de
retomar a publicação dos “Papéis do Pentágono”, numa histórica decisão que
reafirmou a liberdade de expressão assegurada pela Primeira Emenda. Derrotado,
e preocupado com novos vazamentos, Nixon repassou a tarefa para seu chefe da
Casa Civil, John Ehrlichman, que teve uma boa ideia: em 24 de julho de 1971, um
mês e onze dias após a revelação dos “Papéis do Pentágono”, foi criada a
unidade secreta dos “Encanadores da Casa Branca”, integrada por homens como E.
Howard Hunt e G. Gordon Liddy. O último trabalho deles foi a invasão de um
prédio de escritórios em Washington. Eles entraram na madrugada de 17 de junho
de 1972 em Watergate. Richard Nixon saiu da Casa Branca ao meio-dia de 9 de
agosto de 1974. O chefe supremo dos encanadores não conseguiu estancar o
vazamento de sua autoridade e tornou-se o primeiro presidente americano a
renunciar ao cargo.
A distância medida
A aposta arriscada do
The New York Times em 1971, em tempos tão inseguros quanto os atuais, levanta
uma questão pertinente para o The Guardian de 2013: por que o jornal inglês não
apostou contra o poder, como fez o americano? A força-tarefa montada no hotel
em torno de Neil Sheehan mostra uma férrea determinação do Times e a
consciência do papel histórico de um jornal que assume um compromisso, sem medo
ou favor. A constrangedora cena armada no porão por Alan Rusbridger exibe uma
inesperada capitulação do Guardian na infame presença de agentes secretos que
brandem a ameaça da lei e fazem terror com o peso do Estado.
Quatro décadas antes,
o Times pesou as alternativas legais e brigou com a força da lei, sem sucumbir
a ela, nem se intimidar diante dela. Tanto que levou o caso às últimas
instâncias da Suprema Corte, de onde o jornal saiu adornado por uma vitória que
reafirmou o primado da imprensa livre sob o império de um presidente
politicamente belicoso e moralmente desonesto como Richard Nixon, conhecido
desde 1950 na campanha para senador na Califórnia como “Tricky Dick” (Dick
Vigarista).
Os agentes que
visitaram o Guardian, para ameaçá-lo, fizeram o que deles se esperava, mas o
editor do jornal não reagiu como seria esperado. A justificativa da capitulação
de Rusbridger pela existência de arquivos replicados em solo americano e
brasileiro só agrava sua falta de firmeza e de caráter. Justamente por ter os
documentos protegidos, tinha o Guardian todos os motivos para desdenhar da
ameaça de uma retaliação legal ou até de uma blitz policial. A violência do
Estado britânico, calcado na lei antiterror, soaria inútil e despropositada.
Mais do que isso:
competia ao Guardian, como fez o Times com bravura, expor a face truculenta dos
agentes graduados do GCHG que falavam em nome do governo. A resistência do
Guardian em torno de uma boa causa, a livre expressão e a independência do
jornal diante do governo, só lhe traria apoio político, a solidariedade
internacional e o respeito de seus leitores.
O editor do The
Guardian preferiu se prestar ao indigno papel de quebrar seu computador diante
de dois agentes secretos e espatifar sua credibilidade diante dos leitores.
Em 2013, o The
Guardian se dobrou diante do poder, ajoelhado no porão.
Em 1971, o The New
York Times dobrou o poder, entrincheirado no 11º andar do hotel onde mostrou o
seu papel na história.
Esta é a diferença
medida entre um e outro. Doze andares de ética.
*
Jornalista
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