sexta-feira, 20 de março de 2015

Roupa de festa


* Por Rodrigo Ramazzini


- Enfim sábado – falou Clarissa para si, ao despertar pela manhã.

Havia sido uma semana particularmente conturbada. Problemas no trabalho, atividades da faculdade atrasadas, carro na manutenção, tudo praticamente ao mesmo tempo. Mas estes empecilhos Clarissa, com desenvoltura, os solucionou. O que não lhe saía dos pensamentos era o fim do namoro de dois anos com o Fábio, fato ocorrido na terça-feira.

Terminaram após mais uma briga motivada pelo ciúme dele. Segundo ela, não teria mais volta. Apesar de amá-lo e dos dois dias de muito choro pelos cantos, proferia: “Vida nova daqui para frente”. E nada melhor, segundo ela, do que cair na balada para recomeçar.

Passou a tarde do sábado ligando para as suas antigas companheiras de festa. Combinaram de jantar, juntas, em uma pizzaria, e após irem a alguma casa noturna.      Clarissa arrumou-se como há tempos não fazia. Colocou a sua melhor roupa, caprichou no cabelo, maquiou-se com todo o cuidado. Ficou linda! E olhando-se no espelho pela última vez, retocou o batom e rumou para a pizzaria.
 
Chegou ao local combinado esbanjando alegria, falando alto e distribuindo beijos e abraços, o que surpreendeu todas, pois Clarissa era conhecida entre as amigas como mulher de atos discretos, charmosa. Uma das amigas ainda comentou: “O término com o Fábio rejuvenesceu-a, amiga! Parece estar mais feliz!” Clarissa respondeu: “Capaz! É impressão sua”. E largou enorme gargalhada.

Comeram e beberam durante um bom tempo na pizzaria. Clarissa era a que mais chamava atenção na mesa, pois não parava de pedir músicas ao artista que tocava no local. Solta, livre, desimpedida, assim aparentava estar. Até ameaçou paquerar um rapaz da mesa ao lado.

Da pizzaria foram direto para a casa noturna. E lá chegando, as amigas tomaram a iniciativa de apresentá-la aos seus conhecidos. Com isso, ela tornou-se a atração da festa, tanto pela simpatia, conversas e sorrisos, como pela beleza. Clarissa sentia-se feliz, em um mundo mágico. Um mundo que há tempos não freqüentava, aparentemente perfeito.

Divertia-se aos montes. Dançava, paquerava, andava de um lado para outro da festa. Foi então que em uma dessas caminhadas, cruzou em frente à copa e lá estava ele, Fábio, escorado, a tomar um copo de uísque. Ela o ignorou. Passou e nem o cumprimentou. Se juntou às amigas e ficou, discretamente, a observá-lo de longe.

Há pessoas que quando terminam um relacionamento (e como isso não bastasse), ainda sim, necessitam vingar-se do ex. Essa vingança, muitas vezes, não passa de uma tentativa para responder as próprias incertezas. Algo como: “Será que consigo viver sem ele?” Ou provar algo: “Viu como sou feliz sem você?” E com Clarissa não foi diferente.

Ela esperou Fábio ficar a olhá-la, “retornou” esse olhar, e então, lascou um beijo no rapaz que dançava à sua frente. Beijava e olhava para Fábio. Fez isso por três vezes com três caras diferentes durante a noite. O ciumento Fábio nada fez, apenas observou, resignado.

Fim de festa. Suas amigas largaram-na em sua casa. Uma delas ainda comentou com Clarissa: “Arrasou hoje hein, gata!” Ela apenas sorriu e abanou para o carro, que se afastava. Entrou em casa silenciosamente, foi ao banheiro, tirou a roupa de festa e deitou-se  na cama. E, escorada, a cabeça no travesseiro, uma lágrima escorreu...

Na solidão do quarto ela já podia chorar a falta que Fábio lhe fazia...


* Jornalista e cronista

Um comentário:

  1. A moça ruiu ao chegar em casa e lavar-se da encenação. Ainda correu o risco de pegar alguma doença. Péssima estratégia, porém comum e verdadeira.

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