A sopinha do
Zarur
* Por
Edir Araujo
“Que
sopinha boa, não é, meu irmão?!
Tem
vitamina e tem agrião!
Todos
os dias venho de Nova Iguaçu
Só
pra comer a sopinha do Zarur.
Se
não fosse ela eu já estava no Caju.”
Este refrão ouvia
quando criança e ainda perdura insistentemente na minha cabeça.
Vez por outra
recordo-o, com certa melancolia, invadido por singelo toque emocional.
Eram os anos 60 que já
se vão longe, e entre saudosas lembranças pueris, vinha da rua cansado e sujo
após muito brincar com a molecada. Ao entrar em casa ouvia o rádio transmitindo
às 18 horas este inesquecível refrão. E assim ia tomar banho quase sempre perseguido
por um arranhão no joelho que provocava ardência sob a água do chuveiro, ouvindo
e cantando junto: “Que sopinha boa, não é, meu irmão?! (...)”
Abro este preâmbulo,
meus caros amigos e leitores, para exaltar as admiráveis proezas de Alziro
Zarur e a LBV, que ficou conhecida por
seu caráter assistencialista, notadamente a sopa servida aos carentes.
Alziro Abrahão Elias
David Zarur foi um jornalista, radialista, poeta e escritor, fundador e
primeiro presidente da LBV (Legião da Boa Vontade). Criou a Ronda da Caridade,
onde distribuía, à meia noite, sopa aos pobres, entre eles muitos moradores de
rua que aguardavam ansiosos a sopinha, servida nas madrugadas frias na
periferia do Rio de Janeiro. A sopa era distribuída pelos legionários marcando
o dia 1º de setembro de 1962 como um dia histórico para a LBV, quando ocorreu a
primeira Ronda da Caridade.
Mas porque a meia
noite? Alziro Zarur dizia que “nesse horário, os falsos pobres não estavam mais
nas ruas” (sic). Grande pregador da Palavra de Deus, Zarur fazia questão de dar
não apenas o alimento material, mas também o espiritual, pelas ondas da Rádio
Mundial, onde dava grande ênfase ao mandamento de Jesus Cristo: Amai-vos uns
aos outros como eu vos amei.
Durante 10 anos
divulgou toda a Bíblia, de meia em meia hora, durante as 24 horas do dia, fato
que se tornou até hoje único em todo o mundo.
Hoje, 01 de março de
2015, o Rio de Janeiro completa seus 450 anos de história, e entre tantas
histórias é preciso resgatar mais esta, de 50 anos atrás, quando, em 1965,
nosso Rio de Janeiro comemorava 400 anos de sua fundação, quando Zarur foi
homenageado com o título de "Radialista do IV Centenário".
Comunicador excepcional, sagrou-se campeão mundial de permanência no ar, com a
impressionante marca de 33 mil audições.
Com tantos predicados
e uma trajetória digna de nota faz-se necessário enaltecer alguns dados
curiosos sobre este homem iluminado, carismático, dotado de grandes virtudes.
Pois bem, pra quem não sabe, nasceu no dia de Natal, 25 de dezembro, no Rio de
Janeiro, em 1914, ano que eclodiu a Primeira Guerra Mundial. Filho de
imigrantes árabes - Ássima e Elias Zarur - foi aluno brilhante do Colégio Dom
Pedro II e já nesse tempo demonstrava seu pendor para o jornalismo e para a
liderança: depois de escrever em todos os órgãos do colégio, fundou o próprio
jornal (O Atalaia) e foi chamado para dirigir o órgão oficial, Boletim do
Colégio Pedro II.
Entre suas citações
destaco esta, onde assevera: “Perdoar é transferir a Deus o julgamento. Mas o
Pai Celeste não impede os bons de se defenderem dos maus.”
Seu pendor poético é
indiscutível, e permitam-me reproduzir aqui apenas para degustação a primeira
estrofe de “Poema Do Amor Sem Alma” em Poemas da Era Atômica.
“Sabia-se
formosa (e, de fato, ela o era)
E
desse hostil poder Leviana abusava:
Olhava
de alto abaixo o espelho, e se extasiava
Ante
o próprio esplendor do seu corpo-quimera.
Sadicamente
má, antegozava, à espera:
Mais
um homem que vinha... Outro, após, se ajoelhava.
Iludia
sem dó... Sem dó martirizava.
Divertiu-se
a valer essa divina fera!
Mas,
uma dia, não sei por que desígnio incrível
A
um Dom João qualquer, sem motivo plausível
Leviana
escravizou-se, inerme, inofensiva.
E
quando investiguei, com olho de Nordau,
Descobri,
facilmente, a causa decisiva:
Ele
era um homem mau, completamente mau”.
(...)
Dono de uma voz
potente e tocante, participou da chamada "Era de Ouro" do rádio
brasileiro. Sua preocupação em respeitar as diferentes religiões foi
reconhecida pelo Vaticano, sendo agraciado com a medalha do Papa Paulo VI,
"por serviços prestados à causa do Ecumenismo". Foi sócio remido da
Associação Brasileira de Imprensa (ABI). Polêmico e carismático, de forma
popular e inovadora era pregador entusiasta do Evangelho e do Apocalipse de
Jesus. Sua passagem para o Plano Espiritual aconteceu em 21 de outubro de 1979,
aos 64 anos, de ataque cardíaco em sua residência no Leblon. Foi produzido no
ano passado, em 2014, em seu centenário de nascimento, pela Boa Vontade TV,
(que pode ser acessado neste link http://www.boavontade.com/tv) um documentário
biográfico celebrando a vida e a obra desse grande brasileiro de Boa Vontade.
Edir, acredito que a intenção permaneça boa, mas foi desvirtuada através dos tempos. Eu, por exemplo, acho a abordagem insistente e intransigente das moças que pedem ajuda em nome da LBV insuportável, e também, quando estive em Brasília conheci o Templo da LBV, e o achei de uma ostentação que humilha o Brasil. Por tudo isso, não sentia simpatia por esse senhor. Achei bom conhecer o outro lado da história.
ResponderExcluirObrigado, Mara, pelo seu comentário, compreendo e respeito a sua opinião. Abraço deste amigo e admirador,
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