segunda-feira, 8 de dezembro de 2014

In Excelsis

* Por Daniel Santos


Hordas das montanhas e d’além-mar chegavam com bandeiras da raça, tomavam esplanadas, progrediam pelas avenidas com hinos de louvor a seus ídolos e aglomeravam-se, suarentas, na praça defronte ao estádio.

Tudo troava na iminência do grande embate. Machos carnívoros de dentes quase raivosos trinchavam nacos da carne que respingava sangue ainda vivo e borras de gordura nos peitos lustrosos de suor e galhardia.

De parte a parte, o eco das provocações reboava pela arquibancada, onde as raras mulheres encolhiam-se, tímidas, em meio ao espetáculo dos varões que passavam, de boca em boca, ânforas de vinho e de algália.

Aos poucos, tambores e guizos diminuíram sua intensidade, o incenso de folhas de louro evolou por entre todos e uma revoada de pombos evadiu-se a toque de fogos que anunciavam o grande momento.

Parecia a guerra, mas só parecia. Ombros juntos, lavados em suor, corados de entusiasmo, cegados pela idolatria, os pagãos levitavam, agora,  bem acima da realidade e do pecado. Esticassem o braço, tocariam Deus.

* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.




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