Balanço de fim de ano*
** Por
Wanderlino Arruda
Nem só de
contabilidade vive o homem. Não só de pão, não só de contas, de cálculos
atravessamos os trezentos e sessenta e cinco dias do calendário. Nem poderia
ser porque muito do que fazemos, do que tentamos fazer, do que alegramos e do
que sofremos, não é passível de transformação em algarismos, em percentuais com
pontos e vírgulas.
Os sentimentos, por
exemplo, jamais serão medidos, pois qual é a dimensão do amor, da desilusão, da
amizade, da tristeza? Dor e prazer têm tamanhos? Quanto aprendi, quanto deixei
de aprender? Quanto ensinei? Eu poderia ter sido mais alegre, poderia ter
evitado que tanto de sofrimento, de sacrifícios? Poderia ter feito as pessoas
mais felizes, mais confiantes em si mesmas? Só perguntas, um mundo de
interrogações, nenhuma resposta mensurável. Assim é a vida. Um mundão sem
porteiras como tem dito o chamado filósofo de Brejo do Mutambal, tão citado
pelos irmãos J e J.
Mas vamos a 1985 que
estamos acabando de viver, de retirar dele todas as venturas e desventuras,
toda uma vivência brasileira de aprendizagem política e social como há muito
tempo não tínhamos em nossa história pátria. Examinemos todos os planos, do
maior que Tancredo Neves começou a movimentar com suas viagens a vários países,
com as entrevistas inteligentes recheados de conhecimento técnico, de cultura
humanística, de visão do viver e do conviver, e dos planos menores, aqui pela
velha Minas Gerais, até os acontecimentos desta sofrida e nunca esquecida
terrinha de Gonçalves Figueira. Ficou melhor ou ficou pior? Mudou ou não mudou
alguma coisa além do horário de verão? Há diferenças entre a velha e a nova
República? Mudou o Natal ou mudamos nós, como diria o velho Machado de Assis?
Só estou perguntando, a resposta é sua, minha senhora!
Façamos um exame dos
acontecimentos e verifiquemos se o nosso conceito nacional melhorou diante dos
outros povos do mundo. Estamos ocupando mais espaço na imprensa estrangeira com
assuntos sérios e interessantes? Nossos diplomatas e negociadores de dívidas
estão mais ouvidos e respeitados? As conferências do nosso Dom Helder Câmara
continuam sendo aplaudidas? Será que o Jorge Amado será mesmo prêmio Nobel da
Literatura? Em que pé fica nosso reatamento diplomático com o governo de Fidel
Castro? Vamos ou não vamos abastecer o mercado chinês com mais de um bilhão de
consumidores? Os Estados Unidos continuam sendo invadidos pela nossa indústria
de aço e de sapatos? E como vai nossa (in) suficiência de petróleo, se é dele
que a cidade de Nova Iorque se ilumina? No plano estadual, quantas viagens fez
o nosso governador Hélio Garcia, quantos secretários demitiu, quantos
secretários botou para dentro? E em Montes Claros, será que passamos em mais um
teste?
Desculpe-me, minha
senhora, se só estou fazendo interrogações. Foram tantos os acontecimentos
deste nosso ano que acaba, que seria impossível aqui enumerá-los. O que é
preciso responder fica na cabeça de cada um, uma vez que tudo depende de como
estamos recebendo os impactos, os resultados, as atitudes, de como nosso
comportamento fica mudado a cada hora e a cada dia. O que vale é o nosso
conteúdo íntimo de felicidade, de fé, de esperanças. Nosso relacionamento com
as pessoas melhorou? Estamos sendo mais fraternos? Se isso aconteceu, tudo bem,
agradeçamos a Deus o ano de 1986! E vamos enfrentar o ano novo.
*CRÔNICA ESCRITA EM
1985
Passados 29 anos, nossas angústias continuam as mesmas. Parabéns pelo amplo rol de preocupações daquela época. Mudamos, o mundo mudou e estamos quase no mesmo ponto.
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