quinta-feira, 12 de novembro de 2009




Fuga e união

* Por Pedro J. Bondaczuk

A realidade, muitas vezes, se nos afigura tão horrenda, violenta, injusta, sem sentido e sem esperanças de que mude para melhor, que nos sentimos tentados, nessas ocasiões, a fugir dela, a nos distanciarmos do que acontece conosco e/ou ao nosso redor e fingir que nada disso está acontecendo. Mas como fazer isso? Fugir para onde?

Há, é verdade, circunstâncias que são o oposto. Existem momentos tão sublimes e gratificantes que gostaríamos que não acabassem nunca. Sonhamos que o mundo todo venha a ser tão maravilhoso, como aquilo que vivenciamos, mas que temos convicção de que irá passar. Tudo passa, o bom e o mau. Mas como fazer isso? Como tornar esse sonho pelo menos minimamente realizável, se não concreto?

Só conheço uma única resposta para todas essas questões. Podemos fugir da realidade horrenda que nos assola, ou que nos rodeia, através da arte. E só podemos mudar o mundo para melhor também por meio dela. Não ria, amigo leitor, se você for artista saberá do que estou falando.

Esse ato de criação, essa forma de expressão de sentimentos, pensamentos e observações – como que num desabafo – proporciona-nos o meio mais seguro e eficaz para a fuga do horror, da violência, das injustiças e de tudo o que transforma o mundo – que poderia e deveria ser um paraíso para todos – em sucursal do inferno. E fugir para onde? Para um lugar em que tirano algum poderá nos alcançar e atingir: para o nosso próprio interior.

Creio, piamente, no poder regenerador da arte. Ademais, ela não é, apenas, veículo de fuga de uma realidade aziaga e má. Em mãos peritas tende a se transformar na concretização de sonhos e de ideais que de outra forma seriam irrealizáveis. O talento do artista é varinha mágica que transforma os cenários, atos e pessoas mais horrendos em protótipos de beleza, de grandeza e de transcendência.

Um compositor talentoso, tendo por matéria-prima dissonâncias que ferem e machucam o ouvido, é capaz de elaborar, apenas com estrondos, gemidos, urros e estridências, melodias harmoniosas e suaves, que nos embalam o espírito e fazem nossa alma dançar.

Pintores hábeis reproduzem em suas telas – apenas com pincéis e tintas, às quais misturam com perícia para dar-lhes todos os tons da natureza – não só o concreto e belo, mas o mundo ideal que trazem em seus corações e mentes.

Escultores, tal como Deus modelando o primitivo Adão, fazem da pedra rústica e suja perfeições de formas e de movimentos, de maneira que só eles sabem fazer, mediante a força, a perícia e a grandeza do seu talento.

Escritores expressam a beleza, a magia, o poder e a transcendência dos magnos ideais que movem o homem tendo por ferramentas, apenas, a ambigüidade, a indigência e a fragilidade das palavras, que manipulam com a perícia de um tecelão a tecer seus panos.

Vocês já imaginaram um mundo sem artes? Já pensaram como seria tão mais sombrio, horrendo, violento, injusto, sem graça e sem esperanças de que mudasse para melhor? A fria realidade se tornaria superlativa, ou seja, gélida.

Não teríamos como expressar nossos mais acalentados sonhos e magníficos ideais. Seríamos uma fera a mais em um mundo povoado apenas por feras, na mera e selvagem luta pela sobrevivência, sem que esta, todavia, tivesse o menor sentido ou graça.

Não sei o que você pensa a esse propósito, estimado leitor e esteja certo que, mesmo que não concorde com seu pensamento, respeitá-lo-ei às últimas conseqüências. Da minha parte, porém, não saberia viver sem arte. E não viveria. Abriria mão, liminarmente, desta fascinante e simultaneamente perigosa aventura que sei quando e como começou, mas não tenho a menor noção de quando e como irá terminar.

Para mim a arte, qualquer arte, é tão fundamental como o ar que respiro, o alimento que me mantém, a veste que me aquece ou o abrigo que me acolhe. Este sempre foi meu credo desde que tomei consciência de mim, do que me rodeia e dessa incompreensível e misteriosa imensidão que é o universo.

Mesmo correndo o risco de ser mal interpretado e tido como piegas ou alienado, não tenho vergonha e nem receio de declarar, aos quatro ventos, peito estufado e plenamente convicto do que digo: creio na beleza, na grandeza e na transcendência do homem!!! E expresso essa minha crença, apenas, através da arte, que é meu DNA, minha vez e minha voz!

*Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos & Narciso” (crônicas), com lançamentos previstos para os próximos dois meses. Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com

3 comentários:

  1. Apoiado. Sem arte, resta-nos o suicídio, mas com asas escapo desse fim vertical, pois minha vertigem é, tem sido, para o alto.

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  2. Núbia


    Um dos meus maiores sonhos de consumo é estar mais perto de tudo que tem relação com arte. Poesias, obras de artes...amo as cores que saltam das telas. Sei que é pão que sustenta o corpo, que Deus alivia o espírito...mas são as cores e o som da poesia que alimenta a minha alma.
    beijos

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  3. Estou convicta de que você pouco se importa de esse ou aquele achar que você é piegas. Não mesmo. Senão deixaria de expor aqui muitas das suas opiniões.

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