Genuína fidelidade
Caros leitores, boa tarde.
A fidelidade é uma das mais nobres
virtudes, que se torna (infelizmente) cada vez mais rara nos dias que correm.
Somente sendo fiéis – às pessoas, aos princípios, às causas que nos empolguem,
aos nobres ideais e aos valores que cultivarmos e, sobretudo, a nós mesmos –
nos tornamos plenamente confiáveis. Apenas agindo dessa forma teremos o direito
de exigir reciprocidade dos outros. Ou seja, que os que nos rodeiam e que
convivem conosco ajam da mesma forma.
A fidelidade essencial, contudo, que
devemos levar às últimas conseqüências, é para com quem amamos. É em relação a
quem nos dedique (e por quem venhamos a nutrir) amizade. É para quem confie no
nosso talento e na nossa capacidade produtiva e nos prestigie quando o mundo
todo nos vira as costas e se volta contra nós. Há pessoas assim? Não sei!
Respondam vocês. Eu, da minha parte, creio que haja.
A vida é constituída de escolhas, cuja
exatidão vai determinar nosso sucesso ou fracasso, felicidade ou amargura, bem
ou mal. Escolhemos profissões, companhias, amizades etc. e até clubes de
futebol para torcer. Somos sempre instados a escolher alguém ou alguma coisa, e
não nos é permitido errar. Essas escolhas têm que ser estudadas, ponderadas e,
sobretudo, cautelosas.
Se escolhermos certo, é sábio e
prudente nos mantermos fiéis a essas escolhas. Caso contrário... Temos que
descartar o que foi escolhido equivocadamente (amor, amizade, causa etc.). Isso
não caracteriza infidelidade, mas reciclagem. Persistir no erro é que é grande
burrice. É saudável, necessário e indispensável fazermos revisões periódicas de
nossas crenças, amizades, preferências etc. – para testar sua veracidade e
intensidade – e analisar o conjunto de valores que norteiam e direcionam nossa
vida.
Trata-se de atitude sábia, que só nos
traz benefícios ao impedir que incorramos (ou permaneçamos) em erro. Aquilo em que
acreditamos é o roteiro pelo qual pautamos pensamentos, sentimentos e atos. Na
vida impera a lei natural da causa e conseqüência. Tudo o que fizermos, de bom
ou de ruim, nos trará resultados de idêntica natureza. Não podemos nos manter
fiéis ao que nos prejudique, desvalorize ou que, até, mesmo que apenas
potencialmente, possa nos matar.
Precisamos uns dos outros, é fato.
Ninguém é auto-suficiente, o que é para lá de óbvio. O cronista Mário da Silva Brito escreveu, em
uma crônica de 1961, publicada no Suplemento Literário do jornal "O Estado
de São Paulo": "Nunca fui eu só, ou só eu. Mas todos os outros. Os
antepassados, os que me rodeiam, os que pertencem ao meu tempo. Os que amo e
até os desconhecidos. Estou feito de pedaços. Sou uma soma de múltiplas parcelas
humanas. Consigo somar até quantidades heterogêneas".
Todos somos assim. Nosso próximo tende
a nos enriquecer (ou depreciar), a ampliar (ou estreitar) nossos horizontes e a
estimular (ou deprimir) em nós o espírito de competição, sem o qual, desde que
sadio, ninguém se sente motivado para qualquer realização (mesmo quando se opõe
a nós). Mas pode, como ressaltei, igualmente, nos corromper, desvalorizar,
diminuir e até nos matar.
As verdadeiras amizades, que duram para
sempre e crescem, mais e mais, à medida que o tempo passa, são livres,
espontâneas, sem regras nem obrigações. Não impõem deveres nem cobranças de
parte a parte. Não restringem idéias e comportamentos e dispensam censuras,
elogios ou reprimendas.
Existem, belas, simples, livres e
soltas, como fenômenos naturais e inexplicáveis. Sequer requerem explicações.
Desenvolvem, mutuamente, espontânea gratidão, que nem mesmo exige declaração.
Os amigos lêem nos olhos uns dos outros esse sentimento, que os aproxima ainda
mais. O complicado é identificar tais amizades. É ter certeza que de fato
existem e apresentam essas características. Como saber? Nunca se sabe!
Albert Einstein escreveu em seu livro
“Como vejo o mundo”: "Centenas de vezes por dia lembro a mim mesmo que
minha vida interior e exterior depende dos labores de outros homens, vivos e
mortos, e que preciso esforçar-me para dar na mesma medida em que tenho
recebido e estou recebendo". É a essas pessoas que devemos fidelidade
irrestrita, desde que, claro, se mostrem merecedoras dela.
Minhas reflexões diárias, posto que
espontâneas e livres – e, portanto, descompromissadas – estas que partilho com
quem me é fiel e leal (ou que julgo que o seja), não passam disso: são frágil
tentativa da minha parte de retribuir, um pouco, o muito de carinho, atenção e incentivo
que recebo de todos vocês. Mesmo dos que se mantêm silenciosos e anônimos, como
imperceptíveis sombras, e cuja presença percebo, apenas, pelos rastros sutis e
inidentificáveis que deixam. Muito obrigado por sua fidelidade, que anseio,
fervorosamente, que seja genuína.
Boa Leitura
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Por burrice mantenho-me firme em convicções que vez por outra me questionam: declaro-me esquerdista, agnóstica, atleticana, que abomina preconceito, fã do amor, honestidade, acolhimento, compreensão, e que detesta omissão. Restante deixo para o divã, que frequento há mais de 15 anos.
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