Escritores centenários
* Por
Pedro J. Bondaczuk
Entre 31 de outubro e 3 de novembro de
2009 morreram dois escritores consagrados, com obras consolidadas, louvados e
homenageados, com toda a justiça, mundo afora, pela força do seu talento e
magia do seu texto.
O primeiro falecimento foi do
antropólogo, etnólogo e filósofo belga Claude Lévi-Strauss, cuja relevância
sequer é necessário destacar, que teve fortes vínculos com o Brasil, onde morou
por bom período, tendo lecionado na Universidade de São Paulo.
O outro escritor que nos deixou foi o
espanhol Francisco Ayala, falecido em 3 de novembro de 2009, nem tanto
conhecido entre nós, mas reverenciado não somente na Espanha, sua terra natal,
mas também na Argentina, onde se exilou no início da Guerra Civil espanhola
(1936-1939) e lá permaneceu até 1950.
Uma característica especial liga essas
duas mortes. Ambos morreram com mais de cem anos de idade. Lévi-Stauss iria
completar 101 anos no dia 28 de novembro de 2009. Ayala faria 104 em janeiro de
2010. Os dois, portanto, já deram ao mundo o que tinham para dar e colhiam,
agora, o justo fruto do seu talento e trabalho (diria genialidade). Ambos
entram para o panteão dos “imortais”.
Uma pergunta, porém, se impõe: quantos
anos um escritor precisa viver para produzir uma obra consistente, valiosa e
consolidá-la? Não há limites. Um sujeito pode viver pouco e ainda assim
produzir muito, e bem.
Exemplos? Há inúmeros por aí. Mas
aceito o desafio e aponto alguns. Um deles foi Guy de Maupassant, um dos
maiores escritores de todos os tempos, que morreu com apenas 43 anos de idade.
Quanto poderia produzir a mais se vivesse, digamos, pelo menos até os 65?
Talvez muito, talvez nada.
Querem outro exemplo? O de Charles
Baudelaire. É impossível contestar a qualidade da sua obra. Escreveu muito e
bem. Viveu, no entanto, apenas 46 anos, deixando-nos a impressão de que, se
vivesse mais, sua produção seria multiplicada e proporcional aos anos a mais
que vivesse. Alguém, contudo, tem certeza que isso aconteceria? Claro que não!
Mais um? Honoré de Balzac. .Só a sua “A
comédia humana” reúne 88 obras em que mostra profundo senso de observação e
arguto conhecimento da natureza deste estranho animal que somos nós. Uma
produção dessas exigiu pelo menos 60 anos, pensarão os desavisados. Engano.
Balzac morreu com apenas 51 anos de idade.
Por falar em precocidade produtiva e
pouquíssimo tempo de vida, o que dizer, por exemplo, de um Álvares de Azevedo,
que morreu antes de completar 21 anos? No entanto, nos encanta, homens e
mulheres de pedra do século XXI, com a magia dos seus versos, em que compensa a
falta de experiência e de maturidade, que só se obtém com muitos anos de vida,
com uma sensibilidade raríssima até mesmo em poetas. O que
aconteceria se vivesse, digamos, até os 65 anos? Talvez muito, talvez nada.
Jamais iremos saber.
O mesmo se pode dizer de Antonio Castro
Alves. O genial poeta baiano legou-nos uma obra rica e consistente. Foi,
sobretudo, emérito abolicionista colocando, portanto, seu talento a serviço de
nobilíssima causa. Todavia, a exemplo de Álvares de Azevedo, viveu pouco,
pouquíssimo. Morreu com 24 anos de idade. Repito a mesma pergunta que fiz em
relação aos exemplos anteriores: o que aconteceria se vivesse pelo menos até os
65 anos? E dou, óbvio, igual resposta: talvez muito, talvez nada.
Francisco Ayala aproveitou bem os
muitos anos que viveu. Legou à posteridade uma obra vasta, consistente e de
alta qualidade. Tanto que, ao morrer, era considerado um dos maiores
intelectuais da Espanha (para onde regressou em 1960, após uma passagem de dez
anos nos Estados Unidos tão logo deixou a Argentina) do século XX.
Conquistou, ao longo de vitoriosa
carreira, os principais prêmios literários do seu país, como o Cervantes e o
Príncipe das Astúrias. Chegou a ser cogitado para o Prêmio Nobel, embora nunca
tivesse a candidatura lançada para essa grande honraria literária.
Seus livros não são lá muito conhecidos
no Brasil, ao contrário do que ocorre em relação à Argentina e, logicamente, ao
seu país de origem. Destacam-se “El boxeador y um angel”, Historia de la
libertad”, “Muertes de perro”, “Historia de macacos”, “Gloriosos triunfos del
principe Arjuna” e “Cervantes y Quevedo”.
*
Jornalista, radialista e escritor. Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas
(atual Bandeirantes Campinas), em 1981 e 1982. Foi editor do Diário do Povo e
do Correio Popular onde, entre outras funções, foi crítico de arte. Em equipe,
ganhou o Prêmio Esso de 1997, no Correio Popular. Autor dos livros “Por uma
nova utopia” (ensaios políticos) e “Quadros de Natal” (contos), além de “Lance
Fatal” (contos), “Cronos & Narciso” (crônicas), “Antologia” – maio de 1991
a maio de 1996. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 49 (edição
comemorativa do 40º aniversário), página 74 e “Antologia” – maio de 1996 a maio
de 2001. Publicações da Academia Campinense de Letras nº 53, página 54. Blog “O
Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com. Twitter:@bondaczuk
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