domingo, 7 de fevereiro de 2016

De televisão e baratos afins


* Por Ruth Barros



Em todos esses anos de prática jornalística, palpites na vida alheia, conselhos, colunas e tudo que vê e ouve, Anabel nunca conseguiu entender o senso comum, ou melhor, nem tão comum assim repúdio a televisão. Essa ojeriza vem principalmente dos que “se acham”, aquela categoria “si/si”, o “tá se achando”, quem se julga mais inteligente e/ou bem informado do que a média dos seres humanos. A auto-denominada inteligentzia (burritzia?) brasileira trata a televisão como um bicho papão, causadora/propagadora de todos os males, deseducadora de crianças e adolescentes, incentivadora da falta de moral e desagregação dos costumes (até parece) e por aí vai.

Eu, pessoalmente, acho a televisão bem mais danosa pelo que está atrás da tela do que na frente. Creio que deseducar a juventude é apresentar como exemplo de vida e sucesso mulheres cujo grande mérito na vida foi ser caso de homens famosos ou eventualmente – quando uma dessas zinhas dá muita sorte – até engravidar de um deles. Em um universo onde educação e esforço parecem ser supérfluos, pois todo mundo quer ser modelo ou atriz, encurtar caminho pela cama de sujeitos conhecidos é cada dia mais bem visto e aceito. Também não gosto de programas de mundo cão, nem de gente  a toa trancada em uma casa esperando por um trocado ou para mostrar o que Deus lhe deu e o silicone turbinou em poses ginecológicas. Mas devo confessar que acho tv uma coisa muito divertida.

É fácil e barato ficar na tv. Tenho uma amiga que costuma decretar “dia do pijama” com o filho pequeno, principalmente em dias muito frios. Funciona assim: ao invés de sair pela rua afora catando cinemas ou restaurantes lotados em fins de semana, quando ficam juntos, eles simplesmente combinam que não vão tirar o pijama nem para tomar banho, detalhe que passa despercebido durante o dia. Cada um fica em sua tv curtindo seus programas, dando risadas, gritando o outro para ver as partes mais bacanas e se encontrando na hora de colocar a comida para esquentar no micro-ondas. É uma enorme cumplicidade aquecida por cobertores. Mas para esse esquema dar certo é fundamental existir cabo no lar. Passar o domingo na base de Faustão e Silvio Santos, devo confessar, é dose.

Durante a semana é mais fácil. Anabel, por exemplo, fã contumaz da Fátima Bernardes, adora o Jornal Nacional – gosto das roupas e da graça séria dela, além de achar o jornal bem feito, jornal de TV, que tem imagem, coisa que vários concorrentes nem tão concorrentes assim não descobriram mesmo depois de todos esses anos. Adoro, e simplesmente adoro, os seriados inteligentes e engraçados dos canais americanos, onde as mulheres são reais, têm rugas, moram com amigos gays, caçam sexo pela noite adentro ou fazem qualquer outra atividade humana que não seja acordar completamente maquiada como nas novelas brasileiras. E os caras se sustentam como atores ou apresentadores até a maturidade, ao contrário dos colegas VJs da MTV, que depois que crescem vão ancorar programas duvidosos em redes de baixa audiência.

Anabel Serranegra sonha com seu próprio programa de TV

* Maria Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas, enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.



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