Família, hein?
* Por
Francisco Simões
Já ouvi diversos
relatos de atitudes tomadas por familiares de pessoas idosas que eu considero
desumanas. Conheço uns poucos casos e um deles bem recente que chegou ao meu
conhecimento há alguns dias e eu vou contar aqui. Não darei os nomes reais
porque não vem ao caso, mas afirmo que é verdade.
A referida senhora
sobre quem falarei mora no Rio e fizemos amizade com ela há alguns anos.
Soubemos depois que ela mora só e a única companhia que ela tem durante parte
de alguns dias é de uma amiga mais nova que ela e que a ajuda nos afazeres de
casa e outros.
Outro dia nós ligamos
num domingo para a casa daquela senhora, mas só dava ocupado. Deixamos para
voltar a telefonar no dia seguinte e o fato se repetiu diversas vezes, ou seja,
só dava sinal de ocupado. Deduzimos que algo estranho se passava.
Antes, naquele mesmo
dia, eu pedi ao amigo zelador do prédio em que tenho apartamento no Rio, em
Ipanema, para que fosse até a casa dela se informar sobre o que se passava.
Assim ele o fez na hora de almoço. Ao retornar a casa ele me telefonou pondo-me
a par do que o zelador do prédio daquela senhora lhe informara.
O relato do amigo nos
assustou. Disse ele: “Sr. Simões parece que a tal senhora está muito mal e foi
internada numa clínica. Não sabem quando ela deve voltar para casa e nem se
voltará”. Tomamos um susto e lamentamos muito. Nosso zelador, entretanto nos
passou dois números de telefones celulares que seriam da outra senhora, bem
mais nova e que costumava visitar a amiga e a ajudava naquele e em outros
serviços.
À noite ao ligar para
um dos dois celulares que nos haviam sido fornecidos, como ninguém atendesse,
deixei entrar a secretária eletrônica do outro telefone e decidi deixar uma
mensagem me identificando e pedindo que quem ouvisse aquilo me desse retorno
logo que pudesse.
A senhora nossa amiga
está com pouco mais de 80 anos. Pelo que descobrimos parece que ninguém da
família a visitava o que é muito triste, mas infelizmente vem se tornando comum
hoje em dia. Esquecem de que o tempo é implacável e que a vida nos leva a
todos, ou quase todos, para a tal terceira idade.
Na manhã seguinte
quando eu ainda tomava meu desjejum o telefone tocou. Minha idéia de deixar
mensagem na secretária eletrônica do celular que me fora fornecido funcionou.
Era a amiga daquela senhora que me retornava a ligação sem saber com quem
falava. Quando me identifiquei ela logo se lembrou de que já me atendera antes.
Perguntei a ela o que
realmente se passava com a outra senhora, a idosa, nossa amiga e dela também.
Esta desmentiu a versão da doença grave e da internação em clínica. Afirmou
para mim que como a tal senhora, em sua solidão, costumava sentir-se mal, o que
já dissera a nós também, deve ter comentado isto com gente da própria família.
Apenas uma suposição, mas que tinha coerência.
A seguir ela me
garantiu que pessoa da família daquela senhora a internara num Asilo de velhos,
certamente com a “ajuda” de algum profissional que teria fornecido laudo para
justificar tal atitude. Também uma suposição, todavia que levava a um
raciocínio correto. Para mim uma maldade como tantas eu já presenciei nesta
minha longa vida. Se por um lado me assusta, por outro confio nos meus
familiares.
A amiga da senhora
idosa assumiu o trabalho que a outra fazia e me falou que a visitou no Asilo.
Encontrou-a deprimida, chorando talvez seguindo mais rápido para um triste fim
de vida. Se cães abandonados, recolhidos em locais que cuidam deles, mexem
muito com meus sentimentos, imaginem como me sinto quando tomo conhecimento de
seres humanos como que “jogados ao lixo” porque envelheceram.
Felizes dos que têm
familiares que convivem muito bem com seus membros de mais idade e sabem
reconhecer o que estes já fizeram por seus filhos e netos, entre outros
familiares, e são agradecidos e generosos com aqueles que a vida ainda preserva
mesmo em idades bem avançadas. Isto me arremete a uma palestra do Padre Fábio
de Melo que tenho guardada em vídeo. Já a divulguei certa vez na internet.
Ele fala de uma
maneira geral na “doce inutilidade da velhice”. Gosto muito desta expressão que
ele usa. Cito isto porque tem tudo a ver com o assunto que abordo neste texto,
com a história verdadeira que narro. Mais ao final Fábio de Melo diz: “Peço
sempre a Deus que me mantenha quando velhinho junto com pessoas que me amem.”
“Se você quiser saber
se o outro te ama de verdade é só saber se ele (ou ela) seria capaz de tolerar
a sua inutilidade.” E ele termina com estas palavras: “Só o amor nos dá
condições de tolerar o outro até o fim. Feliz daquele que tem ao fim da vida a
graça de olhar nos olhos e ouvir a fala que diz – você não serve pra nada, mas
eu não sei viver sem você.”
Eu fico imaginando
como estarão os sentimentos daquela senhora, isolada do mundo exterior num
Asilo tendo por companhia pessoas estranhas e que no comum somente a idade de
todas as identifica e talvez as una ainda mais agora que se avizinha o Natal. É
muito triste, gente amiga, muito triste mesmo.
Encerro deixando aqui
o link que os levará ao vídeo do Pe. Fabio de Melo, apenas 5 minutos, de uma
palestra das melhores que já ouvi dele. Entrem por:
http://www.youtube.com/watch?v=NNBdJ7crU2M
(15/dezembro/2015)
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