sexta-feira, 12 de fevereiro de 2016

Cumplicidade



* Por Rodrigo Ramazini


- Pára Moisés!
- O que eu estou fazendo?
- Tira esse dedo do nariz! Tu não estás vendo que estão filmando a cerimônia?
- Estava coçando...
- Coça discretamente.
- Será até engraçado eu aparecer na fita do casamento coçando o nariz em plena igreja... Ah ah ah!

- Que lindo!
- Com o passar dos anos tu perdeste o bom humor, hein Jordana?
- Também! Para te aturar, só assim...
- Sempre achei que o melhor seria o contrário! Mas enfim, o que eu faço?
- Presta atenção no cerimonial, pois tu serás o próximo...
- Eu? A Karina Bachi aceitou o meu convite então?
- Abobado!
- Só se for com ela...

- Eu sinceramente não sei o que o tempo fez contigo. Antes queria casar, ter filhos e Etc.
- Isso se chama lucidez! Aquisição de sabedoria...
- Cachorrice trocou de nome agora?
- Pronto! Vai começar...
- E saber que eu um dia te vi como príncipe encantado... Onde eu estava com a cabeça!
- Paixão é o nome disso!
- Ainda bem que a gente se recupera deste estado!
- Pois é...

- Se arrependimento matasse!
- Isso! Vai ignorando...
- Não estou ignorando. Estou apenas falando a verdade...
- Então tá.
- Que foi? Por que essa cara?
- Nada não.
- Fala logo Moisés! Não te faz de vítima...
- Se não queres mais, Jordana? Tem quem queira...
- Ah é?
- Arãn! Várias...
- Tu estás louco que eu te dê um pé na bunda para ficar soltinho no mundo de novo, né? Fervendo com essas piranhas que andam por aí...
- Exatamente!
- Mas não vai escapar, meu filho! Me enrolou todos esses anos, agora vai ter que casar.

Neste momento termina a cerimônia de casamento. Em um “teatro” muito bem ensaiado, os pais da Jordana se aproximam e diretamente tocam no assunto.
- Filha! Me emocionei com esse casamento. Fiquei imaginado eu e a minha garotinha, de véu e grinalda, adentrando na igreja...
- Pois é, pai! Eu e o Moisés estávamos falando justamente sobre isso... Sobre o nosso casamento... Não é Moisés?
- É...
- Já tem uma idéia de data, Moisés?
- Pois é, Seu Paulo...

Moisés joga o braço direito sobre os ombros do sogro, e leva-o para um canto da igreja, afastando-se das mulheres, onde, cochicha.
 - Seu Paulo! Vamos jogar limpo um com o outro. Se hoje o senhor voltasse a ter a minha idade, se casaria novamente?
- Bah! Boa pergunta, meu filho! Boa pergunta... Mas no nosso caso é da minha filha que estamos falando.
- Eu sei... Mas pegue essa situação e acrescente o fato de ter uma amante com grana, que paga várias das tuas despesas, te proporcionando uma série de confortos, e que a única exigência que ela te faz é não se casar... Questão de consciência feminina... Vai entender a cabeça das mulheres...
 - Uma amante? O que isso, rapaz?
- Oh Seu Paulo, moralismo pra cima de mim? De amante eu sei que o senhor entende...
- Opa... Opa...
- Pois é... Agora me diz: no meu lugar, o que o senhor faria?
- Ãh... Ãh... É! Me convenceu... Entre nós: mais um ano eu consigo adiar esse casamento, mas tome jeito, rapaz!
- Pode deixar, Seu Paulo! Pode deixar...
- Vamos voltar para lá agora, se não elas vão desconfiar...

* Jornalista e contista gaúcho

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