quinta-feira, 31 de dezembro de 2015

Ra-tim-bum

* Por Marcelo Sguassábia


- Não acredito que você me acordou uma hora dessas pra falar sobre "Parabéns a você"...
- Pois você vai me dar os parabéns depois que ouvir minha ideia. Ah, se vai!
- Ih, lá vem.
- Aqui no Brasil, o "Parabéns a você" tem registro no ECAD e dizem que é a segunda música mais executada no país. Sabe lá o que é isso, cara? A original é obra de duas irmãs americanas e a versão brasileira foi escolhida por concurso, em 1942. A vencedora foi uma mulher de Pindamonhangaba, Bertha Celeste Homem de Mello. Ela morreu em 1999 e apagou a velinha 97 vezes, quase todas ao som da própria música! Hoje, os direitos autorais estão nas mãos dos herdeiros. Mas o que me interessa mesmo é a segunda parte, aquela que diz assim:
"E pro(a) (nome da pessoa), nada?
Tudo!
Então como é que é? É!
É pique, é pique, é pique é pique, é pique,
É hora, é hora, é hora é hora é hora
Ra-tim-bum (nome da pessoa, nome da pessoa, nome da pessoa)"
- Nossa, que interessante. Eu não acredito que eu estou escutando essa merda toda às duas da manhã.
- Me escuta, caramba, me escuta. Quase me matei de pesquisar na internet, nos registros de direitos autorais e em tudo quanto é lugar pra descobrir quem cometeu essa baboseira do "pique pique". As origens são as mais absurdas possíveis. Misturam onomatopoéias de bandinha de circo, os estudantes de Direito do Largo de São Francisco e até um rajá indiano que teria visitado a faculdade em mil novecentos e bolinha. Já outras fontes afirmam que o termo "Ra-Tim-Bum" é uma maldição. Imagina só. Numa dessa, todo mundo na festa roga praga no aniversariante...
- Ok, amanhã você continua, tá bom?
- Resumindo, o fato é que essa parte do "Parabéns" não tem dono. Minha ideia é fazer o registro desse complemento e requerer os royalties de execução, radiodifusão e teledifusão, compreende?
- Só dessa segunda parte?
- Sim, a primeira é dos herdeiros da Dona Bertha.
- Dona Bertha? Que dona Bertha?
- Aquela, que eu acabei de falar, a velhinha de Pindamonhangaba. Depois dessa parte que eu quero registrar vem o manjado "Com quem será?" - que acabou se incorporando, sabe-se lá porque, ao maldito corinho natalício. Tentei descobrir o autor, pra propor uma ação conjunta de registro, mas não encontrei de jeito nenhum. Pesquisando, vi que a música desse "Com quem" dos infernos é baseada na Marcha Nupcial de Wagner. Pegaram a melodia de um gênio e enfiaram uma letra de retardado.
- E aquele trecho que parece coisa de beata velha, que fala "Com imensa alegria, suplicamos aos céus", quem foi que compôs?
- Sei lá, pelo jeito é uma segunda parte da letra que a Bertha fez, mas também não tenho certeza.
- Bom, posso voltar pra cama agora?
- Imagina a grana que dá pra ganhar só em buffet infantil. Esquece televisão e rádio, vamos focar só nas festinhas de criança. Eu espalho um exército de gente que está aí à toa, procurando emprego, e faço um acordo por comissionamento. Eles dão um jeito de entrar nas festas e, na hora de apagar as velinhas, gravam com celular a cantoria. Ninguém vai desconfiar de nada, porque quase todo mundo fica com o celular gravando nessa hora - a mais insuportavelmente previsível da comemoração. Com o flagrante na mão, é só mandar a cobrança dos direitos para os pais do fedelho. Tiro 10% de comissão para o fotógrafo e o resto vem limpo pra mim.
- Parabéns a você. Genial. Supimpa. Estonteante. Formidável. Bem.......bo....la.............do............................zzzzzzzzzzzz......................zzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzzz.......



* Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: WWW.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) e WWW.letraeme.blogspot.com (portfólio).




Um comentário:

  1. A segunda e terceira partes são acréscimos mais recentes. Não sei datando de quando, mas deve ter sido de 1990 para cá. Acaba que fiquei curiosa para saber qual é a primeira, a música mais cantada no país.

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