Atravessando a Abbey Road
* Por
Clóvis Campêlo
No dia 8 de agosto de
1969, os quatro beatles se encontraram na Abbey Road para fazerem as
fotografias mais famosas do mundo em todos os tempos. Uma delas, terminaria por
ser escolhida para a capa do disco que levou o nome da hoje famosa rua
londrina.
O autor das fotografias
foi o escocês Iain Macmillan, amigo de John Lennon e Yoko Ono, que precisou
apenas de dez minutos para clicá-las. A fotografia que findou ilustrando a capa
do disco, a quinta da sequência, foi escolhida por Paul McCartney. Iain, o
fotógrafo, morreria em 8 de maio de 2006, aos 67 anos de idade, vitimado por um
câncer de pulmão.
Antes de chegar aos
Beatles, porém, Iain conheceu Yoko em 1966, sendo por ela convidado para
fotografar sua exposição no Indica Gallery. Através de Yoko Ono, chegou a John
Lennon, que o convidou para fazer as fotografias do álbum. Apesar de ser amigo
do fotógrafo e tê-lo indicado para fazer as fotografias, consta que Lennon
reclamava insistentemente da demora (apenas dez minutos) e queria ir para o
estúdio concluir a gravação, terminando logo “essas fotografias idiotas”.
Explica-se: a ideia das fotografias tinha partido de Paul McCartney e entre
eles, naquela época, havia uma “briga surda” pela liderança do grupo.
Consta, inclusive, que
o disco, gravado na época do LP, havia sido dividido de uma maneira que cada
lado contemplasse um dos músicos. Assim, o lado A, que ia de "Come
Together" a "I Want You", foi feito para agradar a Lennon. É uma
coleção de faixas individuais, enquanto que o lado B (para agradar a McCartney)
contém uma longa coletânea de curtas composições que seguem sem interrupção. A
sequência de juntar músicas inacabadas criadas por McCartney e Lennon em um
enorme pout-pourri foi ideia de Paul, constituindo-se numa espécie de ópera
dentro do disco. Lennon, porém, não gostava muito disso. Queria voltar ao velho
e bom rock'n'roll dos tempo de Hamburgo.
Segundo os entendidos
da música pop, porém, foi no álbum Abbey Road, o último gravado pelo grupo, que
George Harrison se firmou como um compositor de primeira linha. Após anos
vivendo sob a sombra de John Lennon e McCartney, ele finalmente emplacou dois
grandes sucessos com este álbum: "Here Comes the Sun" e
"Something". Ambas as canções foram regravadas incessantemente ao
longo dos anos, sendo que Something chegou a ser apontada pela revista Time
como "a melhor música do disco" e como a segunda música mais
interpretada no mundo, atrás somente de "Yesterday", também dos
Beatles.
Voltando a fotografia
da capa, porém, a fotografia escolhida conteria supostas "pistas" indicando
que Paul estava morto: Paul está descalço (segundo ele, aquele dia fazia muito
calor, e ele não estava aguentando ficar com nada nos pés), fora de passo com
os outros, está de olhos fechados, tem o cigarro na mão direita, apesar de ser
canhoto, e a placa do fusca, em inglês, "beetle", estacionado é
"LMW" referindo se as iniciais de "Linda McCartney Widow"
ou "Linda McCartney Viúva" e abaixo o "281F", supostamente
referindo-se ao fato de que McCartney teria 28 anos se (if em inglês) estivesse
vivo. Um contra-argumento é que Paul tinha somente 27 anos no momento da
publicação de Abbey Road, embora alguns interpretem isso como ele teria um dia
28 anos se ele estivesse vivo.) Os quatro Beatles na capa, segundo o mito do
"Paul está morto", representariam o Padre (John, cabelos compridos e
barba, vestido de branco), o responsável pelo funeral (Ringo, em um terno
preto), o Cadáver (Paul, em um terno, mas descalço - como um corpo em um
caixão), e o coveiro (George, em jeans e uma camisa de trabalho denim). Além
disso há um outro carro estacionado, de cor preta, de um modelo usado para
funerais e eles andam em direção a um cemitério próximo a Abbey Road. Notem
também que atrás do Paul tem um carro como se estivesse passado pelo mesmo
lugar que ele está. Outra suposta pista seria que na contra-capa do álbum, ao
lado esquerdo da palavra Beatles, haveria 8 pontos formando o número 3 (sendo
então "3 Beatles"). O homem de pé na calçada, à direita, é Paul Cole,
um turista dos EUA que só se deu conta que estava sendo fotografado quando viu
a capa do álbum meses depois.
Nunca, amigos,
beatlemaníacos ou não, uma fotografia foi tão badalada ou inserida de
interpretações como essa. Acredito que nem mesmo o velho Iain, teria tido a
intenção de provocar tanta celeuma ao clicar na sua máquina fotográfica. Mas,
com ela, o grupo inglês encerrava a sua revolucionária carreira na música pop.
Acho inacreditável
que, 46 anos depois, isso tudo ainda cause interesse e rebuliço. Ou serei eu
que não consigo enxergar nada mais além dos Beatles?
Recife, dezembro 2015
*
Poeta, jornalista e radialista.
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