Livros para colorir para adultos
O mercado editorial brasileiro mostrou algumas
peculiaridades, neste ano de 2015 que ora se encerra, caracterizado por uma
crise que ainda não se encerrou, uma delas, aliás, seguindo uma tendência que é
internacional. Uma dessas “novidades” (que considero preocupante para os
escritores, não importa se de ficção ou não ou de qual gênero), é a “explosão”
de vendas de livros para colorir, para adultos, considerados como excelente
terapia para desestressar os estressados (muitíssimos, convenhamos). Por mais
que tentem me convencer do contrário, não considero esse produto como “Literatura”,
embora admita que tenham lá algum valor, digamos, artístico. Para as editoras
(as que apostaram nesse tipo de obra, que foram várias), a procura popular foi
uma “festa”. E mais, foi o que se pode chamar de “salvação da lavoura”, numa
época de vacas magérrimas, em que todos os setores econômicos foram e estão
sendo afetados por grave crise, com severa retração de vendas.
Para que o leitor tenha uma idéia do que essa preferência
(para mim, outro dos tantos modismos que volta e meia aparecem e logo declinam
e somem) representa, informo que, apenas nos seis primeiros meses do ano, os
tais livros para colorir para adultos já haviam gerado faturamento da
considerável cifra de R$ 25 milhões!!! Nada mau para as editoras, não é mesmo? Não
tenho os números finais e definitivos do ano, até porque ele ainda não acabou.
Todavia estimo, com base em pesquisas informais que fiz, que as vendas, no mínimo, na pior das hipóteses, tendem a
fechar 2015 no dobro das cifras registradas em junho. A probabilidade, porém, é
que sejam bem maiores, considerando-se as épocas em que as pessoas mais
presenteiam amigos e entes queridos (como o Dia dos Pais e o Natal). Não me
surpreenderei, portanto, se tiverem ultrapassado os R$ 100 milhões, se não mais.
Para o leitor ter uma idéia da “temperatura” a que chegou
esta “febre”, basta citar que os dois best-sellers de 2015, em todas as
relações dos mais vendidos no período, foram justamente dois livros para colorir
para adultos: “Jardim secreto” e “Jardim encantado”, ambos da ilustradora
escocesa Johanna Basford, publicados, um e outro, pela Sextante. Se foram
absoluto (e surpreendente) êxito comercial (e não somente para essa editora,
mas para todas que investiram no produto), considero (e tenho certeza de que
serei contestado) o fato como mega fracasso literário. As opiniões das pessoas
envolvidas com Literatura variam a propósito (afinal, como diz o surrado
clichê, “em cada cabeça há uma sentença”). Para uns, é um fenômeno passageiro
e, até certo ponto, positivo, dado o caráter dessas obras, principalmente pelo
seu papel anti-estressante e interativo. Poderia ser encarado, portanto, como
uma “terapia” de baixo custo. Para outros, no entanto (entre os quais me
incluo), trata-se de ostensivo sintoma de infantilização do mundo atual (e
particularmente do Brasil). Ou não?!!
Essa explosão de vendas, admito, pode até ter muitos outros
aspectos positivos, do ponto de vista exclusivamente econômico. Afinal,
movimentou outras indústrias, como a de lápis de cor, por exemplo, além de
gráficas, ilustradores, editores etc. Isso, convenhamos, é benéfico. Gera
empregos e renda. Sobretudo em época de retração econômica, de recessão (para
muitos, de depressão) como esta que encaramos. Mas que não classifiquem esses
livros para colorir para adultos como Literatura. Não são!!! Não têm nada a ver
com essa fascinante, mas tão frustrante, atividade intelectual. Cauê Muraro observou,
em matéria que publicou em 23 de junho de 2015 no portal G1, intitulada “Livros
para colorir: entenda o fenômeno em 10 cifras impressionantes”, que “’todo ano
tem algo assim’, afirma Cassia Carrenho, gerente-geral do PublishNews, portal
que analisa o mercado. Dois exemplos de ondas anteriores: livros eróticos, como
‘Cinquenta tons de cinza’, e os religiosos. ‘O mercado editorial não lança
moda, ele só segue a moda. Uma tendência em todas as áreas, não é só no
editorial, de voltar um pouco às raízes, o 'handmade’, continua Cassia”.
E Muraro prossegue, em sua matéria: “Outra facilidade óbvia
para trazer sucessos internacionais de colorir ao Brasil: eles não precisam ser
traduzidos. Além disso, é comum que o ‘leitor’, depois de concluir a pintura,
compre uma segunda obra. E eventualmente uma terceira, uma quarta... As
próximas tendências do setor devem ser livros para colorir de nicho, temáticos.
A nova leva terá títulos sobre gatos e bichos em geral, além de clássicos para
colorir (tipo ‘O pequeno príncipe’) e uma série sobre ‘cidades do mundo'”. Eu
não veria mal algum nesse “modismo” caso ele não afetasse a venda de livros,
digamos, autênticos, de textos, destes em que os autores superam o maior
desafio que todo bom escritor gosta de encarar: o de “fazer pensar os que podem”,
como observou há mais de cem anos o pintor francês Eugene Delacroix. Todavia...
afeta. Será que esses livros para colorir para adultos induzem pessoas à
meditação? Caso induzam, não são de todo maus. Mas... tenho lá minhas sérias (e
bem fundamentadas) dúvidas. Enfim... cada um gasta seu dinheiro como e no que
quer, não é mesmo?
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Li críticas severas ao efeito terapêutico desses livros. Não vi e não gostei.
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