Saber envelhecer
* Por
Frei Betto
Perder o emprego ou
deixar de trabalhar por haver atingido a idade limite é sempre motivo de
preocupação. Em geral, as pessoas saudáveis não estão preparadas para ficar em
casa de pijama, assistindo à TV ou interagindo com a internet, o resto da vida.
A velhice se tornou
uma questão social. A natalidade se reduz em todo o mundo e, em muitos países,
o número de idosos tende a superar o dos que se encontram em idade
economicamente ativa. Os gastos com a previdência social pesam cada vez mais no
orçamento das nações. Há países, como a Alemanha, que correm o risco de, em
breve, terem uma população com mais estrangeiros do que nativos.
Quem mais teme a
velhice são os políticos. Vide a rainha Elizabeth II, do Reino Unido. No último
dia 9, superou a rainha Vitória em longevidade no poder. Sua tataravó imperou
durante 63 anos e 216 dias (1837-1901). Elizabeth II, coroada aos 25 anos, em
junho de 1953, não demonstra o menor indício de abdicar em favor de seu filho,
o príncipe Charles.
Conheci um político
que, ao atingir a idade compulsória, caiu em depressão. Como havia perdido sua
função de poder, na qual hipotecara sua baixa autoestima, perdeu também o
prestígio e a motivação de viver. Enquanto no poder, todos o procuravam e
assediavam. Uma vez afastado, poucos se interessavam por ele, exceto familiares
e uns tantos amigos. Ficava feliz quando um deles o convidava para jantar e,
paciente, dava ouvidos às suas recordações dos tempos em que não precisava
abrir a carteira para pagar a conta em restaurantes.
O poder atrai como o
açúcar às formigas. Aquele que o ocupa se sente obrigado a ser cuidadosamente
seletivo quanto às suas amizades. Como uma espada de Dâmocles, paira sempre a
indagação: meu amigo ou mero interesseiro? A maioria se enquadra na segunda
hipótese. Uma vez destituída do poder, a pessoa é qual uma vela que se apaga.
Não há mais luz. Já não atrai as mariposas. Queda na obscuridade. E surge a
depressão.
Aconselho àqueles que
estão prestes a se aposentar: cultivem algum hobby, como colecionar selos,
cuidar de abelhas, abraçar um trabalho voluntário... Algo que lhes seja muito
interessante, a ponto de ansiar pela aposentadoria para se dedicar a ele.
Assim, quando chegar o momento de se ver desempregado, o descartado não se
sentirá preterido. Ao contrário, ficará liberado para, então, entregar-se apaixonadamente à sua motivação
mais profunda.
Meu pai se aposentou
precocemente, por força da ditadura militar. Como gostava imensamente de ler e
escrever, ocupou-se com a literatura até transvivenciar aos 89 anos. A mesma
motivação, centrada na literatura gastronômica, manteve minha mãe ativa até os
93. A velhice não lhes pesou.
Aliás, a vocação
artística é uma bênção divina. O artista está sempre entretido em criar mais e
mais. Nunca se deixa tragar pela velhice. Não perde o ânimo pela vida. Pelo
contrário, se queixa de que a vida é breve e ele dispõe de pouco tempo para os
tantos projetos que lhe passam pela cabeça.
A vida é como andar de
bicicleta. Se parar, cai. Bem dizia Voltaire: "Quanto mais envelhecemos, mais
precisamos ter o que fazer. Mais vale morrer do que se arrastar na ociosidade
de uma velhice insípida: trabalhar é viver".
* Frei Betto é escritor, autor de “O
que a vida me ensinou” (Saraiva), entre outros livros.
Muito bom o escrito; "Se parar, cai"!!!
ResponderExcluir