Sabemos
que nada sabemos
* Por Pedro J. Bondaczuk
Engraçado como somos arrogantes
em relação ao nosso pretenso conhecimento. Julgamos, apenas porque lemos um
punhado de livros, obtivemos três ou quatro diplomas universitários, observamos
de passagem algum fenômeno, que sabemos muita coisa. Há os que vão mais longe e
julgam saber de “tudo”, o que já é, convenhamos, o superlativo do exagero
(quando não da ignorância).
Nosso conhecimento, todavia, não
somente é parcial, truncado e, portanto, incompleto, como, sobretudo, é
superficial. Não conseguimos nos aprofundar em coisa nenhuma. E muito menos
saber tudo a respeito de algum único e reles assunto. Por mais que tenhamos
aprendido, em relação a ele, sempre teremos, ainda, 99% ou mais a aprender a
respeito.
Nós, jornalistas, por exemplo,
costumamos afirmar, até em tom de brincadeira (mas que, no fundo, no fundo é a
lídima expressão da verdade) que somos “especializados em generalidades”. Ou
seja, sabemos um pouco de tudo (por força da nossa profissão), mas não sabemos
tudo de nada. Aliás, ninguém sabe.
Tomemos, por exemplo, um fato
qualquer que precisemos noticiar. Digamos, um assassinato. Caso o autor seja
conhecido, coletamos uma série de dados sobre ele. Em três tempos, ficamos
sabendo quem ele é, onde mora, com quem vive, qual seu círculo de amizades,
quais são seus inimigos e às vezes até o que comeu no jantar. Com tantos
detalhes, acreditamos conhecer “tudo” a seu respeito. Bobagem, claro.
Desconhecemos, por exemplo, sua
intenção ao praticar o crime, ou seja, se pretendia, de fato, matar a vítima ou
apenas dar-lhe um susto, ou um “corretivo”. Teremos que nos fiar nas conclusões
da polícia ou na palavra do próprio assassino. E este pode estar dizendo a
verdade ou arranjando pretextos para se defender. Qual das versões é a mais
confiável? É impossível de se saber com exatidão.
Outro detalhe, que é também
subjetivo, refere-se ao motivo. Podemos nos fiar no que foi suposto pela
autoridade policial ou no exposto pelo autor do delito. E de novo vem a dúvida:
quem fala a verdade? Pode ser que sejam os dois. Pode ser um deles. Neste caso,
qual? E há, ainda, a possibilidade de nenhum deles expor a real motivação. Como
poderemos saber? Não podemos!
Em outros tipos de acontecimento
tendem a surgir novas incógnitas, além da intenção e do motivo do seu principal
agente (ou de um deles, quando for o caso) como a conseqüência do que
aconteceu, o significado etc. Convenhamos, sem saber desses dados (que não
temos como), não podemos afirmar que “sabemos” o que ocorreu, embora seja essa
a nossa impressão.
Ademais, raros são nossos
conhecimentos que prescindam de algum “fragmento” que nos escapou e que outro
conheça. Digamos que eu pretenda construir um acelerador de partículas. Posso
fazer sua planta, detalhar todas suas dimensões, discriminar todos os materiais
e equipamentos necessários, mas saberei “construí-lo”? Claro que não.
Para isso, serão necessários
diversos operários, cada qual com conhecimentos específicos, ou seja,
fragmentos do “saber” completo. Praticamente tudo na vida é assim. Uns sabem
fazer alguma coisa, outros outra, mas ninguém sabe “todas”.
O escritor norte-americano
Philip Roth (candidato recorrente ao Prêmio Nobel de Literatura e isso há já
alguns anos), refletiu a esse propósito e chegou à mesmíssima conclusão a que
cheguei. Escreveu, no livro “A mancha humana”: “É espantosa a quantidade de
coisas que não sabemos. E mais espantoso ainda é o que passa por saber”.
Quanta coisa que “presumimos” que conhecemos,
sem de fato conhecer! Não, pelo menos, na sua integralidade. Essa presunção é
imenso obstáculo para nos aproximarmos de um nem que arremedo de sabedoria.
Portanto, amigo, esqueça dos livros que leu, porquanto você pode não ter
absorvido nada, ou muito pouco, dessa leitura. Não se fie nos vários diplomas universitários
que conseguiu, porque é provável que 50% ou mais do que pensa ter aprendido já
caiu no esquecimento.
Até para que isso lhe sirva
como desafio, seja humilde e chegue à mesma conclusão que uma infinidade de
filósofos, cientistas, psicólogos etc. chegou, tão bem expressada nas palavras
de Philip Roth: “O que nós sabemos é que, de um modo que não tem nada de
lugar-comum, ninguém sabe coisa alguma”. Ou você sabe?
* Jornalista, radialista e escritor.
Trabalhou na Rádio Educadora de Campinas (atual Bandeirantes Campinas), em 1981
e 1982. Foi editor do Diário do Povo e do Correio Popular onde, entre outras
funções, foi crítico de arte. Em equipe, ganhou o Prêmio Esso de 1997, no
Correio Popular. Autor dos livros “Por uma nova utopia” (ensaios políticos) e
“Quadros de Natal” (contos), além de “Lance Fatal” (contos) e “Cronos &
Narciso” (crônicas). Blog “O Escrevinhador” – http://pedrobondaczuk.blogspot.com.
Twitter:@bondaczuk
Desconhecemos inteiramente a nosso ignorância.
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