As promessas
* Por Rodrigo Ramazzini
Foi
em meio a um churrasco regado a cerveja que surgiu a ideia. Era domingo e
iniciava às 16 horas o Campeonato Brasileiro de Futebol. Fazia muito anos que o
time do trio não vencia a competição. Porém, os três amigos acreditavam que
havia chegado a hora. Para isso, mesmo levando fé no time, não hesitaram em
pedir ajuda aos santos (ou nem tão santos assim).
-
O que vocês acham de nós três... Nós três aqui podíamos fazer umas promessas para
ajudar o time a ser campeão. O que acham? Esse ano a gente tem que ser campeão,
pô!
-
Bo-boa ideia.
-
Estou dentro! Mas, vamos fazer uma para nós três ou cada um faz a sua promessa,
hein?
-
Cada um faz a sua... Eu acho...
-
Po-pode ser!
-
Por mim... Tanto faz...
-
Mas, vamos combinar o seguinte: só revelaremos a promessa um para o outro no
final do campeonato se nós chegarmos a ser campeão... O que acham?
-
Fica tipo um segredo de cada um, hein?
-
Isso...
-
Po-pode ser! Já fiz a minha... Que que os santos nos ajude!
-
Também fiz a minha! Em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo. Amém!
-
Eu também! E vamos brindar! É campeão!
-
É-É campeão!
-
É campeão!
Após
a sessão de promessas, o churrasco e a cervejada seguiram recheados com muitas
análises do time e de jogadores, xingamentos ao treinador e palpites do placar
do jogo. O time dos três amigos iniciou a competição vencendo a partida, o que
só reforçou a fé no poder das promessas. Havia dado certo e o título era uma
questão de tempo. Os santos estavam conspirando a favor. E, realmente,
aconteceu. Trinta e oito rodadas depois o time do trio sagrou-se campeão e eles
fizeram muita festa. Passada a fase de comemorações era chegada a hora de pagar
as promessas. Novo churrasco foi marcado para que houvesse as revelações do
prometido no início do campeonato.
-
Somos campeões! Quem diria... Foram os santos! Nossas promessas foram fortes!
Nós que impulsionamos esse título...
-
É-É verdade!
-
Pois é...
-
Eu prometi que se fossemos campeões eu iria lavar o chão da igreja de Nossa Senhora
Aparecida por um mês e na próxima procissão iria de pé descalços... Vou pagar! Tudo
pelo nosso time!
-A-a
pretinha é forte... E-essa não falha! E-eu prometi que vou à próxima romaria de
Nossa Senhora do Caravaggio e vou acender 38 velas. U-uma para cada rodada do
campeonato!
Silêncio.
O terceiro amigo fez um suspense por alguns instantes e, então, iniciou a
revelação da sua promessa.
-
Minha promessa foi para São Jorge. Conhecem, hein?
-
Claro!
-
Cla-claro!
-
Santo poderoso...
-
É.
-
É-é!
-
E eu prometi... E eu prometi a ele que se o nosso time fosse campeão vocês dois
pagariam as prestações do meu carro por seis meses!
Silêncio.
Os amigos se olharam e caíram na gargalhada.
-
Há! Há! Há!
-
Há! Há! Há!
-
Há! Há! Há!
Silêncio
novamente por alguns instantes. O clima fica apreensivo.
-
Sério isso?
-
Sério.
-
E-eu não acredito!
-
Pode acreditar...
-
Por que fez isso com a gente?
-
Sei lá! Foi o que pensei na hora...
-
N- não podia ter feito isso. Minha mulher vai me matar! Eu não vou pagar...
-
Isso foi sacanagem!
-
Achei que pelo nosso time valia tudo!
Breve
silêncio.
-
São Jorge vai cobrar.
-
Eu não vou pagar!
-
Ne-nem eu!
-
Vocês querem ver o nosso time se afundar?
-
Por que está dizendo isso?
-
É-é por quê?
-
Porque quando fiz a promessa disse que, como penitência caso não fosse cumprida,
São Jorge poderia rebaixar o nosso time no ano seguinte...
-
Eu não acredito! Não! Não! Não!
-
Nã-não! Poxa...
-
Eu vou ti matar!
-
E-eu também!
-
Pois é...
-
Ficar devendo pra santo é brabo! Minha mulher vai me matar! Tu nos ferraste!
Isso vai ter volta!
-Va-vai
ter voltar, sim!
-Achei
que pelo nosso time valia tudo! Não imaginei que vocês ficariam tão brabos
assim!
-
Vai para a p#t@ que pariu!
As
esposas dos três amigos que ouviram a discussão próxima à churrasqueira
resolveram se aproximar. Foi então que, em meio aos lamentos dos dois pagadores
da promessa, a esposa do devoto de São Jorge chamou-o em um canto e sussurrou
baixinho.
- Amor! Tu prometeste isso mesmo?
-
Claro que não! Disse isso só para sacanear eles!
-
Ah bom! Que susto!
-
Deixa eles sofrerem até vencer a primeira prestação. Depois eu conto!
-
Como tu és mau!
-
Há! Há! Há!
-
Mas, me diz uma coisa...
-
Hum...
-
Eu sei que tu amas esse time. Alguma coisa tu prometeste... Tenho certeza. O
meu sexto sentido está me dizendo isso. Tu não me enganas. Acertei?
-
É...
-
Fala...
Ele
olhou para os lados, chamou a esposa e cochichou a promessa ao seu ouvido. Um
grito surgiu logo em seguida:
-
Seu cretino! Essa promessa não vai ser paga! Não vai mesmo!
Ele
dormiu no sofá por quatro dias seguidos.
* Jornalista e contista gaucho..
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