sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Nós, os honestos

* Por Rodrigo Ramazzini

Sete horas da manhã. Dois homens tomam café e comem uma torrada em uma lancheria. Eles estão sentados em altos bancos próximos ao balcão. Na televisão, o noticiário exibe uma detalhada reportagem sobre o mais novo escândalo de corrupção que atinge o Congresso Nacional, que gera o início de uma conversa entre a dupla.

- Que corja, né?
- É verdade!
- Olha... Vou te contar... Que bando de safado!
- Safados mesmo! Estão lá em Brasília só para roubar! Só para roubar! Só para roubar...
- Roubar o nosso dinheiro ainda por cima!
- Pois é... Eu não conheço um político honesto!
- Também não!
- Eu já desafiei muita gente a me dar o nome de um político honesto. Um! Um! Ninguém conseguiu...
- Pois é...
- Eles vêm com aquele papo em época de eleição que irão trabalhar por um país mais justo, trabalhar por saúde, trabalhar por educação, trabalhar para diminuir as desigualdades e olha aí agora. Quantos milhões desviados?
- Trinta e cinco milhões de reais...
- Trinta e cinco milhões de reais? É uma pouca vergonha! Os políticos se elegem para trabalhar em causa própria. Isso, sim! Sempre digo isso...
- Estás coberto de razão. É muita corrupção em benefício próprio que eles fazem.
- É por essas e outras que falta tudo em tudo que é área neste país... É muita roubalheira! Vai tudo para os bolsos desses pilantras...
- E tem quem diga que os políticos são o reflexo da sociedade. Eu discordo totalmente!
- Eu... Eu também! E te digo mais: quem diz isso é burguês que não precisa trabalhar de dia para comer de noite... Não rala o dia inteiro como nós, os honestos. Aí podem dizer estas asneiras...
- Bem por aí!
- Não existem mais políticos como antigamente, que eram honestos e honravam a palavra...
- Minha dúvida é se eles não roubavam também. Será que não?
- Podiam até roubar, mas faziam alguma coisa pelo menos. Hoje, esse bando de vagabundos só sabe roubar dinheiro dos nossos impostos!
- É verdade!
- Esse que está dando entrevista aí na televisão é o mais safado deles!
- Pior!
- Depois dessa vou até lá... Até mais!
- Até e bom dia!

O homem deixa o balcão e se dirige ao caixa para o pagamento. O valor consumido foi de R$ 8,50. Ele dá uma nota de R$ 10. Mas, a descuidada garçonete, que passava por um período difícil na vida pessoal, com o filho doente e uma crise no casamento, achando que ele tinha pagado com uma nota de R$ 50 devolve-lhe como troco R$ 41, 50.
Ao receber o troco, o homem olha para todos os lados, vê que o seu “amigo de conversa” assiste a cena, mas como se nada de errado estivesse acontecendo, despede-se dele pela última vez, coloca as notas na carteira e parte.

O outro homem balança a cabeça ao presenciar a situação, mas se omite de entrar em confusão. Não valia a pena. As arrecadações das bancas do jogo do bicho que faria ao longo do dia com certeza já lhe trariam alguma dor de cabeça..


* Jornalista e contista gaúcho. 

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