sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Você decide

A novela de televisão, tal como a conhecemos hoje, em capítulos diários, de segunda-feira a sábado, completou, em julho de 2013, 50 anos. Quem diria! É meio século de apresentações. Ou seja, quando começou a ser exibida, a grande maioria dos brasileiros sequer havia nascido. Não parece que já faz tanto tempo, não é? Mas faz. A primeira produção do gênero (apesar de haver contestações a respeito) foi “2-5499 Ocupado”. Estreou em 22 de julho de 1963, no horário das 19h30, na TV Excelsior de São Paulo, que há muito não existe mais. Tinha 42 capítulos. E a pioneira desse tipo de dramaturgia foi ao ar, no canal paulista, até setembro do mesmo ano. O sucesso foi relativo, pois nem de longe lembra os índices de audiência que as atuais novelas alcançam. Bem, é preciso considerar que, na época, o número de receptores de televisão era relativamente pequeno. Era um objeto cuja posse dava status a quem fosse seu privilegiado proprietário.

A Excelsior carioca colocou essa novela no ar quase dois meses depois da congênere paulista, em setembro de 1963, com conclusão em novembro. A primeira história não era de autoria de nenhum escritor brasileiro. O enredo de “2-5499 Ocupado” foi escrito pelo argentino Alberto Migré, adaptado para a TV por Dulce Santucci. A direção coube a Tito de Miglio e a novela apresentou, em seu elenco, um dos primeiros (pelo menos o mais famoso) pares românticos da TV, que viria a trabalhar em inúmeras outras produções e cuja parceria, entre outras coisas, viria a resultar em casamento na vida real. Querem saber quais eram esses atores? Eram Tarcísio Meira e Glória Menezes.

Atuaram, também, nessa apresentação pioneira, e que, portanto, se tornou histórica, Lolita Rodrigues, Neuza Amaral, Célia Coutinho, Maria Aparecida Alves, Lídia Costa, Dinah Ribeiro, Elenive Fayon, Lourdes Rocha e Wilma de Aguiar. Pena que a memória do brasileiro seja tão curta! Esses astros e estrelas da nossa dramaturgia, salvo uma ou outra exceção, estão absolutamente esquecidos, como se sequer tivessem existido. Cito-os como singela forma de homenageá-los, pois se trata de questão até de justiça. Se a novela é o que é hoje – grande sucesso de público não somente no Brasil, mas em pelo menos 50 países onde é exibida – deve muito, se não tudo, a esse grupo pioneiro.

O enredo de “2-5499 Ocupado” é muito simples, e pode ser resumido em poucas palavras. Narra a história de Emily (Glória Menezes) e de Larry (Tarcísio Meira). Ela é uma presidiária, cumprindo pena por um crime que não cometeu. Trabalha como telefonista do presídio (nos tempos que sequer se cogitava na invenção do celular). Ele, por seu turno, era advogado, com grande reputação de defender causas consideradas perdidas e de ganhá-las. Como se vê, eram pólos opostos na escala social. Um romance entre ambos, pelo menos na época (e, convenhamos, também nos dias atuais) era “quase” impossível. Digo “quase” porque, na vida real (e mais ainda, na ficção) acontece tanta coisa improvável, que torna praticamente tudo possível, apesar da improbabilidade.

Em determinado dia, Emily atende a uma ligação de um homem, mas, após trocarem algumas palavras, ela percebe que se tratava de engano. Mas aí acontece algo sumamente improvável, mas que às vezes se verifica. A presidiária e o advogado, sem nunca terem se visto e sem que um soubesse nada a respeito do outro, sequer os respectivos nomes, se apaixonam. Como?!!! Pela voz um do outro. O resto o leitor atento certamente já adivinhou.

Larry conhece Emily pessoalmente, ambos confirmam a mútua paixão, o defensor toma conhecimento da história da presidiária e decide pedir revisão do processo. Claro que tem sucesso em comprovar sua inocência e, como em toda a novela que se preze, o casal de pombinhos tem o esperado “happy end”. Os dois se casam e vivem felizes para sempre. E isso rendeu 42 capítulos que, dada a competência (diria, genialidade) dos atores, prendeu a atenção dos telespectadores por 42 dias! Essa novela foi o pontapé inicial para outras tantas, até que chegássemos onde chegamos. Destaque-se que, na época, a TV estava apenas “engatinhando”. Sequer se sonhava com os recursos existentes hoje. Foi tudo feito (e bem feito) na base da garra e da improvisação.

Há historiadores de TV (creiam-me, eles já existem), no entanto, que contestam o pioneirismo, no gênero, de “2-5499 Ocupado”. Para estes, a primeira telenovela brasileira foi, de fato, “Sua vida me pertence”, com vinte capítulos de 15 minutos cada, exibida no horário das 20 horas pela pioneiríssima e saudosa Tupi de São Paulo. Essa produção entrou no ar em 21 de dezembro de 1951 e teve o capítulo final em 15 de fevereiro de 1952. O leitor atento perguntará: “Mas como, se a novela tinha só vinte capítulos?!!”.É por isso que ela não é considerada pioneira pela maioria. Pelo fato de não ser apresentada diariamente. Sua periodicidade era bi-semanal (não me lembro em quais dias, mas... já faz tanto tempo!!!).

Essa telenovela (na verdade, teleteatro, pois era apresentada rigorosamente ao vivo, já que o videoteipe, se é que já estivesse inventado, ainda não havia chegado ao Brasil) era de autor brasileiro. O enredo foi escrito pelo extraordinário artista campineiro, que se consagraria como um dos maiores galãs de todos os tempos do rádio e da televisão brasileiros, Walter Forster. Se essa peça dramatúrgica, por sua periodicidade, não pode, a rigor, ser considerada a primeira novela brasileira, fez história por outro motivo. Protagonizou o primeiro beijo mostrado ao vivo na telinha. O par romântico que viveu essa experiência foi Walter Forster (que, além de autor, era o galã da produção) e Vida Alves. Alguns dos integrantes do elenco foram (além do par romântico citado): Lia de Aguiar, Dionísio de Azevedo e... Lima Duarte. Como se vê, são, todos, autênticos mitos da dramaturgia brasileira.

Qual dessas duas produções citadas merece, no seu entender, o destaque de pioneira do gênero em nossa televisão? Entendo que a primeira, pelo fato de ser exibida como as novelas de hoje são, com a mesmíssima periodicidade. Para não cometer injustiça, contudo, e em respeito a quem acha que “Sua vida me pertence” merece essa primazia, apesar de ser bi-semanal, trouxe ambas à baila, deixando a decisão para o leitor. Parodiando famoso programa da Rede Globo, deixo a seu critério, a você, que me dá a honra do seu prestígio. “Você decide!!!!”.

Boa leitura.


O Editor

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