segunda-feira, 14 de março de 2016

Risadinhas de financeira vitória

* Por Daniel Santos

Sabiam possivelmente tudo a meu respeito, antes mesmo de passar pela porta giratória: a câmera externa capturou-me ainda na calçada com tal habilidade que nem percebi e colocou-me, assim, em desvantagem.

Já dentro da agência, os funcionários olhavam-me com aquela autoridade da plena informação. Tinham, afinal, mais consciência de mim do que eu próprio, como parentes que não conseguimos enganar.

Adivinhavam, pois, necessidades que não pude negar, a seguir, quando me puseram ao par de suas pretensões. Sim, tinham planos para mim que, surpreendido, gaguejante, sem argumentos, aceitei indefeso.

O cerco, intimidatório, constrangedor, me aliciou com palavras de elegante convencimento: assinei o necessário. Sem que percebesse, haviam já colocado em minha boca frases, como “este banco é a melhor opção”.

Me despedi, afinal, com alívio, e saí apalpando os bolsos, tal a sensação de pilhagem. Porque algo me subtraíram. De outro modo, a que se deviam aquelas risadinhas de financeira vitória, enquanto me evadia?

* Jornalista carioca. Trabalhou como repórter e redator nas sucursais de "O Estado de São Paulo" e da "Folha de São Paulo", no Rio de Janeiro, além de "O Globo". Publicou "A filha imperfeita" (poesia, 1995, Editora Arte de Ler) e "Pássaros da mesma gaiola" (contos, 2002, Editora Bruxedo). Com o romance "Ma negresse", ganhou da Biblioteca Nacional uma bolsa para obras em fase de conclusão, em 2001.



Um comentário: