domingo, 11 de outubro de 2015

Questão de ordem ou uma questão de desordem*

** Por Jair Antonio Alves


Quando surgiu como dramaturgo, nas décadas de 70 e 80, já se sabia que Naum Alves de Souza marcaria para sempre o seu nome na Cultura brasileira. A peça No Natal a Gente vem te buscar, por exemplo, “assustou” os profissionais da área pela forma original e sensível de “desenhar” o Teatro. Agora, trinta e poucos anos após, com este maravilhoso retorno de Suburbano Coração a incógnita sobre Naum aumenta de volume – com que ideia está “fora de lugar” esse teatro de extrema sofisticação, ou o misencene diário que tortura corações e mentes da política nacional, aonde não faltam vilões embusteiras?

Outras questões ficam sem resposta – por que uma atriz e produtora como Luiza Jorge, sem dúvida, em seu melhor trabalho teatral está ameaçada por ter sua temporada interrompida em apenas poucas semanas em cartaz; por que a grande revelação como diretor nos últimos anos, Nelson Basqueville (definitivo na história contemporânea) a exemplo de José Celso, Antunes e Plínio Marcos, noutros tempos?

Por que essa “gritaria” toda numa simples avaliação crítica, dentre centenas de espetáculos oferecidos ao grande público paulista?

A resposta poderá ser lacônica - Tudo está errado!!!

O projeto Suburbano Coração levou dois anos para chegar à cena, agregando um elenco de primeira e uma equipe técnica de alto nível, que dá suporte a esta parceria (Naum, Luiza e Basqueville). Juntos, conseguiram produzir um fenômeno artístico sem precedentes correndo o risco de não “decolar”, em razão do caos que se instalou nos meios culturais, artísticos e comunicação nos últimos tempos. A inexistência de uma política cultural, Oficial, adequada ao momento Político-Econômico-Social do presente, pode levar à destruição por completo de fundamentos daquilo tudo quanto foi produzido nos últimos cinquenta anos. Podem ter certeza, a produção do espetáculo já citado fez com que a sua parte levou ao extremo a criação e auto-sensiblidade. Naum Alves de Souza escreve uma comédia  que é o próprio retrato na luta das mulheres, no Brasil industrial pós-guerra. Essa radiografia sepulta o sonho de “Cinderela” em que a nação brasileira deixou lá atrás, quando a telenovela Antonio Maria (tevê Tupi) ditava os modos de vida. Luiza Jorge, como atriz e produtora, encarna o sonho subliminar de milhares de outras brasileiras que acreditaram, enfim, no sonho que agora parece um pesadelo. Falamos de bancárias, professoras, operárias, jornalistas, profissionais liberais e demais. A conquista do padrão e liberdade econômica não veio acompanhada da realização afetiva e sexual. Já os homens continuam cada vez mais canalhas, até porque a cafajestagem é o protótipo de representação do que é ser brasileiro. Inteligentemente Baskerville optou para que os dois atores (Claudinei Brandão e Fernando Fecchio) se multipliquem em diversos papéis masculinos como forma de caracterizar a ideia de que todos se parecem, não importando a função que exerçam. As atrizes, Aldine Muller e Luciana Azevedo são absolutamente geniais como parceiras de “Lovemar”, desde a infância até a vivência nos tempos atuais. Apesar de ter sido escrita em meados de 80 a peça nos parece, hoje, revelar que o futuro está no sonho perdido por alguma razão revelada sem retoques; como agora exatamente quando nos perdemos. É o recomeço ou no fim do teatro, enquanto a atividade é a essência para a Sociedade brasileira Contemporânea. 

Entendo que cada profissional de teatro, comunicação e/ou da cultura tem o dever de abraçar esta causa – o espetáculo em questão não pode “morrer na praia”, com o risco de nos afogarmos abraçados e mal-humorados. Suburbano Coração traz a síntese do teatro alegria que, afinal, está faltando no nosso dia a dia.

Como e onde ver Suburbano  Coração?

(*) A cena nacional (na real ou no palco) está dividida entre o teatro de Pirandello (é o que a imprensa quer que acreditemos) e a vida real/crua das ruas, dos bares, das casas, das vielas e dos cafofos, assim como poder ser vista no teatro de Nelson Rodrigues e Plinio Marcos.

(**)Dramaturgo


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