Contrastes da noite
* Por
Luís Carlos
Ver a noite pairar placidamente escampa,
Sem um cirro, sequer, que se adelgace a rastros,
Toda ungida de luar, toda esculpida de astros,
Imitando na Altura o azul que o dia estampa;
Ver a noite pairar pela amplidão silente,
Em mística volúpia, eternamente nua,
Parecendo ressoar leves toadas da Lua,
Indefinidamente, indefinidamente...
Ver todo esse esplendor do Céu como um proscênio,
Na glorificação sem fim da Eternidade,
E, na ânsia de o tocar, vê-lo que nos dissuade,
Intangível à força, intingível ao gênio.
É ver tudo o que prova a inanidade humana;
É sentir a coação tantálica da argila,
Que, em seu cárcere vil, o ser nos aniquila
E aos brutos animais na Terra nos irmana!
Mas uma noite, assim... mas uma noite pura
Como esta, que ora, no ar, ao plenilúnio, vibra,
Tanta magia tem que à mais nervosa fibra
Imprime calma e imprime encanto à desventura!
Uma noite como esta é uma oblação imensa:
Vão as cousas, parece, empoeiradas de neve,
Num gesto de ascensão etereamente leve,
Que o límpido vapor do plenilúnio incensa...
Uma noite como esta é o supremo conforto
E o supremo perdão para a miséria e o crime;
É o Céu que se desvenda e a paz futura exprime,
A um tempo a recordar todo o passado morto.
É, pois, uma esperança a uma saudade unida,
Na extrema aspiração em que a alma se transporte:
- Esperança de um bem, que só virá na morte;
Saudade de outro bem, que não vem mais na vida.
*
L. C. da Fonseca Monteiro de Barros foi engenheiro civil e poeta, membro da
Academia Brasileira de Letras
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