quarta-feira, 29 de maio de 2013

Loucos não usam calça de hóquei

* Por Fernando Yanmar Narciso

Sou a favor do vigilantismo, da justiça com as próprias mãos. Quem não consegue defender a si próprio contra a maldade e o crime não merece o direito de cobrar melhor segurança dos governantes, por isso vivo de olho roxo. Há um ano, influenciado pela trilogia de filmes Cavaleiro das Trevas de Christopher Nolan, resolvi colecionar as revistas do Batman. Sei o que os leitores não-escolados devem estar pensando agora... Crianção! Cria vergonha na cara! Vira homem e assina a Penthouse! Esse tipo de mentalidade estreita não deixa de ser prejudicial para o universo dos quadrinhos, afinal, quem assistiu à trilogia sabe que não há nenhuma criancice naqueles filmes, tampouco nos gibis.

As revistas do Batman são uma leitura no mínimo peculiar. Tenho certeza que os escritores e desenhistas não se esqueceram que, na essência, ele é um psicopata que gosta de socar bandidos à noite vestido de morcego. Mesmo assim, as histórias que eles escrevem têm um teor tão sério, brutal e complexo que às vezes eles parecem estar escrevendo um livro de Dan Brown. Mas quão a sério alguém poderia levar uma figura como ele? Quer dizer, ele é um personagem irremediavelmente apaixonado pelo que faz, nunca sorri ou demonstra alguma leveza de espírito. Conseguem imaginar a ele ou a qualquer outro super-herói passando diante de um espelho e mantendo a mesma seriedade? ELE É CHARLES MANSON METIDO NUMA ROUPA DE MORCEGO, GENTE! ESSE CARA PRECISA TER SENSO DE HUMOR! Até o Coringa vive fazendo chacota com a roupa do morcegão, e ele é um palhaço branco de cabelo verde!

Quando se pensa no homem-morcego, provavelmente a primeira coisa que vinha à cabeça era a comédia de TV dos anos 60. Graças à toda a censura e perseguição do Macarthismo na década de 50, há muito Batman não representava nenhuma ameaça aos criminosos, ele até sorria e tinha distintivo da polícia! A série de TV basicamente pegou o tom farsesco e pueril dos quadrinhos daquele tempo e lhe deu uma overdose de Ritalina. Reza a lenda que Adam West, quando escalado para dar vida ao herói, foi instruído para interpretá-lo como se fosse Hamlet. Não sabemos até que ponto ele levou a instrução a sério, mas que a série era um verdadeiro baile de carnaval caricato e sem um pingo de respeito pelo legado do personagem, isso era. Depois dela, só mesmo o filme do Superman de 1978 para devolver alguma dignidade ao universo dos super-heróis. Por todo o mal que a série causou, apesar de ser hilária e memorável, o homem que se dispusesse a propor um filme do Batman na década de 80 certamente sairia da sala de reuniões numa camisa de força, e seria posto na mesma cela acolchoada que Bruce Wayne divide com o Coringa.

Porém, os tempos eram outros. No mundo dos quadrinhos, Frank Miller, o artista mais lunático do ramo, teve a macheza de trazer o morcegão de volta ao básico, despido de todos os exageros e como o que ele costumava ser: Um vigilante sociopata com uma vontade tão grande de combater o crime que essa vontade o cega para tudo o mais à sua volta. Batman: O Cavaleiro das Trevas é até hoje considerada um tipo de evangelho dos fanáticos por super-heróis, e foi dessa fonte que os filmes da época, lançados pelo diretor estreante Tim Burton, beberam com gosto. Apesar de atualmente Batmane Batman- O Retorno nos parecerem um tanto ultrapassados e até meio tolinhos, são adorados pelos fãs. Eram o supra-sumo do dark e do gótico na década de 90, e fizeram o homem-morcego recuperar seu status de ícone cultural.

Mas talvez Burton tenha pesado um pouco a mão quanto à violência e ao clima fantasmagórico dos filmes, pois as criancinhas saíam do cinema chorando apavoradas. E, mesmo para dois dos filmes de maior bilheteria da história e que venderam toneladas de brinquedos, isso não é um bom sinal. E o que a Warner Bros. fez então? Limou Tim Burton da cadeira do diretor e começou a fazer inúmeras alterações para que o público infantil não se apavorasse mais.

O, na época, conceituado diretor Joel Schumacher- e que agora não pode mais nem mostrar a cara em público, foi contratado para dirigir o Magic Busde Gotham de acordo com o tom familiar que o estúdio buscava. E, em suas duas deploráveis empreitadas no universo de Batman, ele basicamente atualizou a velha série cômica dos anos 60, trazendo de volta o odioso Robin e a Batgirl, efeitos especiais de ponta exagerados e carnavalescos e, principalmente, muitas, MUITAS piadinhas sem graça, do tipo que nem a mãe de quem conta consegue rir.

Batman Eternamente e Batman & Robin, apesar de terem vendido bem mais bonequinhos de Mc Lanche Feliz, agora pertencem à infâmia de Hollywood, e a simples menção desses nomes faz com que os nerds nos escorracem da cidade, cobertos de piche e penas. No entanto, por mais ridículas que as encarnações da série de TV e dos primeiros filmes nos pareçam hoje, temos de reconhecer que, pelo menos, tinham a consciência de que a função deles era nos divertir e do quão deslocados da nossa realidade estavam nossos heróis e vilões favoritos, porque agora...

Não vou mentir. A nova trilogia do Batman faz justiça a todas as grandes trilogias do cinema como Senhor dos Aneis e O Poderoso Chefão. Gosto muito de todos os três filmes, mas o erro de Nolan foi ter literalmente trago o Batman para o mundo real. Na visão do diretor, Bruce Wayne vive na Npva York Taxi Driver ou na Londres de Laranja Mecânica. Não senhor, esse Batman aqui não tem tempo para brincadeira. Esse Batman aqui é basicamente um agente da SWAT de armadura preta de kevlar e que anda de tanque. Gotham é um local tão triste, os filmes são tão claustrofóbicos e depressivos que no fim nem nos importamos se o morcegão conseguiu salvar o dia, só queremos que aquele delicioso pesadelo acabe! Não importa o quão intenso e realista seja o roteiro, não importa se seus filmes sejam mais sombrios que o fundo da minha carteira, não há nada que me convença de que uma figura como o Batman seja plausível no mundo real. O tipo de coisa que só os nerds fanáticos fundamentalistas seriam capazes de acreditar.

Para o Bat- carrinho de mão!


Um comentário:

  1. Adultos gostam de super-heróis. Nos quadrinhos antigos eu não percebia as crises existenciais de Batman e não gostava dele, pois era tão "mortal" e frágil, para o meu gosto. A minha paixão era Super-homem. Ainda assim assisti a primeira grande produção de Batman e gostei. Boas falas.

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