Curiosidade e
observação
A curiosidade é o
grande motor que nos impulsiona ao conhecimento, a qualquer deles. Temos que “querer”
aprender.Temos que buscar saber o que há por trás de tudo e de responder os
infinitos por quês que assomam nossa mente. O que, quem, quando, como, por que
etc.etc.etc. são questões que devem estar permanentemente em nosso raciocínio,
nos espicaçando a buscarmos respostas. Se não quisermos conhecer algo, seja o que
for, dificilmente conheceremos de fato. A menos que... sejamos forçados a isso
pelas circunstâncias.
Para sabermos, por
exemplo (caso não saibamos ou duvidemos desse conhecimento primitivo) que não
se deve colocar a mão no fogo, pois se o fizermos, sofreremos dolorosas queimaduras,
não precisamos passar por essa estúpida experiência. Nenhum animal irracional ousa
passar por ela. A prudência manda que aproveitemos as conseqüências sofridas
pelas pessoas que se arriscaram a fazer o teste prático a propósito e se deram
mal. Neste caso, seria de extrema burrice a “curiosidade” para saber qual a
sensação causada por uma queimadura.
Tenho curiosidade
infinita, sem limites. Creio que todas as pessoas, ou pelo menos a maioria,
também tem, embora nem todas saibam temperá-la com prudência ou com os clamores
dos instintos. Presumo que haja muita gente assim, que não se contente em
saber, através de terceiros, que não se deve colocar a mão no fogo (este é um
exemplo extremo, claro, mas há outros tantos, menos dramáticos, mas nem por
isso menos perigosos), que querem, portanto, testar por si sós para saber o que
acontece. Dão-se mal, sem dúvida.
A maior curiosidade humana
é a respeito do próprio homem: de si mesmo ou dos semelhantes. E o principal
instrumento (ou um dos principais, que seja!) para satisfazer essa curiosidade,
sem que precisemos arriscar a integridade física (pelo menos não muito) é a
observação. É aprendermos com experiências alheias e, dessa forma, queimarmos
etapas na busca do conhecimento. É a ferramenta por excelência, por exemplo, do
cientista, seja qual for a disciplina em que seja especializado. Mas é, também,
a do filósofo e, sobretudo, dos artistas (e, entre estes, do escritor, óbvio).
No que é o básico (na
estrutura física, na aparência, nos instintos, na capacidade de pensar etc.)
todos os homens são, aparentemente, iguais. São mesmo? Eu não diria isso. Diria
que são “semelhantes”. Nesse aspecto, a natureza é caprichosa. Nunca repete o mesmo
figurino, o mesmo modelo, embora pareça que sim. Não há, nunca houve e jamais
haverá dois seres vivos, não importa se animais ou vegetais, rigorosamente
iguais. Não há duas folhas que sejam, entre a infinidade de folhagens mundo
afora, uma cópia da outra. A diferença é uma das características básicas da
natureza.
O filósofo
norte-americano Will Durant, em seu magnífico livro “Filosofia da vida”, (que
li, reli, decorei trechos e mais trechos e que não me canso de citar), explica,
com meridiana clareza, essa heterogeneidade dos seres vivos e sua razão
objetiva. Escreve: “É amargamente certo que todos os indivíduos e todas as
raças são desiguais por natureza, em virtude de boa ou má sorte no jogo da
hereditariedade; e estas desigualdades constituem o material com que a seleção
trabalha; são, pois, a fonte da evolução. Se os organismos fossem iguais não
podia haver seleção, nem emulação, nem desenvolvimento. A luta é a mãe de todas
as coisas, não só entre as classes como entre as nações”.
O escritor inglês
Aldous Huxley – também ele emérito observador da vida e, por conseqüência, da
natureza – põe mais lenha nessa fogueira, ao constatar, em seu instigante livro
“Volta ao Admirável Mundo Novo”: “No transcorrer da sua evolução, a natureza
não se furtou a desgraças sem fim para que cada indivíduo fosse diferente dos
outros indivíduos. Reproduzimos a nossa espécie estabelecendo contato entre os
genes do pai com os genes da mãe. Estes fatores hereditários podem ser
dispostos num número quase infinito, Física e mentalmente, cada um de nós é
exclusivo. Qualquer cultura que, no interesse da eficácia, ou em nome de
qualquer dogma político ou religioso, procura padronizar o indivíduo humano,
comete um ultraje contra a natureza biológica do homem”.
Essas diferenças, em
nome da harmonia e da sadia convivência, deveriam aproximar os homens e não
separá-los. O forte deveria ajudar o mais fraco, em vez de dominá-lo. O mais
sábio deveria orientar o néscio, e nunca escarnecê-lo. E assim por diante.
Óbvio que não é o que acontece e jamais aconteceu. Daí esse estado de
permanente conflito, e não apenas entre as pessoas, mas entre grupos,
comunidades e nações.
A despeito de sermos
física, mental, psicológica e afetivamente diferentes, temos, todos, sem
exceção, característica comum: deficiências. Não há – no plano puramente
humano, não me refiro ao “divino” – ninguém perfeito. A perfeição – não sei se
feliz ou infelizmente – nos é interdita. Todos, sem exceção, têm lá suas
deficiências e vulnerabilidades, uns mais outros menos. Daí a necessidade vital
de mútua tolerância. O filósofo Voltaire (cujo nome de batismo era François Marie
Arouet), observou a propósito: “Todos nós somos a mistura de fraquezas e de
erros; perdoemos reciprocamente nossas tolices, eis a primeira lei da natureza”.
E não estava certo?
O antropólogo,
ecologista e poeta norte-americano, Loren Eiseley, escreveu algo que tem o
mesmo sentido, posto que em termos mais poéticos: “Somos criaturas de muitas
dimensões diferentes, passando pelas vidas uns dos outros como fantasmas
passando por portas”. A melhor definição da nossa espécie, todavia, pelo menos
para mim, é esta do filósofo tomista francês Jacques Maritain: “Cada ser humano
é um indivíduo como o animal, a planta, o átomo, fragmento de uma espécie,
parte singular da imensa rede de influências cósmicas, étnicas e históricas que
o dominam. E ao mesmo tempo é uma pessoa, quer dizer, um universo de natureza
espiritual, dotado de livre-arbítrio e, como tal, um todo independente em face
do mundo”. Pensem nisso. E, sobretudo, observem. E mais importante de tudo:
nunca deixem morrer em suas mentes permanente e insaciável curiosidade, fonte
de todo saber.
Boa leitura.
O Editor.
Acompanhe o Editor pelo twitter: @bondaczuk
Desse defeito sou vítima, pois tudo quero saber. Como a produção de conhecimento é infinita, o desejo da saber acaba gerando angústia e prazer simultaneamente, pois a todo momento aprendo coisas. Pena que não as retenho todas em minha minúscula memória. O que fazer para ampliá-la? tema para outro editorial.
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