Sandices animais
* Por Jair Lopes
Para fins didáticos os homens costumam dividir a natureza em três reinos básicos: mineral, vegetal e animal. Existem reinos como os das moneras e outros mais, mas não é disso que vamos falar, então fiquemos com os três iniciais. Já toquei na vida das plantas em meu texto “Sandices botânicas”, portanto agora é vez de falar dos animais.
A maioria dos homens por ser pretensiosa, arrogante e ignorante costuma não se enquadrar na mesma categoria dos outros animais, parece querer dar a impressão de pertencer a um reino a parte. Até a bíblia no livro de Gênesis faz menção que os animais foram criados para “servir ao homem”. Santa ignorância!
Homens e ratos são seres do mesmo reino e um é tão evoluído quanto o outro. São diferentes sim, talvez tão diferentes entre si quando o é um cão de um gato, por exemplo, mas a diferença termina aí. Então vejamos, para aqueles que se julgam muito superiores a esses mamíferos, veio-me à mente que, a propósito do término do "Projeto Genoma", o qual depois de consumir milhões de dólares e milhares de horas das cabeças pensantes mais poderosas do planeta e, de tempos em tempos, movimentar a mídia com notícias sensacionais a respeito de descobertas fantásticas, chegou à conclusão que: contados todos os genes do homem, estes não passam de uns meros trinta mil, o mesmo número de genes do rato. Para a ciência, que achava que os genes do homem chegariam à casa dos cem mil, foi um balde de água fria esta conclusão, pois, se depender dos genes, o arrogante bicho-homem é apenas um rato que fala.
Então, preconceitos e arrogância a parte, o Homo sapiens e centenas de outros animais estabeleceram uma convivência, nem sempre muito pacífica e sem estresse, há milhares de anos e continuam essa relação nos tempos atuais, o mais das vezes com prejuízo para os outros e visível “ganho” para nós a parte “inteligente” do relacionamento.
Mas, como se deu esse consórcio entre o bípede falante e os bichos, em geral, de quatro – alguns, como as abelhas e o bicho da seda têm seis, as aves têm duas e as bactérias e os peixes não têm - patas? Começou há pelo menos dez mil anos quando os primeiros humanos que até então eram nômades caçadores-coletores, resolveram “sossegar o pito”, ou seja, estabeleceram os primeiros assentamentos semi permanentes, ou fixos de fato. Portanto, a relação homem-cão, por exemplo, é muito antiga, isto é, praticamente desde os primeiros alvores do que chamamos civilização. Sabe-se que os homens primitivos domesticaram o lobo asiático e dele, através de seleção genética, foram criando as primeiras “raças” que acabaram dando a origem às centenas que conhecemos na atualidade. Assim, também o onagro (espécie de burrico), o cavalo, reses como cabras, vacas e ovelhas foram sendo introduzidos nas aglomerações semi urbanas.
É razoável supor que os primeiros aglomerados humanos produziam rejeitos que atraiam os animais, principalmente em épocas de escassez. Ossos e restos de comida deviam ser convidativos aos lobos famintos, roças e plantações domésticas atraíam os comedores de plantas. Uma vez que os animais se aproximavam, os mais mansos podiam ser capturados e mantidos em cativeiro, ou mesmo apenas dentro do perímetro da aldeia onde recebiam alimentos, se sentiam seguros e podiam procriar sem problema. Deve-se sempre levar em conta que, mesmo na natureza, os animais estão sempre em busca de segurança, alimento e oportunidade de reprodução, e era isso que os homens lhes proporcionavam, daí domesticá-los tornou-se uma consequência da proximidade e da utilidade efetiva ou potencial que representavam.
Mais a civilização avançava rumo à modernidade, mais animais eram incorporados ao já numeroso contingente desses “auxiliares” e às vezes escravos das pessoas. Desde os maciços elefantes asiáticos, passando por renas, cavalos, vacas, coelhos, perus, galinhas, canários, peixes e até bactérias, todos se tornaram parte integrante do cenário civilizatório. Homens e seus animais domesticados construíram a civilização.
Assim, animais antes selvagens agora domesticados atrelados aos homens erigiram o piramidal edifício que suporta a civilização, na maioria das vezes com enorme prejuízo para aqueles e benefícios para estes. Os bichos carregaram gente e as mais diversas cargas no lombo; forneceram suas carnes para alimentação, pele e ossos para roupas abrigos, utensílios e armas; foram e são usados como cobaias nos mais diversos experimentos laboratoriais para obtenção de novos produtos e medicamentos; são sacrificados para uso de seus hormônios como fixados de perfumes e seus lipídios para fabricação de cosméticos; servem para recreação humana desde corridas de cavalos e cães, até brigas de peixes e galos; alem de serem caçados por lazer, como os são veados, gamos, felinos africanos, rinocerontes, bisões e dezenas de espécies de aves.
Enquanto homens exercerem domínio neste Planeta, enquanto continuarem se achando melhores e mais dotados que outros animais, estes estarão sempre na iminência de desaparecer para sempre. Atualmente há registro de milhares de animais que foram extintos, alguns não chegaram nem a ser estudados e conhecidos. Entre estes se encontra o Tilacino, conhecido por Tigre da Tasmânia, um marsupial carnívoro no formato de um cão grande que foi dizimado por caçadores australianos sob a alegação de que comia ovelhas, fato nunca comprovado. O último espécime conhecido foi filmado em cativeiro em 1936, ano em que morreu.
Outro animal, o moa, vivia muito bem nas ilhas neozelandesas só tendo como inimigo a águia haast, ave imensa que era predadora de seus ovos, filhotes e de adultos velhos ou feridos, até que, por volta de 1300 dC, o povo maori chegou e todos os gêneros de moa foram levados ao risco de extinção. Por volta do ano 1400 quase todos os moa são considerados extintos, juntamente com a águia haast que tinha confiado neles como alimento. Alguns relatos confiáveis têm confirmado que alguns espécimes continuaram persistindo nos cantos mais remotos da Nova Zelândia até os séculos 18 e mesmo 19, quando foram sistematicamente caçados pelos colonizadores e definitivamente extintos. No confronto da fauna nativa como os homens estes sempre saem “ganhando” para prejuízo do Planeta.
• Escritor
* Por Jair Lopes
Para fins didáticos os homens costumam dividir a natureza em três reinos básicos: mineral, vegetal e animal. Existem reinos como os das moneras e outros mais, mas não é disso que vamos falar, então fiquemos com os três iniciais. Já toquei na vida das plantas em meu texto “Sandices botânicas”, portanto agora é vez de falar dos animais.
A maioria dos homens por ser pretensiosa, arrogante e ignorante costuma não se enquadrar na mesma categoria dos outros animais, parece querer dar a impressão de pertencer a um reino a parte. Até a bíblia no livro de Gênesis faz menção que os animais foram criados para “servir ao homem”. Santa ignorância!
Homens e ratos são seres do mesmo reino e um é tão evoluído quanto o outro. São diferentes sim, talvez tão diferentes entre si quando o é um cão de um gato, por exemplo, mas a diferença termina aí. Então vejamos, para aqueles que se julgam muito superiores a esses mamíferos, veio-me à mente que, a propósito do término do "Projeto Genoma", o qual depois de consumir milhões de dólares e milhares de horas das cabeças pensantes mais poderosas do planeta e, de tempos em tempos, movimentar a mídia com notícias sensacionais a respeito de descobertas fantásticas, chegou à conclusão que: contados todos os genes do homem, estes não passam de uns meros trinta mil, o mesmo número de genes do rato. Para a ciência, que achava que os genes do homem chegariam à casa dos cem mil, foi um balde de água fria esta conclusão, pois, se depender dos genes, o arrogante bicho-homem é apenas um rato que fala.
Então, preconceitos e arrogância a parte, o Homo sapiens e centenas de outros animais estabeleceram uma convivência, nem sempre muito pacífica e sem estresse, há milhares de anos e continuam essa relação nos tempos atuais, o mais das vezes com prejuízo para os outros e visível “ganho” para nós a parte “inteligente” do relacionamento.
Mas, como se deu esse consórcio entre o bípede falante e os bichos, em geral, de quatro – alguns, como as abelhas e o bicho da seda têm seis, as aves têm duas e as bactérias e os peixes não têm - patas? Começou há pelo menos dez mil anos quando os primeiros humanos que até então eram nômades caçadores-coletores, resolveram “sossegar o pito”, ou seja, estabeleceram os primeiros assentamentos semi permanentes, ou fixos de fato. Portanto, a relação homem-cão, por exemplo, é muito antiga, isto é, praticamente desde os primeiros alvores do que chamamos civilização. Sabe-se que os homens primitivos domesticaram o lobo asiático e dele, através de seleção genética, foram criando as primeiras “raças” que acabaram dando a origem às centenas que conhecemos na atualidade. Assim, também o onagro (espécie de burrico), o cavalo, reses como cabras, vacas e ovelhas foram sendo introduzidos nas aglomerações semi urbanas.
É razoável supor que os primeiros aglomerados humanos produziam rejeitos que atraiam os animais, principalmente em épocas de escassez. Ossos e restos de comida deviam ser convidativos aos lobos famintos, roças e plantações domésticas atraíam os comedores de plantas. Uma vez que os animais se aproximavam, os mais mansos podiam ser capturados e mantidos em cativeiro, ou mesmo apenas dentro do perímetro da aldeia onde recebiam alimentos, se sentiam seguros e podiam procriar sem problema. Deve-se sempre levar em conta que, mesmo na natureza, os animais estão sempre em busca de segurança, alimento e oportunidade de reprodução, e era isso que os homens lhes proporcionavam, daí domesticá-los tornou-se uma consequência da proximidade e da utilidade efetiva ou potencial que representavam.
Mais a civilização avançava rumo à modernidade, mais animais eram incorporados ao já numeroso contingente desses “auxiliares” e às vezes escravos das pessoas. Desde os maciços elefantes asiáticos, passando por renas, cavalos, vacas, coelhos, perus, galinhas, canários, peixes e até bactérias, todos se tornaram parte integrante do cenário civilizatório. Homens e seus animais domesticados construíram a civilização.
Assim, animais antes selvagens agora domesticados atrelados aos homens erigiram o piramidal edifício que suporta a civilização, na maioria das vezes com enorme prejuízo para aqueles e benefícios para estes. Os bichos carregaram gente e as mais diversas cargas no lombo; forneceram suas carnes para alimentação, pele e ossos para roupas abrigos, utensílios e armas; foram e são usados como cobaias nos mais diversos experimentos laboratoriais para obtenção de novos produtos e medicamentos; são sacrificados para uso de seus hormônios como fixados de perfumes e seus lipídios para fabricação de cosméticos; servem para recreação humana desde corridas de cavalos e cães, até brigas de peixes e galos; alem de serem caçados por lazer, como os são veados, gamos, felinos africanos, rinocerontes, bisões e dezenas de espécies de aves.
Enquanto homens exercerem domínio neste Planeta, enquanto continuarem se achando melhores e mais dotados que outros animais, estes estarão sempre na iminência de desaparecer para sempre. Atualmente há registro de milhares de animais que foram extintos, alguns não chegaram nem a ser estudados e conhecidos. Entre estes se encontra o Tilacino, conhecido por Tigre da Tasmânia, um marsupial carnívoro no formato de um cão grande que foi dizimado por caçadores australianos sob a alegação de que comia ovelhas, fato nunca comprovado. O último espécime conhecido foi filmado em cativeiro em 1936, ano em que morreu.
Outro animal, o moa, vivia muito bem nas ilhas neozelandesas só tendo como inimigo a águia haast, ave imensa que era predadora de seus ovos, filhotes e de adultos velhos ou feridos, até que, por volta de 1300 dC, o povo maori chegou e todos os gêneros de moa foram levados ao risco de extinção. Por volta do ano 1400 quase todos os moa são considerados extintos, juntamente com a águia haast que tinha confiado neles como alimento. Alguns relatos confiáveis têm confirmado que alguns espécimes continuaram persistindo nos cantos mais remotos da Nova Zelândia até os séculos 18 e mesmo 19, quando foram sistematicamente caçados pelos colonizadores e definitivamente extintos. No confronto da fauna nativa como os homens estes sempre saem “ganhando” para prejuízo do Planeta.
• Escritor
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