Baba-ovo
* Por Marcelo Sguassábia
Não conhecia a expressão até outro dia. Já tinha ouvido muitas de suas variantes elencadas pelo Aurélio: bajulador, adulador, adulão, babão, cafofa, chaleira, incensador, lambedor, lambeta, lambeteiro, louvaminheiro, puxa-saco, sabujo, xereta, banhista, cheira-cheira, chupa-caldo, corta-jaca, engrossador, enxuga-gelo, escova-botas, incensador, xeleléu, lambedor, lambe-botas, lambe-esporas e mais um outro sinônimo realmente impronunciável.
Mas baba-ovo pra mim é novo. Não o sujeito, mas o predicado. Aliás, alguém poderia me dizer por que baba-ovo se chama baba-ovo e por que puxa-saco se chama puxa-saco?
Questões semânticas à parte, é preciso reconhecer que o baba-ovo legítimo, aquele que honra a classe, geralmente não é o que se poderia chamar de um cara ambicioso. Sua pretensão é ter o seu lugarzinho ao sol e tudo bem. Não chega a ser arrivista e também não é necessariamente mau-caráter. É ardiloso de nascença e por força das circunstâncias, mas seria uma injustiça chamá-lo de canalha. Falta a ele coragem para a vilania.
Como tudo que é rasteiro e ordinário, os baba-ovos pululam à nossa volta, é raça que se dissemina em estonteante velocidade. Agora mesmo tem um baba-ovinho nascendo. Tão baba-ovo que, se dependesse dele, ao invés de chorar na hora do parto daria um tapinha nas costas do médico. Sabe como é, nunca se sabe quando é que se vai precisar das pessoas...
Uma vez baba-ovo, sempre baba-ovo. Começa com a maçã lustrosa na mesa do professor e termina com o discurso, aos prantos, na cerimônia comemorativa aos 75 anos do Diretor-Presidente. E nessas e outras pequenas coisinhas, lá vai ele se segurando no staff e amealhando pontinhos.
O baba-ovo não é o político. É o assessor dele. Seu negócio é mais superficialzinho, não engendra grandes estratagemas e não age em quadrilha. É improvável que um puxa-saco entre em conluio com quem quer que seja pra obter alguma coisa. O baba-ovo de verdade é egoísta, quer fazer ele mesmo e não gosta de dividir o mérito, se é que se pode chamar de mérito o produto de sua desfaçatez.
Ser o escudeiro é tudo o que basta ao abnegado puxa-saco. Ele se compraz tendo o imediato superior a reverenciar. A seara dele é o bastidor, a adulação estudada e cheia de intenções adjacentes. O barato do baba-ovo é a própria vassalagem, curvar a espinha é o seu orgasmo. Fica sabonetando e estendendo o tapete por instinto e vocação mesmo. Definitivamente, ele gosta da coisa.
O mais engraçado no baba-ovo é a sua inaptidão em disfarçar a babaovice. Se acha um expert em dissimulação, tem certeza de que ninguém está percebendo seus expedientes. Não imagina o quanto sua pretensa sutileza é ostensiva, o quanto é alvo de chacota nas rodinhas de conversa e nas mesas de bar. Enfim, o torpezinho mal sabe a que ponto sua fama é estabelecida na praça. E vai ficando sem saber, já que falta peito aos colegas para alertar o indivíduo. Já pensou chegar pro enxuga-gelo e dizer – “Ô meu, manera na puxa-saquice que tá dando na vista”? Não dá. É algo parecido com aquela história de avisar o sujeito que ele tem mau hálito. Todo mundo sabe que é uma boa ação, até um gesto de caridade, mas ninguém se aventura a ser tão sincero.
Nas reuniões, sua perfeita concordância com as opiniões do chefe é tão automática e previsível que não choca mais ninguém. Mas aí acontece um imprevisto: o baba-ovo é surpreendido por uma inesperada promoção e passa a ser sub-chefe de qualquer coisa. Consequentemente ele terá, se não um arsenal, pelo menos um neo baba-ovo mais do que disposto a lamber-lhe as polainas. A pergunta é: será que ele, alçado agora ao posto de “adulável”, vai perceber?
• Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: www.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) www.letraeme.blogspot.com (portfólio)
* Por Marcelo Sguassábia
Não conhecia a expressão até outro dia. Já tinha ouvido muitas de suas variantes elencadas pelo Aurélio: bajulador, adulador, adulão, babão, cafofa, chaleira, incensador, lambedor, lambeta, lambeteiro, louvaminheiro, puxa-saco, sabujo, xereta, banhista, cheira-cheira, chupa-caldo, corta-jaca, engrossador, enxuga-gelo, escova-botas, incensador, xeleléu, lambedor, lambe-botas, lambe-esporas e mais um outro sinônimo realmente impronunciável.
Mas baba-ovo pra mim é novo. Não o sujeito, mas o predicado. Aliás, alguém poderia me dizer por que baba-ovo se chama baba-ovo e por que puxa-saco se chama puxa-saco?
Questões semânticas à parte, é preciso reconhecer que o baba-ovo legítimo, aquele que honra a classe, geralmente não é o que se poderia chamar de um cara ambicioso. Sua pretensão é ter o seu lugarzinho ao sol e tudo bem. Não chega a ser arrivista e também não é necessariamente mau-caráter. É ardiloso de nascença e por força das circunstâncias, mas seria uma injustiça chamá-lo de canalha. Falta a ele coragem para a vilania.
Como tudo que é rasteiro e ordinário, os baba-ovos pululam à nossa volta, é raça que se dissemina em estonteante velocidade. Agora mesmo tem um baba-ovinho nascendo. Tão baba-ovo que, se dependesse dele, ao invés de chorar na hora do parto daria um tapinha nas costas do médico. Sabe como é, nunca se sabe quando é que se vai precisar das pessoas...
Uma vez baba-ovo, sempre baba-ovo. Começa com a maçã lustrosa na mesa do professor e termina com o discurso, aos prantos, na cerimônia comemorativa aos 75 anos do Diretor-Presidente. E nessas e outras pequenas coisinhas, lá vai ele se segurando no staff e amealhando pontinhos.
O baba-ovo não é o político. É o assessor dele. Seu negócio é mais superficialzinho, não engendra grandes estratagemas e não age em quadrilha. É improvável que um puxa-saco entre em conluio com quem quer que seja pra obter alguma coisa. O baba-ovo de verdade é egoísta, quer fazer ele mesmo e não gosta de dividir o mérito, se é que se pode chamar de mérito o produto de sua desfaçatez.
Ser o escudeiro é tudo o que basta ao abnegado puxa-saco. Ele se compraz tendo o imediato superior a reverenciar. A seara dele é o bastidor, a adulação estudada e cheia de intenções adjacentes. O barato do baba-ovo é a própria vassalagem, curvar a espinha é o seu orgasmo. Fica sabonetando e estendendo o tapete por instinto e vocação mesmo. Definitivamente, ele gosta da coisa.
O mais engraçado no baba-ovo é a sua inaptidão em disfarçar a babaovice. Se acha um expert em dissimulação, tem certeza de que ninguém está percebendo seus expedientes. Não imagina o quanto sua pretensa sutileza é ostensiva, o quanto é alvo de chacota nas rodinhas de conversa e nas mesas de bar. Enfim, o torpezinho mal sabe a que ponto sua fama é estabelecida na praça. E vai ficando sem saber, já que falta peito aos colegas para alertar o indivíduo. Já pensou chegar pro enxuga-gelo e dizer – “Ô meu, manera na puxa-saquice que tá dando na vista”? Não dá. É algo parecido com aquela história de avisar o sujeito que ele tem mau hálito. Todo mundo sabe que é uma boa ação, até um gesto de caridade, mas ninguém se aventura a ser tão sincero.
Nas reuniões, sua perfeita concordância com as opiniões do chefe é tão automática e previsível que não choca mais ninguém. Mas aí acontece um imprevisto: o baba-ovo é surpreendido por uma inesperada promoção e passa a ser sub-chefe de qualquer coisa. Consequentemente ele terá, se não um arsenal, pelo menos um neo baba-ovo mais do que disposto a lamber-lhe as polainas. A pergunta é: será que ele, alçado agora ao posto de “adulável”, vai perceber?
• Marcelo Sguassábia é redator publicitário. Blogs: www.consoantesreticentes.blogspot.com (Crônicas e Contos) www.letraeme.blogspot.com (portfólio)
Como comentei no Facebook, é desumano não me tornar publicamente uma puxa-sacos. Bajular, bem, é natural que seja assim.Divirto-me com as suas ideias. Coisas de publicitário.
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