sábado, 17 de abril de 2010


George Orwell já dizia

* Por Urda Alice Klueger

(Escrito em 2004)

Impingiram-me, lá na infância, que a grande democracia do mundo estava situada no Hemisfério Norte e chamava-se Estados Unidos. Para tanto havia a Igreja, o gloriosos Exército Brasileiro e otras cositas más, como uma revistinha chamada Seleções, que vinha todos os meses e que nós adorávamos, e que nos contava, mensalmente sobre o maravilhoso país com o qual era certo sonhar, o glorioso país que nos defendia de uma praga que ninguém sabia o que era, chamada Comunismo. Havia outras revistinhas extremamente capitalistas que também inundavam o nosso meio infantil, chamadas Pato Donald e Tio Patinhas, onde patinhos com caras inocentes faziam sacanagens bem capitalistas mesmo aos seus parentes – enfim, fizeram a nossa cabeça para acharmos os Estados Unidos o máximo! Só que a gente vai vivendo, aprendendo coisas, vendo coisas, e chega um dia em que já é mais difícil que nos enganem. Quando li o livro “1984”, de George Orwell, já estava bem crescidinha e já se tornava bastante difícil acreditar piamente no poder das ditaduras, pois penso que George Orwell escreveu seu livro pensando em Stálin, mas o que aconteceu é que o Grande Irmão do Norte pode ser qualquer ditadura poderosa, e serve tão bem a qualquer povo que acabou gerando um escabroso programa de televisão que o povo adora, onde se prendem algumas pessoas num lugar sem nenhuma liberdade dia e noite e espera-se que um coma o outro por uma perna até que tenha vencido todos, a fim de ganhar um bocado de dinheiro. Grande Irmão e Big Brother querem dizer exatamente a mesma coisa – não sei se vocês já se tocaram para tal.

E então temos, hoje, o Big Irmão do Norte aqui mesmo na parte norte da América, em plena ditadura, sem nada daquela democracia redentora que nos impingiram na infância, e você deve estar dizendo: “A Urda endoidou? COMO que os Estados Unidos não é a grande, a maior, a mais poderosa democracia do mundo?”

Vamos ver isto mais de perto, meu amigo. Democracia talvez tivesse sido lá em outros tempos – um povo que é governado por um louco como Bush II, que sequer foi eleito naquela eleição que fez todos nós rirmos, devido ao atraso da eleição deles perto das nossas maquininhas chamadas urnas eletrônicas, já de cara não é um povo que tenha uma democracia. Qualquer um pode ir lá e assumir o poder do país de forma ditatorial, que eles aceitam, e o ditador que assumir pode mentir, criar guerras, invadir outros países (entre outras coisas, para dar emprego à rapaziada que lá está desempregada), que, como vaquinhas de presépio acostumadas dentro de ditaduras, a maioria da gente lá deles aceita tudo – e então a rapaziada desempregada vai para uma guerra que sequer sabe onde fica, e acaba morta, degolada, queimada, arrastada pelas ruas e pendurada nos contrafortes de uma ponte por uma indignada multidão de país invadido, como a nossa televisão nos mostrou outro dia, que as gentes que vivem lá na ditadura nem ficam sabendo. Sabem por que? Porque numa ditadura se escondem os fatos, e “não fica bem” gente que vive dentro de uma ditadura ficar sabendo das verdades, bem como a gente pode ler no livro “1984”, onde é tão forte o Grande Irmão do Norte, ou Big Brother, como queiram.

Então lhes conto: vocês pensam que a população estadunidense sabe que seus rapazes estão morrendo em atentados no Iraque, que estão sendo linchados, etc.? Não, não sabem. A censura própria das ditaduras impede que tais notícias circulem na imprensa daquele país, pois o IBOPE do tal presidente louco pode baixar. Pais recebem sacos plásticos com filhos destroçados dentro, tratam de sepultá-los logo, e no jornal sai uma notinha de falecimento, apenas como se ele tivesse batido o carro numa bebedeira. Se os amigos se queimarem com a perda do rapaz e quiserem fazer uma demonstração pública da sua dor, estão proibidos, e se fizerem, a imprensa nada noticia. E imagens de massacres, como vimos aqui faz pouco mais de uma semana? Nem pensar – editam-se as imagens, quem sabe mostrem tanques queimando, mas jamais dirão que há jovens corpos estadunidenses lá dentro.

Democracia, heim? Nem o pessoal que gosta do Big Brother conseguiria acreditar!

* Escritora de Blumenau/SC

Um comentário:

  1. A censura é um câncer. Ocultar a verdade e manipular dados é fato mais corriqueiro nas democracias do que podemos imaginar.

    ResponderExcluir