Escritores centenários
Caríssimos leitores, boa tarde.
Entre sábado passado e ontem morreram dois escritores consagrados, com obras consolidadas, louvados e homenageados, com toda a justiça, mundo afora, pela força do seu talento e magia do seu texto.
No dia 31 de outubro, sábado, faleceu o antropólogo, etnólogo e filósofo belga Claude Lévi-Strauss, sobre o qual comentarei bastante nos próximos dias, dada não apenas sua relevância, mas, sobretudo, por causa de seus vínculos com o Brasil, onde morou por bom período, tendo lecionado na Universidade de São Paulo.
O outro escritor que nos deixou foi o espanhol Francisco Ayala, falecido ontem, nem tanto conhecido entre nós, mas reverenciado não somente na Espanha, sua terra natal, mas também na Argentina, onde se exilou no início da Guerra Civil espanhola (1936-1939) e lá permaneceu até 1950.
Uma característica especial liga essas duas mortes. Ambos morreram com mais de cem anos de idade. Lévi-Stauss iria completar 101 anos no dia 28 deste mês. Ayala faria 104 em janeiro de 2010. Os dois, portanto, já deram ao mundo o que tinham para dar e colhiam, agora, o justo fruto do seu talento e trabalho (diria genialidade). Ambos entram para o panteão dos “imortais”.
Uma pergunta, porém, se impõe: quantos anos um escritor precisa viver para produzir uma obra consistente, valiosa e consolidá-la? Não há limites. Um sujeito pode viver pouco e ainda assim produzir muito, e bem.
Exemplos? Há inúmeros por aí. Mas aceito o desafio e aponto alguns. Um deles foi Guy de Maupassant, um dos maiores escritores de todos os tempos, que morreu com apenas 43 anos de idade. Quanto poderia produzir a mais se vivesse, digamos, pelo menos até os 65? Talvez muito, talvez nada.
Querem outro exemplo? O de Charles Baudelaire. É impossível contestar a qualidade da sua obra. Escreveu muito e bem. Viveu, no entanto, apenas 46 anos, deixando-nos a impressão de que, se vivesse mais, sua produção seria multiplicada e proporcional aos anos a mais que vivesse. Alguém, contudo, tem certeza que isso aconteceria? Claro que não!
Mais um? Honoré de Balzac. .Só a sua “A comédia humana” reúne 88 obras em que mostra profundo senso de observação e arguto conhecimento da natureza deste estranho animal que somos nós. Uma produção dessas exigiu pelo menos 60 anos, pensarão os desavisados. Engano. Balzac morreu com apenas 51 anos de idade.
Por falar em precocidade produtiva e pouquíssimo tempo de vida, o que dizer, por exemplo, de um Álvares de Azevedo, que morreu antes de completar 21 anos? No entanto, nos encanta, homens e mulheres de pedra do século XXI, com a magia dos seus versos, em que compensa a falta de experiência e de maturidade, que só se obtém com muitos anos de vida, com uma sensibilidade raríssima até mesmo em poetas. O que aconteceria se vivesse, digamos, até os 65 anos? Talvez muito, talvez nada. Jamais iremos saber.
O mesmo se pode dizer de Antonio Castro Alves. O genial poeta baiano legou-nos uma obra rica e consistente. Foi, sobretudo, emérito abolicionista colocando, portanto, seu talento a serviço de nobilíssima causa. Todavia, a exemplo de Álvares de Azevedo, viveu pouco, pouquíssimo. Morreu com 24 anos de idade. Repito a mesma pergunta que fiz em relação aos exemplos anteriores: o que aconteceria se vivesse pelo menos até os 65 anos? E dou, óbvio, igual resposta: talvez muito, talvez nada.
Francisco Ayala aproveitou bem os muitos anos que viveu. Legou à posteridade uma obra vasta, consistente e de alta qualidade. Tanto que, ao morrer, era considerado um dos maiores intelectuais da Espanha (para onde regressou em 1960, após uma passagem de dez anos nos Estados Unidos tão logo deixou a Argentina) do século XX.
Conquistou, ao longo de vitoriosa carreira, os principais prêmios literários do seu país, como o Cervantes e o Príncipe das Astúrias. Chegou a ser cogitado para o Prêmio Nobel, embora nunca tivesse a candidatura lançada para essa grande honraria literária.
Seus livros não são lá muito conhecidos no Brasil, ao contrário do que ocorre em relação à Argentina e, logicamente, ao seu país de origem. Destacam-se “El boxeador y um angel”, Historia de la libertad”, “Muertes de perro”, “Historia de macacos”, “Gloriosos triunfos del principe Arjuna” e “Cervantes y Quevedo”.
Nos próximos dias, prometo abordar a obra, a trajetória e a importância de Lévi-Strauss.
Boa leitura.
O Editor.
Caríssimos leitores, boa tarde.
Entre sábado passado e ontem morreram dois escritores consagrados, com obras consolidadas, louvados e homenageados, com toda a justiça, mundo afora, pela força do seu talento e magia do seu texto.
No dia 31 de outubro, sábado, faleceu o antropólogo, etnólogo e filósofo belga Claude Lévi-Strauss, sobre o qual comentarei bastante nos próximos dias, dada não apenas sua relevância, mas, sobretudo, por causa de seus vínculos com o Brasil, onde morou por bom período, tendo lecionado na Universidade de São Paulo.
O outro escritor que nos deixou foi o espanhol Francisco Ayala, falecido ontem, nem tanto conhecido entre nós, mas reverenciado não somente na Espanha, sua terra natal, mas também na Argentina, onde se exilou no início da Guerra Civil espanhola (1936-1939) e lá permaneceu até 1950.
Uma característica especial liga essas duas mortes. Ambos morreram com mais de cem anos de idade. Lévi-Stauss iria completar 101 anos no dia 28 deste mês. Ayala faria 104 em janeiro de 2010. Os dois, portanto, já deram ao mundo o que tinham para dar e colhiam, agora, o justo fruto do seu talento e trabalho (diria genialidade). Ambos entram para o panteão dos “imortais”.
Uma pergunta, porém, se impõe: quantos anos um escritor precisa viver para produzir uma obra consistente, valiosa e consolidá-la? Não há limites. Um sujeito pode viver pouco e ainda assim produzir muito, e bem.
Exemplos? Há inúmeros por aí. Mas aceito o desafio e aponto alguns. Um deles foi Guy de Maupassant, um dos maiores escritores de todos os tempos, que morreu com apenas 43 anos de idade. Quanto poderia produzir a mais se vivesse, digamos, pelo menos até os 65? Talvez muito, talvez nada.
Querem outro exemplo? O de Charles Baudelaire. É impossível contestar a qualidade da sua obra. Escreveu muito e bem. Viveu, no entanto, apenas 46 anos, deixando-nos a impressão de que, se vivesse mais, sua produção seria multiplicada e proporcional aos anos a mais que vivesse. Alguém, contudo, tem certeza que isso aconteceria? Claro que não!
Mais um? Honoré de Balzac. .Só a sua “A comédia humana” reúne 88 obras em que mostra profundo senso de observação e arguto conhecimento da natureza deste estranho animal que somos nós. Uma produção dessas exigiu pelo menos 60 anos, pensarão os desavisados. Engano. Balzac morreu com apenas 51 anos de idade.
Por falar em precocidade produtiva e pouquíssimo tempo de vida, o que dizer, por exemplo, de um Álvares de Azevedo, que morreu antes de completar 21 anos? No entanto, nos encanta, homens e mulheres de pedra do século XXI, com a magia dos seus versos, em que compensa a falta de experiência e de maturidade, que só se obtém com muitos anos de vida, com uma sensibilidade raríssima até mesmo em poetas. O que aconteceria se vivesse, digamos, até os 65 anos? Talvez muito, talvez nada. Jamais iremos saber.
O mesmo se pode dizer de Antonio Castro Alves. O genial poeta baiano legou-nos uma obra rica e consistente. Foi, sobretudo, emérito abolicionista colocando, portanto, seu talento a serviço de nobilíssima causa. Todavia, a exemplo de Álvares de Azevedo, viveu pouco, pouquíssimo. Morreu com 24 anos de idade. Repito a mesma pergunta que fiz em relação aos exemplos anteriores: o que aconteceria se vivesse pelo menos até os 65 anos? E dou, óbvio, igual resposta: talvez muito, talvez nada.
Francisco Ayala aproveitou bem os muitos anos que viveu. Legou à posteridade uma obra vasta, consistente e de alta qualidade. Tanto que, ao morrer, era considerado um dos maiores intelectuais da Espanha (para onde regressou em 1960, após uma passagem de dez anos nos Estados Unidos tão logo deixou a Argentina) do século XX.
Conquistou, ao longo de vitoriosa carreira, os principais prêmios literários do seu país, como o Cervantes e o Príncipe das Astúrias. Chegou a ser cogitado para o Prêmio Nobel, embora nunca tivesse a candidatura lançada para essa grande honraria literária.
Seus livros não são lá muito conhecidos no Brasil, ao contrário do que ocorre em relação à Argentina e, logicamente, ao seu país de origem. Destacam-se “El boxeador y um angel”, Historia de la libertad”, “Muertes de perro”, “Historia de macacos”, “Gloriosos triunfos del principe Arjuna” e “Cervantes y Quevedo”.
Nos próximos dias, prometo abordar a obra, a trajetória e a importância de Lévi-Strauss.
Boa leitura.
O Editor.
Justas e oportunas as considerações sobre os centenários Ayala e Lévi-Strauss, e também sobre os precoces e geniais Balzac, Castro Alves e Baudelaire. Acrescento `a lista o inquieto Rimbaud, outro artista que partiu cedo - aos 37 anos, mas deixou poemas cada vez mais reverenciadas por leitores de todas as gerações.
ResponderExcluirDesconfio cá com os meus botões que o organismo sabe quando morrerá, quanto tempo terá para funcionar. Daí, os precoces que em apenas três décadas ou até menos deixam uma obra eterna, enquanto outros vão criando conforme bem lhes apraz. Ah, que escrevam todos. Deus gosta disso.
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