quinta-feira, 15 de janeiro de 2015

Que tal um cafezinho?

* Por Donald Malchitzky


Cercada de reportagens sobre as tristezas da humanidade - milhões de crianças famintas no Iêmen, conflitos religiosos na Índia, viciados em heroína em Cabul que viraram atração turística – uma notícia de Nápoles, na Itália dá um alento de civilidade, de sopro de esperança pela solidariedade: fala do “café suspenso”.

Não é tão novidade assim, mas uma revitalização de um costume surgido na cidade durante a Segunda Guerra Mundial, em que a carência deu origem a um ato de solidariedade anônima: ao tomar um café na cafeteria – “Uma desculpa para bater papo e contar histórias”, segundo um frequentador atual – a pessoa que tivesse condições deixava outro pago para quem não tivesse como pagá-lo. Em tempos bicudos para a economia italiana, o costume voltou.

Divulgada boca a boca, possivelmente em muitos intervalos para cafezinho,  e pela Internet, a ideia passou a ser usada em várias partes do mundo, inclusive no Brasil, e não só para café, mas também para pizzas, sanduíches e até livros.

Em tempos de egoísmo glorificado como chave do sucesso – ao menos esse é o resumo de muitos livros de formação de executivos – ações simples assim parecem fadadas ao fracasso, mas esta funcionou. Parece que o segredo está justamente na simplicidade em tocar o coração de quem tem um pouco para compartilhar. Talvez o próprio anonimato, uma vez que quem recebe nunca saberá quem foi o doador, também seja um fator decisivo, pois todos estamos cansados da caridade de sorrisos forçados para aparecer em fotografias que pululam na mídia. Nesse contexto, um suspiro de caridade desinteressada ajuda a desopilar a alma e o cérebro.

Pizzas distribuídas aos pobres, livros à disposição de leitores ávidos e sem dinheiro, sanduíches para quem está com fome ou simplesmente com vontade de comer com prazer, um cafezinho em bom ambiente, com direito a encostar-se ao balcão, puxar conversa ou ficar por ali, ouvindo os papos mais diversos e as teorias de salvação do mundo, pois é nesses ambientes que elas florescem, tudo ao alcance, dependendo apenas de um pedido, pois o principal já foi feito: resgatar as centelhas de bondade que ainda carregamos dentro de nós, apesar de tudo.

Vai um cafezinho?


* Escritor

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