De volta à vida
*Por
Evelyne Furtado
Naquele dia Clarice
acordou e não viu nenhum motivo para sair da cama. Nada a empolgava. Não havia
nenhum compromisso que valesse à pena. Nenhum programa bom a fazer. Nem mesmo
um livro bom a tiraria daquele torpor. Parecia a Clarice que nenhum dos seus sonhos
havia sobrevivido à realidade chata que a rodeava.
Será que nunca mais
teria uma daquelas conversas instigantes que a faziam vibrar? Será que não
haveria um lugar no mundo que a fizesse programar uma viagem para conhecer?
Clarice pensou nas pessoas que conhecia e de quem gostava. Não queria deixar de
vê-las, mas não agora. Deixaria para depois.
Pensou se ainda
conheceria alguém interessante, que trouxesse alegria a sua vida e duvidou.
Relembrou de músicas que tocaram seu coração e até cantarolou, porém não passou
disso. Apenas avivou sua memória afetiva, com os momentos intensos, ternos e
românticos.
Clarice chegou a sorrir
ao lembrar dos abraços, beijos e carícias trocados, no entanto também sentiu
vontade de chorar. E foi aí que ela percebeu que estava trancando seus
sentimentos para não se decepcionar. Eliminando expectativas ela não se
frustraria, mas também não viveria com ardor.
E Clarice chorou todas
as decepções e mágoas. Um pranto sentido e soluçado. Um pranto que a deixou com
os olhos inchados, mas alforriou toda tristeza do seu peito. Lúcida, se deu
conta que havia muito tempo que vivia assim: sobrevivendo, pisando no freio da
imaginação e recalcando os desejos.
Havia motivo para
levantar da cama. Estava viva e com um apetite louco. Mataria o primeiro desejo
no café da manhã. Depois decidiria o que fazer. Tinha sonhos antigos e alguns
fresquinhos para usufruir.
*
Poetisa e cronista de Natal/RN
Ao acordar, momento sublime, é tempo de fazer um rápido balanço, decidir-se e correr para a vida. Mais um dia a espera.
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