Shakespeare and Co: uma experiência para leitores e
escritores
* Por
Sally Satler
Existem mais de mil de
livrarias em Paris, mas entrar na Shakespeare and Company e subir suas
estreitas escadas de acesso ao segundo piso, remete-nos a uma breve viagem à
Paris literária dos anos 20 e 30, com atmosfera própria, quando os escritores
da “geração perdida”, como James Joyce, Scott Fitzgerald e Ernest Hemingway,
passaram alguns anos na cidade em busca de inspiração para aqueles que se tornariam
seus mais famosos livros.
Shakespeare and Company
foi aberta em 1919, funcionou primeiro numa ruela da Rive Gauche e dois anos
depois foi para a rue de l´Ódeon, onde permaneceu até 1940, quando fechou
devido à ocupação alemã da França, na segunda guerra mundial. Idealizada pela
livreira, editora e escritora Sylvia Beach[1], a livraria conseguiu se tornar
um espaço para escritores que não tinham onde pernoitar, mas podiam ajudar com
pequenos serviços por algumas semanas, além do compromisso de ler uma obra por
dia.
Muitos aspirantes a
escritor tornaram a livraria sua morada e experiência literária; Ernest
Hemingway narra em ‘Paris é uma Festa’ a maravilha que eram suas visitas à
livraria e a gentileza e generosidade da dona em emprestar o que ele quisesse
ler, mesmo quando não tinha dinheiro para alugar ou comprar os livros. Foi
também com o selo desta livraria que James Joyce conseguiu publicar Ulysses,
numa época em que todas as editoras o rejeitaram.
Com o falecimento de
Sylvia, em 1951, foi George Whitman que decidiu retomar o projeto: incorporou
os livros da antiga livraria e rebatizou sua loja para Shakespeare and Company,
na rue de la Bucherie, próximo à Notre Dame, na margem esquerda do Sena. Virou
ponto de encontro de escritores como Samuel Beckett, Anais Nïn, Arthur Miller,
etc. Da geração Beat, recebeu Allen Ginsberg e Jack Kerouac. Atualmente, a
responsável pelo espaço é Sylvia Beach Whitman, filha de George, quando ele
faleceu em 2011.
Shakespeare & Co
não é qualquer livraria, reúne amantes dos livros e suas histórias; andar por
entre suas estantes nos faz esbarrar em outros leitores distraídos, que nos
devolvem um olhar cúmplice, de quem guarda, nem tão em segredo, essa paixão
pelos livros. O local transmite uma sensação de nostalgia, e, por alguns
minutos, parece nos transpor aos anos 20. Entrar nesta livraria é uma
experiência deliciosa: em meio às paredes cobertas de livros, amontoados também
em estantes e outros suportes, permanecem as mesas com máquinas de escrever e
as camas para abrigar novos escritores por algumas semanas, em troca de um
pouco de trabalho no caixa ou algumas horas de faxina, além do comprometimento
de ler um livro por dia[2].
Em todos esses anos,
mais de 40 mil pessoas de todos os cantos do mundo toparam a experiência. E
você, toparia? Estava me perguntando isso quando um livro caiu sobre a minha
cabeça enquanto descia as escadas, olhei para cima e vi apenas uma fileira de
livros bem dispostos sobre uma prateleira. Seria algum dos antigos escritores
me convidando a dividir sua experiência?
Ah, esse mundo
literário!
[1]
Sobre Sylvia Beach, indicamos a sua autobiografia: “Shakespeare and Company”
(Casa da Palavra, 2004).
[2]
“Um livro por dia” é o título do livro de Jeremy Mercer (Casa da Palavra,
2007), jornalista que escreveu sobre suas experiências ao morar na livraria,
repetindo a vivência de tantos outros escritores que passaram por ali.
*
Escritora e historiadora
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