quarta-feira, 17 de março de 2010




Cento e oitenta graus

* Por Sayonara Lino

Olhou para o relógio, o dia passou e não rendeu, ela não conseguiu fazer nada do que havia planejado. Gostaria de ter caminhado meia hora na esteira, estudado português, inglês e mandarim por quatro horas ininterruptas, ter ido à feira e comprado girassóis e pimenta do reino, ter continuado a tecer aquele cachecol amarelo, azul e vermelho.

Olhem para ela, está descabelada , comendo um bauru com suco de graviola, amarrou o cabelo em um coque para disfarçar aqueles fios brancos que teimam em aparecer, calçou o sapato de sua mãe pois a porta do armário está emperrada e não conseguiu resgatar um par de chinelos sequer.

O telefone tocou, correu para atender pensando ser o namorado e era uma senhora perguntando se ali era a clínica do Dr. Mariano, agora foi para o banheiro escovar os dentes e a pia está entupida. “Caspita”, resmunga a descendente de italiano, alemão e português. “Hoje não é meu dia, devia ter ficado deitada”.

Devia sim, mas levantou porque não suportava o batuque estridente da obra que a vizinha do 501 resolveu fazer em um apartamento perfeito, novinho em folha. “Com tanta gente sem teto, casas sendo arrastadas pelas chuvas, essa dona vem e quebra tudo”, pensava, enquanto procurava a coleira da cachorrinha temperamental pela casa, que a essa altura estava bem acomodada debaixo dos lençóis limpíssimos, recém saídos do varal.

Saiu sem o cachorro, com a primeira roupa que viu no cabideiro, com o sapato um número menor que seu pé, sem a cadela , com farelos nos dentes, e riu de si mesma, e do quanto a vida pode ser imprevisível e engraçada, uma vida de ponta cabeça, estilo l80 graus.

* Jornalista, com especialização em Estudos Literários pela Universidade Federal de Juiz de Fora e atualmente finaliza nova especialização em Televisão, Cinema e Mídias Digitais, pela mesma instituição. Colunista do portal www.ubaweb.com/revista.

8 comentários:

  1. Nem me fale...
    Já saí na rua com a blusa do avesso.
    Sapatos trocados.
    Estava brincando com a maquiagem nova e fui
    na rua, detalhe minha irmã não falou nada, estava igual a uma bruxa.
    Brincando com meu filho quando era um bebezão, eu amarrei dois balões de hélio no meu cabelo, e saí com eles por aí...
    Chega né?
    Te garanto que fiz muita gente rir!
    Dá para ser feliz nessa vida? Dá sim!
    beijos

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  2. rsss Eu também já saí do avesso alumas vezes, principalmente quando ia para o trabalho correndo, com pressa pela manhã! Beijão, Nubia!

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  3. Um dia errado( houve um tempo que chamavam um dia assim de "aziago"), que rendeu uma crônica gostosa e real. Nem só de coisas extraordinárias vivemos nós.

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  4. Várias vezes saí com a roupa pelo avesso e quando me avisavam na rua, quase morria de vergonha, mas o pior foi ir dar aula na maior escola da cidade e de repente olhar os pés e ver que tinha saído com sapatos absolutamente diferentes. Fazer o quê???
    Crônica maravilhosa!
    Beijos

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  5. Obrigada Mara e Risomar pelo comentário! Beijos!

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  6. Melhor coisa é quando conseguimos rir de nós mesmos. Humor é tudo, ou , quase tudo.
    Gostei, Sayonara

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  7. Verdade, Cel, humor é fundamental! Super beijo!

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