Vivos na lembrança
Prezado e fiel leitor, boa tarde.
Hoje é o dia de reverenciar nossos mortos. Isto, do ponto de vista social, para demonstrar à sociedade que não esquecemos nossos entes queridos que se foram para o além.
Na verdade, se os amamos de fato, eles nunca morrem. Permanecem vivos, enquanto vivermos, em nossas lembranças. Não precisamos levar-lhes flores, acender-lhes velas e nem mandar rezar missas para reverenciá-los condignamente. E muito menos fazer tudo isso em algum dia específico. Se o fazemos, embora nunca admitamos e nos irritemos quando alguém faz esse tipo de observação, tudo é feito para “consumo externo”. Ou seja, para outros verem.
O que conta é como os lembramos. Por isso, detesto hospitais, velórios, enterros e cemitérios. Sempre que posso, evito-os. Quero lembrar-me das pessoas que amo no seu auge, em todo o seu esplendor, alegres, dinâmicas, produtivas e vivas. Entendo que é a melhor homenagem que lhes posso prestar. Não condeno, todavia, os que participam desse ritual anual de Finados. Quem sou eu para condenar quem quer que seja?
Detesto temas mórbidos, que impliquem em sofrimento, dor e morte. Fiz um pacto com a vida e com a beleza e só tenho compromisso com ambas. É assim que quero ser lembrado: vivo, mesmo que contraditório, briguento e atrevido. Sou assim e ponto.
É verdade que a morte divide espaço com a vida como tema de literatura. Desconfio que seja, até, mais citada e enfatizada. É uma tentativa do escritor de exorcizar o que teme. E duvido que tema qualquer coisa mais do que o seu fim. Esse momento fatal, por mais que se conte com a presença dos que amamos ao nosso redor, é solitário, sumamente e absolutamente solitário.
A propósito, lembro-me de palavras a respeito do poeta espanhol Miguel de Unamuno, em que ele afirma: “Nós, homens, vivemos juntos, mas cada um morre só e a morte é a suprema solidão”. Existe, porventura, outra que a supere? Qual?
Você quer reverenciar os que morreram, mesmo que não sejam íntimos seus, que você sequer conheça pessoalmente, mas que admire pelo que foram e fizeram? Simples, fale deles. Lembre seus feitos. Exalte sua conduta. Mantenha-os vivos na memória. Porquanto Machado de Assis constatou a propósito: “O louvor dos mortos é um modo de orar por eles”. Essa é, no meu entender, a reverência que conta. E não precisa ser, reitero, em dia específico, como o de Finados, mas em qualquer ocasião do ano, todos os anos da sua vida.
Apesar da minha postura, explicitada acima, não me omitirei, neste 2 de novembro de 2009, de cumprir meu ritual público em memória dos que se foram. E como este espaço é de Literatura, trago dois poemas alusivos à data. Um é da excelente poetisa Dalila Teles Veras, e está publicado em seu livro “Vestígios”.
Solidões
Dizias-me;
-não quero
mas qualquer dia
terei que partir
Intuías
a proximidade
a solidão da viagem
a dispensa de acompanhante
Temias
do parto, sabias
(contavas)
da morte, mistério
(calavas)
parto e morte
(solidões assemelhadas)
origem, ambos
O segundo poema é de Manuel Bandeira, citado por mundo e fundo nesta ocasião e, por isso, também me reservo o direito de reproduzi-lo.
Poema de Finados
Amanhã que é dia dos mortos
vai ao cemitério. Vai
e procura, entre as sepulturas
a sepultura de meu pai.
Leva três rosas bem bonitas,
ajoelha e reza uma oração.
Não pelo pai, mas pelo filho,
o filho tem mais precisão.
O que resta de mim na vida
é a amargura do que sofri,
pois nada quero, nada espero
e em verdade estou morto ali.
Da minha parte, faço minhas as palavras do querido poeta de Itabira (quanta saudade, mestre!), Carlos Drummond de Andrade, a quem tive a honra e o privilégio de conhecer pessoalmente, quando declarou, espontaneamente, num poema: “Do lado esquerdo carrego meus mortos. Por isso caminho um pouco de banda”. Eu também!
Boa leitura
O Editor.
Prezado e fiel leitor, boa tarde.
Hoje é o dia de reverenciar nossos mortos. Isto, do ponto de vista social, para demonstrar à sociedade que não esquecemos nossos entes queridos que se foram para o além.
Na verdade, se os amamos de fato, eles nunca morrem. Permanecem vivos, enquanto vivermos, em nossas lembranças. Não precisamos levar-lhes flores, acender-lhes velas e nem mandar rezar missas para reverenciá-los condignamente. E muito menos fazer tudo isso em algum dia específico. Se o fazemos, embora nunca admitamos e nos irritemos quando alguém faz esse tipo de observação, tudo é feito para “consumo externo”. Ou seja, para outros verem.
O que conta é como os lembramos. Por isso, detesto hospitais, velórios, enterros e cemitérios. Sempre que posso, evito-os. Quero lembrar-me das pessoas que amo no seu auge, em todo o seu esplendor, alegres, dinâmicas, produtivas e vivas. Entendo que é a melhor homenagem que lhes posso prestar. Não condeno, todavia, os que participam desse ritual anual de Finados. Quem sou eu para condenar quem quer que seja?
Detesto temas mórbidos, que impliquem em sofrimento, dor e morte. Fiz um pacto com a vida e com a beleza e só tenho compromisso com ambas. É assim que quero ser lembrado: vivo, mesmo que contraditório, briguento e atrevido. Sou assim e ponto.
É verdade que a morte divide espaço com a vida como tema de literatura. Desconfio que seja, até, mais citada e enfatizada. É uma tentativa do escritor de exorcizar o que teme. E duvido que tema qualquer coisa mais do que o seu fim. Esse momento fatal, por mais que se conte com a presença dos que amamos ao nosso redor, é solitário, sumamente e absolutamente solitário.
A propósito, lembro-me de palavras a respeito do poeta espanhol Miguel de Unamuno, em que ele afirma: “Nós, homens, vivemos juntos, mas cada um morre só e a morte é a suprema solidão”. Existe, porventura, outra que a supere? Qual?
Você quer reverenciar os que morreram, mesmo que não sejam íntimos seus, que você sequer conheça pessoalmente, mas que admire pelo que foram e fizeram? Simples, fale deles. Lembre seus feitos. Exalte sua conduta. Mantenha-os vivos na memória. Porquanto Machado de Assis constatou a propósito: “O louvor dos mortos é um modo de orar por eles”. Essa é, no meu entender, a reverência que conta. E não precisa ser, reitero, em dia específico, como o de Finados, mas em qualquer ocasião do ano, todos os anos da sua vida.
Apesar da minha postura, explicitada acima, não me omitirei, neste 2 de novembro de 2009, de cumprir meu ritual público em memória dos que se foram. E como este espaço é de Literatura, trago dois poemas alusivos à data. Um é da excelente poetisa Dalila Teles Veras, e está publicado em seu livro “Vestígios”.
Solidões
Dizias-me;
-não quero
mas qualquer dia
terei que partir
Intuías
a proximidade
a solidão da viagem
a dispensa de acompanhante
Temias
do parto, sabias
(contavas)
da morte, mistério
(calavas)
parto e morte
(solidões assemelhadas)
origem, ambos
O segundo poema é de Manuel Bandeira, citado por mundo e fundo nesta ocasião e, por isso, também me reservo o direito de reproduzi-lo.
Poema de Finados
Amanhã que é dia dos mortos
vai ao cemitério. Vai
e procura, entre as sepulturas
a sepultura de meu pai.
Leva três rosas bem bonitas,
ajoelha e reza uma oração.
Não pelo pai, mas pelo filho,
o filho tem mais precisão.
O que resta de mim na vida
é a amargura do que sofri,
pois nada quero, nada espero
e em verdade estou morto ali.
Da minha parte, faço minhas as palavras do querido poeta de Itabira (quanta saudade, mestre!), Carlos Drummond de Andrade, a quem tive a honra e o privilégio de conhecer pessoalmente, quando declarou, espontaneamente, num poema: “Do lado esquerdo carrego meus mortos. Por isso caminho um pouco de banda”. Eu também!
Boa leitura
O Editor.
Nenhum comentário:
Postar um comentário