Quero ser mais ou menos
* Por Fernando Yanmar Narciso
Você chega em casa cansado, com dores nos ombros e nas costas? Você está flácido, acima do peso ou talvez morbidamente obeso? Você é calvo, careca ou está começando a perder os cabelos? Seu rosto é cheio de espinhas e marcas da idade? Seus dentes foram maltratados por anos de cigarro, café e por tanto roer pequi? Seu cachorro faz cocô na casa inteira, até no teto? Você não consegue dormir direito? Está só, triste, deprimido? Seu time perdeu? A meia-calça desfiou? Furou o pneu? Brigou com o namorado? Oh, não! Seu carro riscou?
Só mais uma perguntinha: QUAL O PROBLEMA EM TUDO ISSO? Afinal, você é apenas humano!
Quantas vezes vocês já viram esse tipo de propaganda na TV? Primeiro entra aquela musiquinha de cena de morte em filme da série Desejo de Matar, depois entra um homem ou mulher com cara de enterro de mãe, com as imagens devidamente em preto-e-branco, para sugerir uma vida horrível. Aí, entra em cena o narrador citando um dos problemas acima. De repente, a propaganda fica a cores, entra uma música estilo “encerramento do Esporte Espetacular” e todos começam a sorrir, porque compraram o produto que o narrador chato está anunciando. São comerciais utópicos que tentam nos ditar normas sobre o que precisamos ter ou nos parecer para sermos felizes. Em qualquer publicação, comercial ou programa só aparecem rostos jovens, bonitos e perfeitos, pois segundo os publicitários do século XXI, juventude vende mais que qualidade e confiança no produto. Basta ver cartazes e comerciais de cerveja por aí. Todos juveníssimos e sorrindo. Sorrindo... Por que essa gente sorri tanto? Parecem mais com aquela clássica máscara teatral do que com seres humanos.
Difícil de acreditar, mas nos primórdios de Hollywood e da música popular, juventude não era pré-requisito para se ter sucesso. Sinatra e Bing Crosby tornaram-se ídolos das adolescentes quando já chegavam aos seus 40 anos, o mesmo valendo para os galãs da velha guarda como Clark Gable e Humphrey Bogart. E todas as mocinhas dos filmes eram no mínimo uns 20 ou 30 anos mais novas que o herói, talvez por isso os homens quando chegam a uma certa idade sentem necessidade de se cercarem com mulheres bem mais jovens que eles. Steve McQueen era conhecido como “King of cool” nos anos 60 quando já se aproximava dos 40, assim como Clint Eastwood. Comparados aos outros cowboys, os dois eram quase adolescentes. Até meados dos anos 80 ainda não havia muitos adolescentes reais em filmes e séries. Quer dizer, todo o elenco “teen” de Barrados no baile era composto de trintões cheios de pés-de-galinha. No clássico Curtindo a vida adoidado, Matthew Broderick tinha seus 27 anos e interpretava um adolescente de 15 ou 16, e o melhor amigo dele já tinha 30 anos na vida real.. Mesmo fora de Hollywood isso ocorre. Ou você vai dizer que acreditava que todo o elenco infantil de Carrossel era de menores de idade?
Foram Elvis e James Dean os primeiros a trazer rostos joviais e cheios de vida para o topo das paradas. A princípio ninguém colocava fé nas capacidades de atuação de alguém com menos de 20 anos. Foi nos anos 80 que eles começaram a entrar cada vez mais nos elencos das produções e a ditar os estilos musicais da moda. E a coisa foi tão “feia” que agora todo mundo quer ser adolescente e virginal para sempre. Aparentemente o velho dito “envelhecer com dignidade” foi riscado do vocabulário moderno.
Creio ter sido essa a principal herança da era Bush. O mundo tornou-se hiperbólico. Todo mundo precisa ser sempre o melhor, o maior, o mais forte, o mais jovem, o mais rico, o mais bonito e o melhor sexualmente dotado se quiser ser alguém.
O que mais vemos hoje em dia é senhoras de idade abusando de plásticas, botox e do que o valha para padecerem eternamente com o mesmo rosto de quando tinham 21 anos – ou pelo menos tentar. Os exemplos perfeitos disso são as atrizes Demi Moore, Sharon Stone e Nicole Kidman. Se existissem espinhas naquela pele alva e impenetrável que deve ter custado milhares de dólares de martelo e cinzel pra ficar daquele jeito da Nicole, provavelmente sairia colágeno e botox se fossem espremidas. Nada contra essas atrizes, até já fiz muitas “auto-análises” com ajuda das fotos delas, mas não compreendo o problema que elas têm com o tempo. Algumas atrizes continuam sendo sensuais depois de certa idade, mesmo tendo feito poucas ou nenhuma cirurgia. Monique Evans que o diga.
Volto a repetir agora a pergunta que fiz no início do texto: Qual o problema em ser normal? Por que essa compulsão em perseguir padrões irrealizáveis de beleza? É tão triste assim aceitar ser o que é? Você tem uma espinhazinha minúscula no nariz, que só o telescópio Hubble conseguiria apontar com clareza? Por que não aprender a conviver com ela, em vez de comprar aquele grude embelezador caríssimo que aquela jovem te oferece na TV?
Pense nisso na próxima vez que pensar em mandar o número do cartão de crédito para a Polishop.
* Fernando Yanmar Narciso, 25 anos, formado em Design, filho de Mara Narciso, escritor do blog “O Blog do Yanmar”, http://fernandoyanmar.wordpress.com
* Por Fernando Yanmar Narciso
Você chega em casa cansado, com dores nos ombros e nas costas? Você está flácido, acima do peso ou talvez morbidamente obeso? Você é calvo, careca ou está começando a perder os cabelos? Seu rosto é cheio de espinhas e marcas da idade? Seus dentes foram maltratados por anos de cigarro, café e por tanto roer pequi? Seu cachorro faz cocô na casa inteira, até no teto? Você não consegue dormir direito? Está só, triste, deprimido? Seu time perdeu? A meia-calça desfiou? Furou o pneu? Brigou com o namorado? Oh, não! Seu carro riscou?
Só mais uma perguntinha: QUAL O PROBLEMA EM TUDO ISSO? Afinal, você é apenas humano!
Quantas vezes vocês já viram esse tipo de propaganda na TV? Primeiro entra aquela musiquinha de cena de morte em filme da série Desejo de Matar, depois entra um homem ou mulher com cara de enterro de mãe, com as imagens devidamente em preto-e-branco, para sugerir uma vida horrível. Aí, entra em cena o narrador citando um dos problemas acima. De repente, a propaganda fica a cores, entra uma música estilo “encerramento do Esporte Espetacular” e todos começam a sorrir, porque compraram o produto que o narrador chato está anunciando. São comerciais utópicos que tentam nos ditar normas sobre o que precisamos ter ou nos parecer para sermos felizes. Em qualquer publicação, comercial ou programa só aparecem rostos jovens, bonitos e perfeitos, pois segundo os publicitários do século XXI, juventude vende mais que qualidade e confiança no produto. Basta ver cartazes e comerciais de cerveja por aí. Todos juveníssimos e sorrindo. Sorrindo... Por que essa gente sorri tanto? Parecem mais com aquela clássica máscara teatral do que com seres humanos.
Difícil de acreditar, mas nos primórdios de Hollywood e da música popular, juventude não era pré-requisito para se ter sucesso. Sinatra e Bing Crosby tornaram-se ídolos das adolescentes quando já chegavam aos seus 40 anos, o mesmo valendo para os galãs da velha guarda como Clark Gable e Humphrey Bogart. E todas as mocinhas dos filmes eram no mínimo uns 20 ou 30 anos mais novas que o herói, talvez por isso os homens quando chegam a uma certa idade sentem necessidade de se cercarem com mulheres bem mais jovens que eles. Steve McQueen era conhecido como “King of cool” nos anos 60 quando já se aproximava dos 40, assim como Clint Eastwood. Comparados aos outros cowboys, os dois eram quase adolescentes. Até meados dos anos 80 ainda não havia muitos adolescentes reais em filmes e séries. Quer dizer, todo o elenco “teen” de Barrados no baile era composto de trintões cheios de pés-de-galinha. No clássico Curtindo a vida adoidado, Matthew Broderick tinha seus 27 anos e interpretava um adolescente de 15 ou 16, e o melhor amigo dele já tinha 30 anos na vida real.. Mesmo fora de Hollywood isso ocorre. Ou você vai dizer que acreditava que todo o elenco infantil de Carrossel era de menores de idade?
Foram Elvis e James Dean os primeiros a trazer rostos joviais e cheios de vida para o topo das paradas. A princípio ninguém colocava fé nas capacidades de atuação de alguém com menos de 20 anos. Foi nos anos 80 que eles começaram a entrar cada vez mais nos elencos das produções e a ditar os estilos musicais da moda. E a coisa foi tão “feia” que agora todo mundo quer ser adolescente e virginal para sempre. Aparentemente o velho dito “envelhecer com dignidade” foi riscado do vocabulário moderno.
Creio ter sido essa a principal herança da era Bush. O mundo tornou-se hiperbólico. Todo mundo precisa ser sempre o melhor, o maior, o mais forte, o mais jovem, o mais rico, o mais bonito e o melhor sexualmente dotado se quiser ser alguém.
O que mais vemos hoje em dia é senhoras de idade abusando de plásticas, botox e do que o valha para padecerem eternamente com o mesmo rosto de quando tinham 21 anos – ou pelo menos tentar. Os exemplos perfeitos disso são as atrizes Demi Moore, Sharon Stone e Nicole Kidman. Se existissem espinhas naquela pele alva e impenetrável que deve ter custado milhares de dólares de martelo e cinzel pra ficar daquele jeito da Nicole, provavelmente sairia colágeno e botox se fossem espremidas. Nada contra essas atrizes, até já fiz muitas “auto-análises” com ajuda das fotos delas, mas não compreendo o problema que elas têm com o tempo. Algumas atrizes continuam sendo sensuais depois de certa idade, mesmo tendo feito poucas ou nenhuma cirurgia. Monique Evans que o diga.
Volto a repetir agora a pergunta que fiz no início do texto: Qual o problema em ser normal? Por que essa compulsão em perseguir padrões irrealizáveis de beleza? É tão triste assim aceitar ser o que é? Você tem uma espinhazinha minúscula no nariz, que só o telescópio Hubble conseguiria apontar com clareza? Por que não aprender a conviver com ela, em vez de comprar aquele grude embelezador caríssimo que aquela jovem te oferece na TV?
Pense nisso na próxima vez que pensar em mandar o número do cartão de crédito para a Polishop.
* Fernando Yanmar Narciso, 25 anos, formado em Design, filho de Mara Narciso, escritor do blog “O Blog do Yanmar”, http://fernandoyanmar.wordpress.com
A França quer proibir o photoshop, em prol da aparência natural. Apóio. Apóio com veemência. Afinal, nega-se hoje a realidade em favor do virtual com tamanha freqüência e convicção que logo estranharemos uns aos outros. Um museu de cera - é o que restará! Boa crítica e bom texto, jovem escriba. Parabéns.
ResponderExcluirComo sempre uma abordagem ácida das tendências vigentes. Não é fácil estar sempre do outro lado, e você geralmente está.
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