sexta-feira, 11 de novembro de 2016

A descoberta da vocação



A “aventura” de Humberto de Campos nos seringais da Amazônia (assunto que abordei em texto anterior), teve, conforme o esperado, curta duração. O jovem sonhador não conseguiu fazer a fortuna que esperava. Pudera! Não era proprietário de nenhum seringal, mas simples empregado de um deles, e sem nenhuma garantia trabalhista (que então era raríssima em qualquer atividade no País). O que Humberto ganhou foi apenas experiência, e nada mais. Aliás, teve muita sorte por não contrair nenhuma doença tropical, notadamente a malária, o terror dos trabalhadores que se dedicavam à extração, processamento e transporte do então preciosíssimo látex. Mas encarou, naquele ermo, no âmago da floresta, uma realidade muito diferente, bem mais dura (duríssima) da que tinha em São Luiz, na casa do comerciante José Dias de Matos, que era seu tutor e o considerava (e tratava) como a um filho.

Raros foram os aventureiros, atraídos pela ilusão da “fortuna fácil”, que conseguiram escapar daquele ambiente hostil, que ficaria conhecido como “inferno verde”. Os parentes distantes da maioria dos seringueiros nunca mais tiveram qualquer notícia deles. Eles simplesmente, “desapareceram”. Humberto de Campos, todavia, não retornou a São Luiz, para o aconchego do que poderia chamar (e que era) um “lar”. Permaneceu na Amazônia, posto que não mais na selva. Foi para Belém, que então já era florescente e progressista metrópole regional, onde, afinal, encontrou o seu “destino”: o Jornalismo. E o jovem, talentoso e inteligente, começou a nova carreira, que abraçaria por toda a vida, bem de baixo. A exemplo do que havia ocorrido com Machado de Assis, a primeira função de Humberto de Campos em um jornal foi a de tipógrafo. E aprendeu rápido como compor as matérias a serem impressas. Não estacionou, todavia, nessa atividade, no jornal “A Província”, de Belém.

Ocorre que, observando os textos que compunha, começou a ensaiar as próprias reportagens e, sobretudo, crônicas, políticas ou não. Não tardou para que esses seus “rabiscos” inteligentes caíssem nas mãos dos superiores, que gostaram, sobretudo, do seu estilo, da forma clara e concisa com que se expressava e da maneira inteligente e sagaz com que observava as coisas. Seus chefes detectaram, ali, um talento inato, que talvez precisasse ser burilado, mas que tinha potencial. Das oficinas, Humberto de Campos foi promovido à Revisão do jornal. Daí para a Redação, foi um pulo, simples questão de tempo, que nem mesmo foi tão extenso assim.

Mas o progresso, do então já jornalista, não parou por aí. Não tardou para dar um salto ainda maior. Logo, logo, de mero aprendiz de tipógrafo, Humberto chegou ao topo da carreira no jornal, tornando-se seu coproprietário. Ou seja, atingiu à condição de sócio de “A Província”. Todavia, não teve vida fácil como empresário. O jornal enfrentava sucessivas crises financeiras e mal conseguia se sustentar. Ocorre que sua linha editorial era de oposição aos governos tanto de Belém, quanto do Estado. E os políticos não perdoaram essa postura. Retaliaram “A Província”, boicotando publicidade (e quem é do ramo sabe que ela é vital em qualquer veículo de comunicação). As dificuldades financeiras eram crescentes e se multiplicavam, a ponto de faltarem recursos até mesmo para matérias-primas do jornal, como papel, tinta de impressão, chumbo para as máquinas de linotipo etc.etc.etc.

Ademais, Belém se tornara muito pequena para as ambições de Humberto de Campos. Ele queria mais, muito mais, o máximo que o jornalismo pudesse oferecer. Buscava projeção, divulgação, público o mais amplo possível para o seu trabalho. Mas isso só poderia ocorrer no Rio de Janeiro, a então capital federal e o maior centro econômico e cultural do País. “É ali que estão as oportunidades? Pois é para lá que vou!”, raciocinou o jovem ambicioso (e talentoso, sem dúvida). E foi o que fez. Em 1912, aos 26 anos de idade, vendeu a sua parte no “A Província” e transferiu-se para o jornal carioca “O Imparcial”, com contrato já garantido. Seria, para ele, o “tudo ou nada”. Confiava, porém, no seu talento. Logo de cara, ganhou uma coluna diária de crônicas, que não tardou a cair no gosto dos leitores.

Paralelamente, Humberto de Campos ia reunindo textos novos e antigos, publicados em jornais, e compondo sucessivos livros, que tinham vendas expressivas, garantindo novas publicações. E sua popularidade, agora como escritor, crescia. Já se cogitava na sua eleição para a Academia Brasileira de Letras. É verdade que o sucesso jornalístico e literário não era garantia de prosperidade financeira. Afinal, ainda hoje, tanto o jornalismo quanto a Literatura não deixam ninguém rico, salvo raríssimas e honrosas exceções (eu que o diga!). Enquanto que no Pará, Humberto de Campos havia publicado um único livro (“Poeira”, lançado em 1911), no Rio de Janeiro as publicações se sucediam, praticamente à razão de uma por ano.

Cito, como exemplo, os lançamentos de “Da seara de Booz” (crônicas, 1918), “Vale de Josafá”! (contos humorísticos, 1919), “O mealheiro de Agripa” (comentários políticos e literários, 1920), “Carvalhos e roseiras, (crítica literária, 1923), ”O arco de Esopo e Antologia dos humoristas galantes” (contos humorísticos, 1926), ”O conceito e a imagem na poesia brasileira” (pesquisa literária, 1929) e vai por aí afora. Não foi surpresa para ninguém, pois, quando em 1919, aos 35 anos de idade, Humberto de Campos foi eleito para a Academia Brasileira de Letras, sucedendo o polêmico poeta Emílio de Menezes na cadeira de número 20. No ano seguinte, foi eleito deputado federal pelo Maranhão, permanecendo na Câmara até 1930, quando Getúlio Vargas tomou o poder e fechou o Congresso.

Boa leitura!

O Editor.

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