sexta-feira, 28 de outubro de 2016

Homens


* Por Rodrigo Ramazzini


Fim de tarde. A esposa retorna do supermercado e encontra o marido sentado no sofá da sala aguardo-a para tomar um chimarrão.

- Oi! O mercado estava cheio hoje, por isso me atrasei.
- É... O chimarrão está pronto já.
- Que bom! Estou seca. Valdo! Nem sabe o que eu fiquei sabendo agora na rua.
- O quê?
- Por isso que demorei também...
- Hã.
- Aliás, tu já deves saber, mas não me contou... Sobre a Márcia e o Umberto. Sabes?
- Hã... Não sei de nada. O que tem?
- Se separaram!
- Opa! É?
- Arãn. Dizem que foi uma baixaria...
- Ah é?
- Dizem que ela bateu nele de tapa na cara e tudo! Coisa muito feia! Até polícia deu!
- Ah é?
- É... Foi de sábado para domingo isso.
- Que coisa.
- Sabe aquele sítio que o Umberto tem na descida aquela... Aquela que vai lá para casa do alemão?
- Eu sei onde é o sítio. Não lembra que nós estivemos lá há uns três anos? Acho que era aniversário da Márcia...
- É mesmo! Nem lembrava disso. Pois é... Dizem que de uns seis meses para cá, o Umberto começou a dar umas festinhas no sítio...
- Hum.
- Uma vez por mês dizem que rolava a tal festinha....
- Hã.
- R$ 80 a entrada...
- ...
- Só os amigos convidados...
- ...
- Com cervejada liberada...
- ...
- Com churrascada...
- ...
- Música boa...
- ...
- E com...
- E com?
- E com mulheres correndo de calcinha pelo sítio... Mulheres, não! Vagabundas correndo pelo sítio de calcinha!
- Hum.
- Que pouca vergonha! Olha a que ponto que chegam as coisas. Um homem velho fazer isso... Um homem velho, casado, pai de família querendo bancar o “gurizinho”... Acabar com o casamento por correr atrás de vagabunda. Pelo amor de Deus! Esse mundo está perdido mesmo!
- É.
- Dizem que a Márcia descobriu a tal festa, foi lá no sítio e pegou ele no flagra! Daí, que se formou a baixaria!
- Hum.
- Por que essa cara, Valdo?
- Que cara?
- Valdo! Olha bem para mim... Olhando nos meus olhos, me responde: tu sabias destas festas do Umberto?

Mesmo que soubesse das festas, Valdo teria cumprido o acordo secreto dos homens que diz que “homem nunca sabe de nada ou não viu nada” dos pares do mesmo gênero.

- Claro que não!
- Olha para mim, Valdo! Eu vou te perguntar de novo...
- Para de encher o saco! Já disse que não!
- Tu já foste em alguma destas festinhas promovidas pelo Umberto?
- Pô! Claro que não!
- Sei... Sei... Eu que fique sabendo, Valdo! Eu que fique sabendo que tu esteves lá um dia... Um mísero dia... Tu és um homem morto! Ouviste bem? Um homem morto!
- Já disse que não! Que inferno! Não sabia destas festas e nunca fui em nenhuma... nem nunca recebi convite daquele “traíra”! Que droga!
- Por que se alterou? Por que esta indignação? Por que “traíra”?

Irritado e alterado com os relatos e pela sequência de perguntas da esposa, Valdo acaba respondendo à questão no impulso, com o pensamento que martelava a sua cabeça naquele momento, sem se dar conta das consequências e municiado pelo sentimento de traição:

- “Traíra” porque o cara se diz teu amigo e tal, mas na hora boa de te convidar para as tais festas: nada! Nenhum convite. “Traíra” do inferno! Olha... É brabo! Ele que vá se catar! Tem mais é que se....

Ontem, fez três dias que Valdo está dormindo no sofá da sala...



* Jornalista e contista gaucho.

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