Espionagem e intriga no Cáucaso
O
fim da Guerra Fria acabou com a espionagem entre as potências mundiais e o tema
deixou de ser interessante para romancistas e roteiristas de cinema. Certo?
Erradíssimo! É o que comprova o mestre do gênero, o inglês John Le Carré. Seu
livro "Nosso Jogo" é um primor nesse tipo de história.
O
próprio escritor explicou aos jornais de todo o mundo como nasceu essa obra e
porque escolheu uma área da Eurásia, esquecida pela comunidade internacional,
para desenvolver seu enredo: "Uma das ironias da minha vida de escritor é
que escolhi o Norte do Cáucaso como cenário de meu romance por ser uma região
sobre a qual ninguém jamais disse nada no Ocidente. Eu queria algo amargo a
respeito da repressão às pequenas nações e a respeito das guerras, por assim
dizer, fora da moda, que os políticos podem ignorar com segurança".
E
a decisão de Le Carré foi premonitória. O livro foi concluído em 1994. No ano
seguinte, o então presidente russo, Bóris Yeltsin, decidiu pôr fim ao sonho de
independência do general Yojar Dudayev, na Chechênia, e deflagrou uma operação
militar de grande envergadura nessa República.
Da
noite para o dia, esse povo exótico e sua persistente rebeldia ganharam as
manchetes internacionais. E, por extensão, todo o Cáucaso. Mas o romance não
trata dos chechenos. Refere-se a um obscuro levante, que teria sido deflagrado
na vizinha Inguchecia (ou Ingushia, como grafam as agências internacionais),
esmagado impiedosamente por Moscou, com a utilização dos ossétios, leais à
Rússia e usados como seus sicários.
A
maior parte da história, no entanto, transcorre em Londres. Aborda um triângulo
amoroso e envolve tripla traição por parte do principal personagem, o professor
da Universidade de Bath, Lawrence Pettifer, chamado de Larry na maior parte do
livro: a da pátria, a da amizade e a conjugal.
Timothy
Cranmer, de 47 anos, espião aposentado, que quando na ativa usava como fachada
o cargo de fiscal do Departamento da Fazenda, mantém um romance com Emma Manzini,
muito mais jovem do que ele, depois de se separar da esposa, Diana. Ama-a como
jamais amou alguém, sem ser totalmente correspondido. Mora em Honeybrook Manor,
fazendola que herdou de certo tio Bob, onde se dedica à produção de vinho.
Larry
havia sido levado para o mundo da espionagem por ele. Era um
"produto" seu. Foi treinado, dirigido e supervisionado por Cranmer.
Ambos foram colegas de universidade, em Oxford, e sua amizade era tamanha, que
havia levantado suspeitas até de se tratar de ligação homossexual.
Por
influência de Timothy (ou Timbo como era chamado na intimidade), Pettifer
torna-se agente duplo dos russos, fornecendo informações inócuas à Grã-Bretanha
da sucessora da KGB, por meio de Konstantin Abramovich Checheyev, "mula
preta" (espião menor procedente do Cáucaso) de Volodya Zorin o verdadeiro
chefe dessa célula de espionagem russa em Londres.
Só
que seu contato não é leal a Moscou. Trata-se de um ingushe. Faz parte do grupo
liderado por Bashir Haji, que quer proclamar a independência da Inguchecia. Em
resumo, Larry e Checheyev roubam 37 milhões de libras esterlinas da embaixada
da Rússia, para financiar a compra de armas modernas aos rebeldes.
Com
o roubo, comprometem Zorin e Cranmer perante seus respectivos serviços secretos,
que passam a ser encarados como cúmplices. Pettifer foge e leva consigo Emma,
com quem vinha mantendo um relacionamento secreto, traindo Timbo, que não se
conforma com a dupla perda: a do amigo e a da amante.
Larry
vai para o Cáucaso, lutar ao lado dos rebeldes, onde é morto e estes são
esmagados. Cranmer reconstitui os seus passos, em busca inicialmente de
vingança, e vai parar na Inguchecia, onde acaba por aderir também, como seu
pupilo havia feito, aos montanheses separatistas.
Trata-se
de outra obra-prima do autor de clássicos do gênero, como "O espião que
saiu do frio", "A garota do tambor", "O espião que sabia
demais", "O morto ao telefone" e "Casa da Rússia",
entre tantos outros.
Boa leitura.
O Editor
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Adapto-me mal a esse tipo de enredo. Lembra-me o tipo de roteiro preferido pelo meu ex-marido. Eu não gosto de histórias nas quais eu me afogue num grande número de personagens. Prefiro núcleos menores. Sei que perco boas histórias, mas também me canso menos, pois não preciso ficar voltando para saber quem é quem.
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