quinta-feira, 5 de outubro de 2017

Letras de lavradio

* Por Theófilo de Amarante

Abri a terra com uma folha de papel
adubei-a com tinta utópica 
e semeei um canteiro de letras
Com o juízo em pedra-de-cevar 
reguei-o com pó de frases alegóricas
o orvalho de alguns neologismos
o suor de metáforas em artefacto 
e deixei o canteiro a matutar.
No meio do verão saíram algumas letras esdrúxulas
umas virgulas e uns embriões de acentos.
Sentia-se no ar aquele perfume sinonimado 
e o ténue vagido duma singela ária a brotar. 
Mas ainda não dava para decifrar a colheita
eram curtas gnoses na crista de tês minúsculos
que nem dariam para uma simples apostila.
Cobri o canteiro com uma nuvem de tiles. 
Depois de o ventilar com um lacónico tempo do norte
misturado com o safanão da ardência do sul
e recolhi à minha vida de ingénuo trovador. 
Chegou o Outono e ouvi umas letras a soar
por entre as folhas mortas erguendo-se afoitas
correndo joviais para a folha de papel
onde se escreveram em versos genuínos. 


* Poeta

Nenhum comentário:

Postar um comentário