Tiranos da Terra
O
mundo sempre teve uma profusão de tiranias e, por conseqüência, de
tiranos, desde que os primeiros homens, nossos mais remotos e
selvagens ancestrais, se agruparam em tribos, cidades, reinos e
nações. É verdade que alguns desses indivíduos, que impunham suas
vontades a ferro e fogo e não admitiam a mais ligeira contestação,
foram esclarecidos o suficiente para fazer governos relativamente
equilibrados (na comparação com os que não agiram assim),
promovendo o progresso e uma certa dose de felicidade aos seus povos.
Foram, claro, raras exceções.
Houve
tiranos que foram, sem tirar e nem pôr, loucos varridos, que
exigiram serem tratados como deuses; que incendiaram cidades do
próprio reino; que fizeram de seus cavalos senadores; que se
divertiram com os agoniados gemidos de sofrimento dos adversários em
sessões intermináveis das piores torturas que se possam imaginar, e
que cometeram atrocidades tais, que nossa imaginação se torna muito
estreita para sequer supor. Estes, desgraçadamente, constituíram-se
em imensa maioria.
Não
houve uma só época da história em que não tivéssemos tiranias e
tiranos. Temo-los ainda hoje, em pleno século XXI do terceiro
milênio da Era Cristã – e não poucos – e seus nomes sequer é
necessário que sejam declinados, já que são do conhecimento das
pessoas cultas ou bem informadas.
A
história está repleta de nomes cuja simples menção nos faz
estremecer de repulsa e de horror. Muitos deles foram glorificados e
se constituíram em heróis nacionais. Isso porque nossa memória é
frágil e se torna traiçoeira à medida em que os anos passam. Há
os que “glorificam” essas pessoas más e mesquinhas por somente
ouvirem falar de suas estripulias e não terem sentido na própria
carne o peso da sua tirania. Caso fossem suas vítimas, ou tivessem
parentes que o tenham sido, estremeceriam de ódio e de nojo à sua
simples menção.
É
impossível estabelecer uma primazia e determinar qual desses
verdugos foi o mais terrível, o mais louco, o mais sanguinário e o
que fez maior número de vítimas. A disputa, convenhamos, é das
mais acirradas. Pelo sim, pelo não, convém considerar que há
empate neste cômputo de autoritarismo e crueldade.
Todavia,
os maiores tiranos da Terra não foram nenhum desses celerados cujas
atrocidades a História registra. Não viveram no passado e sequer
são mortais. Existem desde que o Planeta foi formado e continuarão
existindo enquanto houver vida por aqui. Quais são? O pensador John
Herder (não confundir com o ator, seu homônimo, protagonista do
filme “Blades of Glory”, que no Brasil recebeu o nome de
“Escorregando para a glória”) nos revela quem são: “Os
maiores tiranos da Terra: o acaso e o tempo”.
Da
tirania desses verdugos ninguém nunca conseguiu e jamais conseguirá
escapar, por mais forte, resistente, sábio, astuto e precavido que
seja. Ambos atuam sobre nós (sobre todos nós, indistintamente)
desde o nascimento (que já é, por si só, imensa casualidade) até
a morte, que sabemos que um dia haverá de nos colher, mas não temos
a menor noção de onde, como e quando.
Que
me perdoem as pessoas que dizem, de boca cheia, que “nada acontece
por acaso”. De onde tiraram tamanha convicção? Qual a prova, por
mínima que seja, que podem apontar para corroborar tão atrevida
assertiva? As evidências, aliás, todas elas, apontam em sentido
diametralmente oposto. Ou seja, de que “tudo” acontece por acaso.
Se
um meteorito se chocar com a Terra e extinguir nossa arrogante
espécie, como já ocorreu no passado com tantas outras, será fruto
de algum determinismo? De qual? Há milhares de cometas circulando
por aí, por entre os planetas do nosso Sistema Solar, sem nenhuma
direção. De repente, um deles pode se transviar e atingir
exatamente o nosso domos cósmico, passando por outros cinco ou seis
mais próximos e maiores (ou seja, com alvo muito mais fácil e
lógico) e vir, caprichosamente, nos atingir. Isso estava
determinado? Onde? Por quem?
Quanto
ao tempo... É até desnecessário e redundante apontar suas ações
sobre nós. Basta que nos olhemos, amiúde, no espelho para constatar
os estragos que faz em nosso corpo. Sepulta a tudo e a todos, sem
poupar nada e ninguém: nem cidades, nem templos, nem tumbas, nem
monumentos, nem sábios, nem toupeiras, nem heróis e nem poltrões.
Sequer democratas ou tiranos. Não faz distinções. Existe tirania
maior? Qual?
Boa
leitura!
O
Editor.
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