O descanso compulsório
* Por
Ruth Barros
Esse feriado, mix de Nossa
Senhora Aparecida e Dia das Crianças, está enlouquecendo Anabel.
Não que eu tenha nada contra a padroeira e muito menos contra
crianças, muito antes pelo contrário. É que novamente me vejo
obrigada a achar diversão, amigos, lugar para onde ir etc. etc. além
dos gastos obrigatórios que essas atividades extras acarretam. E
como não bastasse mais nada, a lógica da natureza na grande São
Paulo é implacável – sol durante a semana e tempo desconfortável
nos dias que permitiriam parques, praias e outros programas que
exigem menos esforço mental para bolá-los, são simples
conseqüência do dia bonito.
Já abordei esse tema antes –
mesmo porque a escriba, em que pese a fértil imaginação, se vê
cada dia mais dominada pela preguiça. E é consenso entre os
repórteres e pauteiros, pelo menos os sérios, de há 40 pautas no
mundo, isso é estimativa generosa, senão vejamos: eleições,
prédios em Nova York que são atingidos por aviões,
congestionamento nas estradas e ruas, Natal, fugas de presídios,
Carnaval e por aí vai, qualquer ser humano que já leu um jornal ou
assistiu TV sabe do que estou falando. Como já cobri quase todos
eles dezenas ou centenas de vezes durante todos esses anos, vou me
ater a um velho tema de agenda – o desespero da diversão
compulsória durante os feriados prolongados.
Não se discute que ficar de
papo pro ar é uma das melhores coisas da vida, principalmente se
esse papo pro ar não for corolário de desemprego, tédio, falta de
grana, contas penduradas, o horror, o horror. Mas depois de um
feriado prolongado de 7 de Setembro, do Criança/Aparecida que agora
se desenrola, só de pensar no futuro Finados (e ainda tem o 15 de
Novembro que vai vir no meio de uma semana, numa quarta-feira) me dá
vontade de gritar. Onde vou arrumar diversão e fígado – afinal de
contas, bela parte dos programas acaba em álcool – para agüentar
todos esses dias?
Pior ainda são os coitados
que têm filhos, não vão emendar feriados (os pais, é claro) e que
são obrigados a arranjar comida, diversão e balé para os pimpolhos
presos em casa. Nos dias de hoje as escolas praticamente todas
aproveitam para ter esses descansos prolongados e honestamente é
impossível convencer empregadas, babás e quaisquer variações no
gênero que façam o mesmo, mesmo porque não é justo deixar um
trabalhador – e empregada doméstica é trabalhador feito qualquer
outro – acorrentado ao serviço durante um feriado. E
definitivamente empregada não é função obrigatória como
pronto-socorro, médico ou jornalista. Jornalista aliás também não
deveria ser, mas para nosso desespero, praticamente todas as redações
do mundo trabalham nos feriados, sem contar os fins de semana.
Por outro lado, trabalhar
enquanto todo mundo está na praia, na cachoeira, no sítio dos
amigos ou simplesmente na casa da mamãe também é problema. Se por
um lado resolve a questão do que fazer nesses dias, por outro lado
deixa uma sensação de fracasso “onde foi que eu errei?”, todo
mundo se divertindo e só a gente na labuta, ora bolas. Pensando bem,
tem mais gente na luta nesse feriado – na quinta-feira, junto com a
Nossa Senhora Aparecida, recomeçou a propaganda eleitoral do segundo
turno. E campanha é um massacre da serra elétrica não só para os
eleitores que sofrem com ela, mas principalmente para os que nela
atuam, mesmo porque nessa etapa é jogo de vida ou morte, só um
sairá ungido pelas urnas. E o próximo feriado, Finados, terá
realmente cara de morte para os perdedores, tanto candidatos como
profissionais desempregados pela derrota.
Anabel Serranegra morre de
inveja da Daniella Cicarelli, que se manda para as praias espanholas
sempre que tem um tempinho
*
Maria
Ruth de Moraes e Barros, formada em Jornalismo pela UFMG, começou
carreira em Paris, em 1983, como correspondente do Estado de Minas,
enquanto estudava Literatura Francesa. De volta ao Brasil trabalhou
em São Paulo na Folha, no Estado, TV Globo, TV Bandeirantes e Jornal
da Tarde. Foi assessora de imprensa do Teatro Municipal e autora da
coluna Diário da Perua, publicada pelo Estado de Minas e pela
revista Flash, com o pseudônimo de Anabel Serranegra.
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