Progresso
e meio ambiente
* Por Adalton Oliveira
Para
o físico brasileiro Rogério C. Cerqueira Leite[1], se a Terra fosse
a uma consulta médica, o diagnóstico seria de que ela está com um
parasita, o Homo Sapiens. Há parasitas que se aproveitam do
hospedeiro sem matá-lo, mas há os que o exploram até a extinção.
Resta-nos saber a que classe de hospedeiros pertencemos.
A
ação destrutiva do homem sobre a Natureza vem de tempos remotos,
desde que começou a desmatar e a irrigar o solo para o cultivo
agrícola. Há evidências de que as concentrações de CO2 começaram
a subir há cerca de 8 mil anos atrás – 3 mil anos depois do
aparecimento da agricultura - e foram praticamente constantes até o
início da revolução industrial, de fins do século XVIII. É
provável que o impacto da agricultura sobre o clima da Terra tenha
sido compensado pelos próprios ciclos orbitais do planeta que
estavam causando uma tendência paralela de resfriamento. Dessa
forma, uma atividade humana, a agricultura, teria evitado o início
de um novo ciclo de glaciação.
Contudo,
as novas formas de organização da sociedade – com base no consumo
massificado e no intenso uso de energia derivada de combustíveis
fósseis –, estão impactando o clima do planeta de maneira
inédita. Desde o advento da Revolução Industrial, a temperatura no
planeta à superfície cresceu entre 0,6ºC e 0,7ºC em média e as
previsões são de que a temperatura média da Terra suba entre 1,5ºC
a 4,5ºC nos próximos 100 anos, valor suficiente para elevar o nível
dos oceanos de forma considerável. Esta elevação de temperatura
poderá ser – por exemplo – suficiente para derreter a capa de
gelo que recobre as terras da Groenlândia, elevando o nível dos
oceanos em 5 metros, o que seria catastrófico para aquelas
populações que vivem em áreas litorâneas, obrigando milhões de
pessoas a procurarem novos lugares para viver, o que provocaria
profundos impactos sobre todas a regiões do planeta. Os efeitos
dessa elevação de temperatura sobre a agricultura seriam terríveis,
com crescente redução das áreas agriculturáveis, pois regiões
hoje férteis se transformariam em desertos. Quanto aos efeitos sobre
a biodiversidade do planeta, teríamos uma extinção em massa sem
precedentes na história.
A
ideia de progresso desde sempre dominou a mente humana. Podemos
entender como progresso a mudanças feitas no presente e que conduzem
a uma situação melhor do que aquela que se vivenciou no passado.
Chamou-se de obscurantista aos que se opunham às mudanças trazidas
por um pretenso progresso e, assim, poucas vezes os resultados desse
progresso foram discutidos. Questões éticas foram postas em segundo
plano ou negligenciadas, dando lugar às vantagens econômicas e de
poder que o progresso traria. Os estudos sobre o átomo levaram à
bomba atômica – vista como um grande avanço na área militar –
mas, antes de Hiroshima e Nagasaki, não se discutiu se seria ética
sua utilização.
O
mundo idílico prometido pelo progresso nunca se realizou, o que
vimos foi o aumento da degradação ambiental, paralelo ao
crescimento da pobreza, ao advento de guerras, ao surgimento de
doenças trazidas pela modernidade, como a depressão e a ansiedade.
Obviamente, não se está aqui a se opor ao progresso, estamos
tratando da ausência de questionamentos sobre as conseqüências
deste ou daquele avanço sobre a devastação de largas áreas do
planeta e a destruição de inúmeros habitats.
Em
sua arrogância, o homem se propôs a conquistar a Natureza e a
usá-la em seu proveito próprio, sem preocupações com os danos a
ela causados. Portamo-nos como se estivéssemos imunes aos efeitos
nocivos provocados ao planeta, como se nós mesmos não fizéssemos
parte do delicado equilíbrio do globo. Antecipando as preocupações
ecológicas do final do século XX, o grande filósofo Walter
Benjamin dizia sonhar com um novo pacto entre os humanos e seu
meio-ambiente, opondo-se à ideologia “progressista” de um certo
socialismo “científico” e de um ideal utilitarista que reduziu a
natureza a uma matéria-prima da indústria, a uma mercadoria
“gratuita”, a um objeto de dominação e de exploração
ilimitada.
Para
a Economia, mais propriamente para as correntes do pensamento
neoclássico, somos maximadores de utilidade, criaturas hedonistas
insaciáveis. Dessa forma, o progresso está ligado à ideia de
produção de mercadorias e serviços ad infinitum. Não se questiona
se tal produção destrói a base sobre a qual se sustenta, ou seja,
o esgotamento dos recursos gratuitos oferecidos pela Natureza não é
levado em consideração. Para a Economia neoclássica, se a
quantidade obtida de peixe numa certa área se reduziu em função da
atividade pesqueira intensiva, a solução é pôr ali mais barcos
pesqueiros. Um contrassenso!
Mesmo
a ideia de crescimento sustentável parece vaga. Não se define
exatamente o que deve crescer de maneira sustentável. Seria o
produto interno bruto (PIB), a riqueza ou o nível de satisfação da
sociedade? Não se sabe. A melhor definição de crescimento
sustentável que conheço é aquela formulada pelos economistas
ecológicos, que diz: “desenvolvimento sustentável é aquele que
supre as necessidades do presente sem comprometer a capacidade das
gerações futuras de atender suas próprias necessidades”. Como
fazê-lo? Eis o grande desafio atual da humanidade. Mas, como dizia
Karl Marx, a humanidade não se propõe problemas que ela não possa
resolver. Esperemos que ele esteja certo.
-
[1]
LEITE, Rogério C. Cerqueira. “Energia renovável: sonho ou
realidade?” em A Terra na Estufa, Scientific American, edição
especial nº 12, setembro de 2005.
*
Jornalista.
*
Jornalista
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