Um
vulcão na Indonésia fez nascer Frankenstein na Suíça (e acreditem: teve
repetecos em Porto Alegre)
* Por
Mouzar Benedito
Sabe-se que Mary
Shelley escreveu o romance O Prometeu Moderno, que depois ficou conhecido
simplesmente como Frankenstein, quando tinha apenas 19 anos, na casa do
escritor Lord Byron, em Genebra. Mas como aconteceu isso?
A história começa na
ilha de Sumbawa, na atual Indonésia, em 1815. O Monte Tombora, um vulcão dessa
ilha, entrou em erupção de uma maneira sem precedentes. Foi jogada no ar uma
quantidade de poeira (1,5 milhão de toneladas, segundo as estimativas) que
tapou o sol no hemisfério Norte. A luz solar foi bloqueada por essa poeira e o
resultado foi que em 1816 não houve verão na Europa.
Mary Wollstonecraft
Godwin e seu futuro marido, Percy Bysshe Shelley, além do escritor John
Polidori, foram passar o verão na beira do Lago Léman mas, como já disse, não
houve verão. Ficaram confinados na casa do escritor Lord Byron, amigo deles.
Segundo algumas informações, foram três meses fechados.
Para passar o tempo,
entre outras coisas, liam e conversavam sobre contos de fantasmas alemães. Lord
Byron teve uma ideia: que cada um escrevesse uma história de fantasmas. O
próprio Byron escreveu um “pioneiro”, sobre vampiros, que inspirou décadas
depois o escritor Bram Stoker a criar o Drácula.
Mary, que depois se
casaria e adotaria o sobrenome do marido, teve dificuldades, não conseguia
imaginar algo, até que veio a ter uma “visão” de um estudante de ciências
naturais que daria vida a uma criatura. Ela deu a esse estudante o nome Victor
Frankenstein.
Escreveu então o
romance de terror que seria considerado a primeira obra de ficção científica da
história. Mas parece que não levou o romance a sério: a primeira edição,
publicada em 1818, nem levava sua assinatura. A terceira edição, publicada em
1831, foi revisada e considerada definitiva.
Bom… E o que a capital
gaúcha tem com isso?
Estive lá nos dias 6 a
9 deste mês, para participar da 61ª
Feira do Livro de Porto Alegre. É considerada a maior feira de livros ao ar
livre de toda a América Latina. E é grande mesmo. E movimentada, com uma
programação extensa, de debates, aulas magnas, muitos lançamentos e há alguns
anos uma atividade inédita – acredito – em qualquer outra feira de livros: uma
noite reunindo escritores num lugar fechado, com a proposta de que cada um crie
um conto de terror.
Isso aconteceu três
vezes seguidas no prédio da Biblioteca Pública do Estado. Este ano mudou, o
evento foi no Theatro São Pedro, belíssimo! Construído em meados do século XIX,
com um porão labiríntico, escadarias dando para vários ambientes, um auditório
incrível e muitos camarotes confortáveis, o teatro tem muitas histórias. Sua
construção, iniciada em 1835 foi interrompida por causa da Revolução
Farroupilha, que durou dez anos, e só concluída em 1858. Teve importância
enorme, passou por fases de abandono e foi restaurado em 1984, por exemplo.
Entre muitos usos bons, teve também uns pouco ruins: uma convenção da Arena, o
partido da ditadura, para escolher o governador a ser nomeado, por exemplo.
Entre os muito bons,
sediou agora o Tu Frankenstein 4, de que tive a honra de participar, com mais
vinte escritores, dos quais, três estrangeiros: um norueguês, uma finlandesa e
um estadunidense.
Às dez hora da noite
de sábado, fomos levados aos porões do teatro, que percorremos vendo fotos de
personalidades que se apresentaram ali e matérias jornalísticas que mostram a
relevância que ele tem. Ouvimos relatos dos organizadores e do pessoal do
teatro sobre sua construção e sobre fatos relevantes que aconteceram nele, e
depois, sem utilizar o elevador que segundo um guarda-noturno costuma funcionar
sozinho durante a madrugada, fomos para o último andar, onde se localiza o
foyer principal, um salão amplo e alto, repleto de lustres e mesas, com um poço
cercado por um gradil antes do meio e, ao fundo, um piano.
Ali nos liberaram para
irmos onde quiséssemos e escrevêssemos um conto de terror, suspense, horror ou
coisa do tipo, com o compromisso de só sairmos depois de entregar o conto que,
de alguma forma, deveria conter algo que envolvesse o Theatro São Pedro. Café,
água, cerveja e lanches ficaram à nossa disposição. Uns passearam pelos muitos
ambientes do teatro antes de começar a escrever, outros seguiram cada um para o
isolamento de um camarote e alguns ficamos no foyer. Eu fiquei nele também.
O resultado disso
deverá ser um livro com a coletânea dos contos escritos este ano. Já foram
publicados antes dois volumes (dos Tu Frankenstein 2 e 3).
Quem sabe sairá desse
evento algo digno de Mary Shelley? Não será o meu conto. Além de nunca ter
escrito conto ou romance do gênero – embora possa haver quem ache meus livros
um horror – tive que me virar para enfrentar um laptop que pedi emprestado. Nunca
antes havia mexido num treco daqueles, o que dificultou um pouco as coisas,
pois ao mesmo tempo que tentava escrever algo inédito, usava um equipamento que
também era inédito para mim, e me enrolava todo, confundindo não só o manuseio
dele mas também minha mente toda.
Mas isso não é
desculpa. Sei que se me dessem condições especiais e um computador tradicional
eu não produziria algo muito melhor do que fiz. Mesmo assim, fui dos primeiros
a deixar o teatro. Entreguei meu conto à 1h15 da manhã. No domingo à tarde,
soube que o último a sair entregou o conto depois das 5h. Mas a experiência me
despertou um interesse novo: vou tentar escrever alguns contos de terror e
melhorar meu desempenho na área.
Termino imaginando que
os leitores podem estar se perguntando: “Por que ele está contando isso?”.
Claro que ter sido um
dos convidados me foi muito gratificante. Outro motivo: é bom ver um evento
literário de grande porte e ótima qualidade chegar à sua 61ª edição anual, no
Brasil. Participei de uma mesa de debates também, com autores de livros
policiais (eu, no caso, por causa da série Bill Ferrer). E tem o Tu
Frankenstein. No ano que vem vai ser em algum outro prédio histórico de Porto
Alegre, já contaram. Espero ter chance de ir à 62ª Feira do Livro de Porto
Alegre, participar das suas atividades e reencontrar velhos e novos amigos que
deixei lá. Quem puder ir, que vá também no próximo ano. Não se arrependerá.
Quem quiser ver fotos
e vídeo sobre o Tu Frankenstein, pode entrar nos endereços abaixo:
Fotos:
https://www.facebook.com/media/set/?set=a.926047047481772.1073741983.116648698421615&type=3
Vídeo:
http://videos.clicrbs.com.br/rs/zerohora/video/segundo-caderno/2015/11/escritores-passam-noite-theatro-sao-pedro-escrevendo-historias-terror/141424/
Matéria do jornal Zero
Hora.
*
Jornalista e escritor.
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