Informação por osmose
* Por
Luciane Evans
Dia desses ouvi de
dois jovens, ambos com menos de 30 anos, que informação diária se obtém por
osmose. "Por isso, não leio jornal", justificou um deles, tendo o
outro como cúmplice da afirmação. Na hora, juro que o sangue subiu e deu uma
vontade louca de vomitar milhões de palavras e palavrões, ou então gritar:
"Porra, a gente se mata todos os dias pensando em formas de lides
diferentes, novos assuntos, pautas ousadas e
você vem me falar que não é preciso ler nada disso para estar informado?
Vai tomar no cú!". Não me arrisquei, não sou tão louca assim.
Voltei para casa com o
sapo agarrado na garganta e muitas questões. Jornalista é um povo estranho
mesmo. É uma gente louca, incoerente, desleixada, cheia de mania, acha que sabe
de tudo, adora vender seu peixe e contar seus casos gloriosos.
Mas afinal, quem são
eles? Que tribo de gente esquisita é essa, que a caminho da redação, em vez de
ouvir no carro o bom e velho rock'n roll
para relaxar, escuta a voz do colega de
rádio dando as últimas notícias? Que povo é esse que degusta o café da manhã
saboreando manchetes, títulos, bigodes, lides e infografias?
Mas que gente louca é
essa que é capaz de se mostrar firme ao entrevistar garotos do tráfico ou então
meninas da prostituição, mas volta para a redação com os olhos cheios de
lágrimas e chora como criança? Que gente maluca é essa que sai no meio do
temporal, enquanto estão todos procurando um lugar para se esconder? Que povo
incoerente é esse que reclama do salário
e dos chefes, mas quando sai da redação só sabe elogiar a profissão?
E pior: por causa de
uma só matéria, esse desvairado se mata
todos os dias, corre contra o tempo, investiga dali, recebe tapa daqui, dá mais
de 20 telefonemas em um único dia, ouve gritos de chefes, não tem tempo para
almoçar e, muito menos, lanchar, fuma um
maço de cigarros em menos de 24 horas, não dorme, esquece de tomar água, acha
que vai enfartar, tem pesadelos, manda emails para toda a sua lista para achar
tal personagem, perde aula de pós graduação, cursinho disso e daquilo ...Para,
num dia qualquer, vê sua obra prima
sendo usada para embrulhar bananas, peixes, pinturas ...ou ouvir de leitores em
potencial que informação se obtém por osmose.
Com a palavra, Gabriel García Márquez:
Porque
o jornalismo é uma paixão insaciável que só se pode digerir e humanizar
mediante a confrontação descarnada com a realidade. Quem não sofreu essa
servidão que se alimenta dos imprevistos da vida, não pode imaginá-la. Quem não
viveu a palpitação sobrenatural da notícia, o orgasmo do furo, a demolição
moral do fracasso, não pode sequer conceber o que são. Ninguém que não tenha
nascido para isso e esteja disposto a viver só para isso poderia persistir numa
profissão tão incompreensível e voraz, cuja obra termina depois de cada
notícia, como se fora para sempre, mas que não concede um instante de paz
enquanto não torna a começar com mais ardor do que nunca no minuto seguinte.
*
Jornalista
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