Eu sou Ayotzinapa
* Por
Urda Alice Klueger
Desde o dia 26 de
setembro deste 2014 que eu estou esperando por eles. Tal, nas minhas contas,
hoje dá 40 dias. Eram jovens estudantes de pedagogia de uma área rural que,
desarmados e indefesos, faziam uma manifestação, quando foram violentamente
reprimidos pela polícia mexicana, que de cara assassinou a seis pessoas, feriu
umas quantas... e sumiu com 43 futuros professores.
Dia a dia espero por
eles, assim como seus pais, suas famílias, as pessoas de bem de todo o México e
tantas, como eu, pelo mundo afora, irmanados que somos pelo ideal bolivariano
de uma pátria grande, pelo ideal de Johnn Lennon, quando escreveu Imagine. Dia
a dia vejo as notícias (claro que não é pela Globo!) do que acontece em
Ayotzinapa, aquela cidade que a gente nem sabia que existia, e que, desde
então, tornou-se como que o centro do mundo, e espero, como os pais e os amigos
deles esperam, que aqueles jovens futuros professores reapareçam, e o que eu
mais ouço dos seus familiares é o desejo de que reapareçam “com vida e saúde”.
Vi a entrevista, lá no
final de setembro, de um jovem que nem desapareceu e nem morreu – fez-se de
morto, atirado ao chão, pode ver algumas coisas, salvou-se milagrosamente. O que ele contou ultrapassa a capacidade de
entendimento da maldade que pode haver num ser humano. Os 43 que sumiram foram
levados embora pela polícia... para onde?
Primeiro houve a
revolta do povo de Ayotzinapa, depois a do estado de Guerrero, onde fica a
pequena cidade, depois a do México, e hoje ela se espalha pelo mundo, conforme
as pessoas sensíveis vão sendo informadas, e eu também quero saber onde estão
aqueles meus jovens irmãos que queriam ser professores e que sumiram como uma
bolha de sabão que explode.
A pressão popular foi e
está tão grande que o governo do estado de Guerrero já caiu; não vou achar
estranho se cair até o presidente do México. Estão a investigar, pelo jeito com
profundidade, pois já existem mais de 50 suspeitos presos, inclusive 36
policiais, mas quem foi mandou sumir com os meninos de Ayotzinapa? Em data de
ontem conseguiram achar, escondidos num subúrbio miserável, o ex-prefeito de
Ayotzinapa e sua mulher, pessoas ligadas ao crime organizado, que se puseram em
fuga antes mesmo de começarem a ser procurados. Segundo as autoridades
mexicanas, são os principais suspeitos para se chegar a uma solução do caso.
Até agora já acharam 12
fossas clandestinas com 38 corpos calcinados, mas como ainda não se comprovou
que nenhum deles é dos meninos estudantes, fica nos pais, nas famílias, no
México e em mim a esperança de que, milagrosamente, ainda venham a reaparecer
com vida e saúde aqueles rapazes que assim saíram de casa no dia 26 de setembro.
A revolta cresce no
México e no mundo, e o Brasil pouco sabe a respeito, por conta da sua imprensa
vendida. Mas dia a dia me informo e não consigo me conformar: onde estão
aqueles meninos?
Hoje sou Ayotzinapa,
até o fundo da alma. Eu sou cada um daqueles pais e daquelas mães, e quero
saber o que aconteceu. E, como eles, quero os jovens estudantes de volta! O
mundo já não pode suportar coisas assim.
Blumenau, 05 de
Novembro de 2014.
* Escritora de Blumenau/SC, historiadora e
doutoranda em Geografia pela UFPR, autora de mais uma dezena de livros, entre
os quais os romances “Verde Vale” (dez edições) e “No tempo das tangerinas” (12
edições).
Infelizmente os jovens calcinados eram os desaparecidos. Que pelo menos possamos ver os culpados ser punidos.
ResponderExcluir