Agora é quase amanhã
* Por Assionara Souza
"Obrigada por ter
vindo. Eu sei que é loucura, ligar assim no meio da noite. Nos conhecemos tão
pouco. Talvez não houvesse outro modo. E a noite é tão silenciosa. Daqui a
pouco vai amanhecer.
Não gosto de me fazer
inusitada. Mas o dia só acaba quando a gente sonha. E eu queria ver você.
Pensei em você. Justamente por ser mais distante de mim do que qualquer outro.
E tão próxima. Assim é que vejo.
Precisava olhar de
perto essa expressão de espanto e surpresa. Os meus amigos não se surpreendem
mais. Estão todos entediados da vida. Cheios da vida, como não dizem os
anúncios publicitários. Você é silenciosa como a madrugada. E eu fico enchendo
seus olhos de palavras.
Não é nada sério.
Acredite. Só queria viver esse dia até o fim. Só queria ver no fim desse dia
esses seus olhos. Um anônimo que surpreenda esse olhar solto na rua de um dia
qualquer vai sentir também assim. O que digo não é absurdo. Acredite.
Quero que saiba: não
tenho mais medo. Os medos estão todos em mim apaziguados. Nenhum outro receio
que seja pode atravessar a linha da minha tristeza. Por isso chamei você aqui.
Para que o dia comece depois do sonho.
Agora é quase amanhã. E
a manhã surgirá coberta de um superfície silenciosa. Acolhendo os gritos do
dia. O imenso dia. Depois não saberemos mais. E não saber está entre o que é
temor e possibilidade".
*
Escritora
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